PROVA JUDICIAL VIA-SATÉLITE: INTERROGATÓRIO ON-LINE

 

Vinicius Roberto Prioli de Souza[1]

Luciana Laura Tereza Oliveira Catana[2]

 

SUMÁRIO. 1. INTRODUÇÃO. 2. INTERNET. 3. INTERROGATÓRIO. 4. INTERROGATÓRIO ON LINE. 5. CONCLUSÃO. 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.

 

 

1. Introdução

O avanço tecnológico juntamente com o acesso cada vez maior da população às suas facilidades trouxe por conseqüência profundas transformações nos aspectos da vida cotidiana.

 

Atualmente fica impossível imaginar como seria o dia-a-dia da humanidade sem a integração das pessoas através da informática. Tanto é assim que o poder de uma nação contemporaneamente se baseia na tecnologia que esta produz e exporta aos demais países.

 

Ocorre que toda nova tecnologia gera uma grande polêmica, como por exemplo, no caso da viabilidade de utilização do interrogatório on-line em nosso sistema judiciário atual. No entanto, há que se observar que todo novo avanço traz seus riscos e benefícios.

 

O desenvolvimento gigantesco da tecnologia possibilitou a evolução dos meios de comunicação, os quais são essenciais no atual mundo globalizado. A maior demonstração de força deste fato é a Internet, originada da união da informática com a comunicação.

 

No mundo atual deve ser observado a influência da informática em todas as atividades humanas, sejam elas com a simples finalidade de diversão ou, até mesmo, com o fim de se realizar negócios jurídicos utilizando-se do meio virtual, como no caso do comércio eletrônico.

 

A Word Wide Web (www), como também é denominada a Internet, atua como meio de facilitação à comunicação humana e que por fim, dá celeridade ao fluxo de informações, é uma realidade inegável, cujos efeitos se observa na alteração do cotidiano de todos.

 

É indiscutível o conforto e as facilidades que a rede mundial oferece, tais como diversão, ajuda, informação, produtos e serviços, entre outros.

 

Na questão de direito processual, em especial o processo penal, há uma séria discussão doutrinária no sentido de se permitir à realização de interrogatórios on-line, ou seja, sem a presença física do Magistrado, do Promotor de Justiça, do querelante e do advogado do querelado.

 

Alguns doutrinadores consideram o interrogatório virtual, um grande avanço dentro do Direito Processual Penal, referindo-se à celeridade e forma de se evitar o constrangimento de comparecer em juízo face-a-face com o Magistrado.

 

Por sua vez, outros doutrinadores, entendem que o contato do juiz da causa com o acusado é de grande importância, pois as circunstâncias judiciais da pena (artigo 59 do Código Penal) ficam mais evidentes no contato pessoal entre as partes, e da mesma forma, a verdade real pode ser esclarecida por causa da presença física do juiz.

 

2. Internet

A rede mundial teve seu surgimento na década de 60, pelas Forças Militares Americanas e tinha por objetivo a criação de um meio para transmissão de dados entre um computador e outro.

 

Durante muitos anos, o acesso à Internet ficou restrito às Instituições de Ensino e Pesquisa. A partir da década de 80, os microcomputadores passaram a ter um custo menor, sendo acessível à parte considerável da população. Já no início dos anos 90, a Internet ultrapassou a marca de um milhão de usuários e teve início a sua utilização para fins comerciais. Atualmente, grande parte da população pode se conectar a Rede Mundial, desde que se associe a um provedor de acesso.[3]

 

Ao definir internet, Gustavo Testa Correa, diz que,

(...) um sistema global de rede de computadores que possibilita a comunicação e a transferência de arquivos de uma máquina à outra máquina conectada na rede, possibilitando, assim, um intercâmbio de informações sem precedentes na história, de maneira rápida, eficiente e sem a limitação de fronteiras, culminando na criação de novos mecanismos de relacionamento.[4]

 

A Internet não é apenas uma rede, que possibilita a comunicação entre poucos computadores, mas sim uma Teia Mundial, na qual não é possível o controle por um indivíduo, grupo ou organização. A verdade é que não há gerenciamento centralizado para a Internet. Pelo contrario, é a forma mais pura de democracia eletrônica.

 

A Internet compreende redes que estão conectadas umas às outras, via caminhos que objetivam facilitar o intercâmbio de informações, dados e arquivos. Estar conectado à Internet significa ter acesso a esses caminhos. Utilizando estes, podemos enviar partes de dados e arquivos a qualquer outro computador conectado à Internet.

