A irresponsabilidade subsidiária da administração pública perante o inadimplemento das empresas contratadas mediante licitação.

 

JULIANA BORTOLAN -

Estudante de Direito do 7º período, nas Faculdades Integradas Curitiba

 

 

Comumente o Poder Judiciário Trabalhista, perante a hipossuficiência do trabalhador, vem condenando a Administração Pública ao pagamento dos débitos trabalhistas no caso do inadimplemento das empresas terceirizadas contratadas pela administração mediante processo licitatório.

Observaremos nesta redação que condenações neste sentido acabam por violar literal disposição de lei federal, afrontam a Carta Magna, bem como divergem de entendimentos de Turmas de alguns Tribunais Regionais.

Com relação à violação literal de lei federal, observe-se o artigo 71 da Lei 8666/93, subscrito:

 

“Art 71 – O contratado é responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato.

§ 1º - A inadimplência do contratado, com referência aos encargos estabelecidos neste artigo, não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou restringir a regularização e o uso das obras e edificações, inclusive perante o Registro de Imóveis.”

 

Unicamente com a simples leitura do artigo supra, parece que nenhuma decisão judicial poderia prevalecer sobre este dispositivo, sob pena de incorrer na violação do artigo 37 da Constituição Federal, que disciplina o princípio da legalidade, que, como princípio de administração, dá a garantia de que à Administração Pública é vedado fazer ou deixar de fazer algo se não prescrito em lei, caso contrário incorreria na prática de ato inválido, expondo-se à responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso. É notório, ainda, que a validez de toda atividade administrativa é dependente do atendimento da lei.

Fica clarividente que o §1º afasta da Administração qualquer relação de interdependência ou subsidiariedade para com as incumbências que a empresa contratada não venha a honrar perante terceiros ou o Estado, significando que, em todos estes vínculos de direito, público ou privado, a contratada é a única responsável dos encargos devidos.

Este entendimento vem ainda à mostra no processo TST-RR 411085/1997, da 5a Turma do Tribunal Superior do Trabalho, advindo da 3ª Região e cujo Relator foi o Ministro Nelson Antônio Daiha e Recorrente Caixa Econômica Federal:

 

"EMENTA: RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA (ENUNCIADO 331, IV, DO TST) - ART. 71 DA LEI Nº 8.666/93. Nos termos do disposto no art. 71 da Lei nº 8.666/93, é expressamente vedada a responsabilidade subsidiária dos órgãos da Administração Pública pelo inadimplemento das obrigações trabalhistas, sendo inaplicável aos mesmos o disposto no inciso IV do Enunciado 331/TST. CORREÇÃO MONETÁRIA - SALÁRIO - ART. 459 DA CLT. O pagamento dos salários até o 5º dia útil do mês subseqüente ao vencido não está sujeito a correção monetária. Se essa data-limite for ultrapassada, incidirá o índice da correção monetária do mês subseqüente ao da prestação dos serviços. SEGURO-DESEMPREGO - INDENIZAÇÃO - DESCABIMENTO. É incabível a conversão da obrigação relativa à entrega das guias do seguro-desemprego em indenização pecuniária. Revista conhecida parcialmente e provida".

          

Leia-se também a ementa da 5ª Turma, no processo TST-RR 464542/1998-6, advindo da 2ª Região, cujo Relator designado foi o Min. Armando de Brito e Recorrente o Ministério Público do Trabalho da 2ª Região:

 

"EMENTA: RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. ENTES PÚBLICOS. Não é cabível o entendimento registrado pelo nobre Relator, de que a aplicação do enunciado revela interpretação sedimentada de preceitos legais em torno de determinada matéria e que, assim, estaria afastada a indigitada afronta. Como observa-se do voto do Relator, a construção de tal súmula deu-se em face de reiterada exegese dos arts. 10, § 7º, do Decreto-Lei nº 200/67 e 37, II, da Constituição da República de 1988, bem como das Leis 5645/70, 6019/74 e 7.102/83. Não decorreu de análise do art. 71, § 1º, da Lei nº 8.666/93, o qual literalmente impede a concessão de qualquer tipo de responsabilidade a ente da Administração Pública. Recurso de Revista conhecido e provido"

 

Após a leitura dos acórdãos, é manifesta a violação patente de disposição de lei federal, quando há julgados punindo a Administração Pública subsidiariamente ao pagamento das obrigações trabalhistas inadimplidas pelas empresas contratadas mediante licitação.

Pois bem, sendo a contratante pessoa jurídica de direito público, que contrata a empresa mediante processo licitatório, é fato que a contratação não decorre de ato discricionário da Administração, e sim de ato vinculado, pois “Poder Vinculado, também denominado de regrado, é aquele que a lei confere à Administração Pública para a prática de ato de sua competência, determinando os elementos e requisitos necessários à sua formalização.”[1]

Desta forma, não se pode condenar a Administração Pública afirmando “culpa in eligendo”, como a maioria dos julgados vêm fazendo, pois a ação do Administrador na contratação da empresa fica restrita aos pressupostos estabelecidos pela norma legal para a validade da atividade administrativa, absorvendo a liberdade do administrador. Sendo a empresa vencedora do processo licitatório idônea, a Administração não pode contratar outra.

Por mais este motivo, deve ser deixada de lado a conjectura de responsabilização subsidiária da Administração Pública.

Por derradeiro, a meu ver, somente a Lei 8666/93 acaba por afastar categoricamente a Administração de toda responsabilidade pelo não pagamento dos créditos trabalhistas pelo contratado, sendo inapta qualquer interpretação diversa.

 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

 

<http://www.tst.gov.br/>. Acesso em: 31 mai. 2006

 

 GUERRA, Carlos Eduardo. Direito Administrativo - Poder Discricionário e Vinculado. Disponível em: <http://www.vemconcursos.com/opiniao/index.phtml?page_sub=5&page_id=603>. Acesso em: 31 mai. 2006.

WILGES, Fernando dos Santos. Da impossibilidade de se responsabilizar subsidiariamente a administração pública por débitos trabalhistas dos empregadores contratados mediante licitação. Jus Navigandi, Teresina, a. 5, n. 47, nov. 2000. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=465>. Acesso em: 31 mai. 2006.

 

 

 


 

[1] GUERRA, Carlos Eduardo. Direito Administrativo - Poder Discricionário e Vinculado. Disponível em: <http://www.vemconcursos.com/opiniao/index.phtml?page_sub=5&page_id=603>. Acesso em: 31 mai. 2006.