 

No caso do interrogatório on-line pode ser utilizado o sistema de e-learning, ou seja, um sistema via satélite. E-learning consiste em uma nova modalidade de aprendizagem à distância, atualmente muito utilizada por instituições de ensino, na qual o professor ao proferir sua aula de uma localidade especifica, em tempo real, todas as informações de vídeo e áudio são transmitidas via satélite para diversas localidades, instantaneamente.

 

Segundo Patrícia Peck,

Informação era um item caro, pouco acessível e centralizado. O cotidiano do mundo jurídico resumia-se a papeis, burocracia e prazos. Com as mudanças ocorridas desde então, ingressamos na era do tempo real, do deslocamento virtual dos negócios, da quebra de paradigmas (...) O Direito também é influenciado por essa nova realidade. A dinâmica da era da informação exige uma mudança mais profunda na própria forma como o Direito é exercido e pensado em sua pratica cotidiana.[5]

O sistema e-learning permite o desenvolvimento de um mercado de conteúdos (recursos pedagógicos), facilmente disponíveis através da Internet e acessíveis a quem disponha de um sistema integrado de e-learning (LMS - Learning Management System), mas não pretenda conceber conteúdos. E-learning é uma combinação de recursos, interatividade, apoio à performance e atividades estruturadas de aprendizagem.

Se o referido sistema já pode e é utilizado com sucesso por instituições de ensino, porque não pode ser utilizado com o fim da realização de um interrogatório, acarretando assim, a celeridade na prestação jurisdicional e uma enorme redução de custos para o Estado?

A Internet é um diferencial que vem sendo amplamente utilizado em todo o mundo, contribuindo substancialmente para a criação de ambientes de aprendizagem e comunidades virtuais, eliminando barreiras de tempo e espaço.

Com o sistema de funcionamento on-line, pode não somente realizar o interrogatório, para tomada de declarações do indiciado ou suspeito, na fase policial, ou do acusado, na fase judicial, mas também:

·                                  O depoimento, para a tomada de declarações de vítimas, testemunhas e peritos;

·                                  O reconhecimento, para a realização de reconhecimento do suspeito ou do acusado, à distância, ato que atualmente se faz apenas com o uso de fotografias;

·                                  A sustentação oral à distância, perante tribunais, por advogados, defensores e membros do Ministério Público;

·                                  O comparecimento, mediante o qual as partes ou seus procuradores e os membros do Ministério Público acompanham os atos processuais à distância, neles intervindo quando necessário;

·                                  A sessão, ou a reunião virtual de juizes integrantes de tribunais, turmas recursais ou turmas de uniformização de jurisprudência;

·                                  A justificação, em atos nos quais seja necessário o comparecimento do acusado perante o juízo, como em casos de sursis processual e penal, fiança, liberdade provisória, entre outros.

Desta feita justificável a implantação do sistema interrogatório on line como forma de economia processual e de segurança pública.

3. Interrogatório

Na doutrina, o instante do interrogatório é sempre visto como um momento muito importante, pois, além de meio de prova, mais que isso, é meio de defesa. O interrogatório advém de um processo penal muito rústico que era pautado pelo método inquisitivo, com vistas somente a formular provas para consubstanciar a acusação com armas para fundamentar um édito condenatório.

Com a evolução política, a democracia ganhou vida e assim floresceu a república, sedimentando o devido processo legal e a ampla defesa, como corolários angulares do processo penal.

Interrogatório é um ato exclusivo do Estado – Juízo, com a participação da acusação e da defesa,[6] pelo qual o réu pode dar sua versão a respeito dos fatos que lhe foram imputados pelo acusador ao Magistrado por via da inicial penal. Por outro lado, é a oportunidade que possui o Magistrado de conhecer pessoalmente aquele que será julgado pela Justiça Criminal. Representa, ainda, uma das facetas da ampla defesa, que se completará com a defesa técnica a ser produzida pelo advogado do acusado. Sendo assim, uma demonstração da defesa da imputação, bem como prova da imputação realizada na exordial.

O interrogatório é indispensável à validade do Processo Penal. Os próprios termos do artigo 185, Código de Processo Penal, “será qualificado e interrogado”, autorizam essa conclusão. Sua falta, quando presente o réu, gera nulidade absoluta, artigo 564, inciso III, alínea “e”, combinado com o artigo 572, Código de Processo Penal, entretanto há entendimento contrário do STF (RTJ, 73/758), que estabelece esta nulidade seria meramente relativa.

Para Fernando Capez,

Ao contar a sua versão do ocorrido o réu poderá fornecer ao juízo elementos de instrução probatória, funcionando o ato, assim, como meio de instrução da causa. Todavia, essa não é a finalidade a qual se predispõe, constitucionalmente, o interrogatório, sendo a sua qualificação como meio de prova meramente eventual, insuficiente, portanto, para conferir-lhe a natureza vislumbrada pelo Código Processual Penal.[7]

 

 

Portanto o interrogatório hoje, nada mais é que um meio de prova, servindo para que o réu realize sua defesa pessoal, tentando consolidar no Magistrado a inocência da imputação que lhe pesa ou argumentando com vistas a facilitar sua defesa.

 

Não vigora no Processo Penal o princípio da identidade física do Juiz, ao contrário do que acontece no Processo Civil (artigo 132, caput, Código de Processo Civil). No Processo Penal o Juiz interrogante não precisa ser necessariamente o respectivo Juiz julgador. Contudo, de forma mais correta ser, pois é importante para o ato de julgar este contato pessoal entre julgador e julgado, e o interrogatório é justamente o momento desse contato.

 

No entendimento de Segundo Rômulo de Andrade Moreira:

No processo penal não vige tal princípio, donde se conclui que o Juiz interrogante não precisa necessariamente ser o respectivo julgador, ainda que assim de preferência devesse ser, pois se nos afigura de suma importância para o ato de julgar este contato pessoal entre julgador e julgado, e o interrogatório é justamente o momento em que o juiz conhecerá o acusado, tomará conhecimento pessoal (e não somente através da leitura de um depoimento escrito) do homem a ser por ele condenado ou absolvido.[8]

 

Pode ocorrer que Juiz julgador, caso não tenha sido quem presidiu ao interrogatório do acusado, sendo assim o Juiz julgador poderá proceder à nova inquirição do acusado, ou seja, novo interrogatório, nos termos dos artigos 196 e 502, parágrafo único, do Código de Processo Penal, ainda que o processo esteja em grau de recurso.

Pode o interrogatório servir como método de prova, quando a lei o considera fato probante, ou ainda, como instrumento de defesa, quando se entende que ele por si só nada prova, mas apenas faz referência ao fato probante.

Devendo ser considerado como uma importante fonte de prova, sempre que contiver indicações úteis, cujas comprovações sejam necessárias.

Antes de iniciado o interrogatório, o acusado será advertido de seu direito de permanecer calado e de não responder perguntas que lhe forem formuladas[9]. Este direito de permanecer calado já está assegurado no artigo 5º, inciso LXIII, da Constituição Federal, sem que seu silêncio possa causar-lhe qualquer presunção contrária à sua presumida inocência.

Se o silêncio está entre os direitos e garantias fundamentais previstos constitucionalmente, é inadmissível que o seu uso possa trazer qualquer tipo de prejuízo para quem o utilize. Desta feita andou vem o legislador em alterar a redação do artigo 186 do Código de Processo Penal pela Lei nº 10.792/03.

Tendo em vista que o interrogado possui o direito indiscutível de não se auto-incriminar, ou seja, de não fazer prova contra si mesmo, conforme especifica o princípio nemo tenetur se detegere (direito de silêncio) de acordo com o Pacto de São José da Costa Rica, do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos de Nova York, ambos já incorporados em nosso ordenamento jurídico.

Segundo Fernando da Costa Tourinho Filho,    

Sempre pensamos, em face de sua posição topográfica, fosse o interrogatório, também, meio de prova. E, como tal, era e é considerado. Meditando sobre o assunto – principalmente agora que a Constituição, no art. 5°, LXIII, reconheceu o direito do silêncio -, chagamos a conclusão de ser ele, apenas, um meio de defesa. Embora o juiz possa formular ao acusado uma série de perguntas que lhe parecem oportunas e úteis, transformando o ato numa oportunidade para a obtenção de provas, o certo é que a Constituição de 1998 consagrou o direito ao silêncio.[10]

O princípio da ampla defesa, esculpido no artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal engloba não somente a defesa técnica, como também a denominada autodefesa ou defesa pessoal, exercida pelo próprio acusado quando, por exemplo, depõe pessoal e livremente no seu interrogatório.

Como já especificado acima, no interrogatório há a  participação das partes, onde, após o magistrado proceder ao interrogatório, indagará a acusação e após a defesa se restou algum fato para ser esclarecido, formulando as perguntas correspondentes se o entender pertinente e relevante.

A ausência injustificada do acusado poderá implicar em sua condução coercitiva, segundo disposto no artigo 260, Código de Processo Penal, no entanto tal obrigatoriedade em comparecer não significa a obrigação de produzir prova contra si, já que todo cidadão tem o dever de atender ao chamado da autoridade.[11]

Caso o acusado resida em comarca diversa do Juízo processante poderá ser realizar o interrogatório por meio de Carta Precatória, segundo Jurisprudência Pacifica. Por fim, havendo co-réus, os interrogatórios deverão se realizar separadamente (artigo 191, do Código de Processo Penal).

O interrogatório será realizado na fase investigatória e processual, porém, sem deixar de observar ser ele um ato jurisdicional. Este deverá acontecer logo após a citação do réu e em prazo razoável. O interrogatório poderá ser realizado em qualquer fase do processo, mesmo que já o tenha sido, inclusive em grau de recurso (artigo 616, do Código de Processo Penal).

Portanto podemos resumir o interrogatório em 3 características principais:

O interrogatório consiste em três etapas:

4. Interrogatório On-line

Entre os novos meios de provas que podem se apresentar no âmbito processual podemos citar: a prova judicial via satélite, como o interrogatório via internet no processo penal. A utilização do presente recurso tecnológico com as devidas precauções por parte do Poder Judiciário, com certeza trazendo benefícios ao processo e, sem dúvida, aumentando sua celeridade. Não se deve impedir a modernização dos meios de produção de prova que sejam úteis e eficazes no descobrimento da verdade mais que pelos tradicionais.

Ao tratar-se da realização do interrogatório utilizando-se do meio virtual, obtem-se a seguinte idéia: de um lado estaria o Magistrado, o qual permaneceria no Fórum, defronte a ao computador, conectado via Internet ao presídio, casa de detenção provisória, ou um outro local adequado, onde estaria o réu, realizando seu depoimento face a um outro computador, afastando deste modo, o contato direto entre o réu e o juiz da causa, ou seja, de um lado, no Fórum, o Magistrado e de outro lado da linha numa teleconferência, no presídio, casa de detenção provisória ou em outro local adequado, o acusado, sem, contudo um contato pessoal físico entre ambos.

Essa conexão se realizará em um mesmo momento, pois os acessos visuais e auditivos são instantâneos, somente afastando o contato físico entre o julgador e o imputado, e, uma vez estabelecida esta conexão, a audiência poderia ser realizada normalmente, sem que ocorra prejuízo aos direitos e garantias fundamentais assegurados ao acusado. Tal audiência poderia ser estabelecida através do sistema e-learning, supracitado.

Diversas são as manifestações contrárias ao teleinterrogatório. Para o Conselho Federal da OAB e para Associação dos Advogados de São Paulo, tal método “viola direitos e garantias fundamentais”, pois é comum no interrogatório o acusado apresentar denúncias contra a atuação da polícia ou agentes carcerários. E isso só pode ser feito num ambiente neutro.

Segundo eles, o contato entre Magistrado e preso, embora custoso para a administração pública, é essencial e se o subtrairmos, será extremamente danoso, sobretudo, para o réu pobre, que só conhece o advogado no Fórum.

O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária do Ministério da Justiça manifestou-se oficialmente contrariamente ao teleinterrogatório no Brasil através da Resolução n°. 5, de 30 de setembro de 2002, rejeitando a proposta de realização de teledepoimentos de réus, consubstanciada na Portaria n°. 15/2002, mesmo para a ouvida de presos considerados perigosos. Essa manifestação não tem força normativa e não tem impedido a implantação do sistema em juízos criminais e de execuções penais por todo o Brasil.

A resistência ao teleinterrogatório tem fundamento nos princípios do devido processo legal e da ampla defesa, artigo 5º, incisos LIV e LV, da Constituição Federal, e ainda no artigo 185 do Código de Processo Penal, que estabelece que "o acusado será qualificado e interrogado na presença de seu defensor, constituído ou nomeado"[12]. A questão é o uso da expressão “comparecer perante a autoridade judiciária”.

Data vénia o artigo 185 do Código de Processo Penal não inviabiliza o sistema de teleinterrogatório, tendo em vista que pela sistemática do Código de Processo Penal, "comparecer" nem sempre significa necessariamente estar na presença física do juiz, ou estar no mesmo ambiente que este.

Comparece aos autos do processo quem se dá por ciente da intercorrência processual, ainda que por escrito, ou quem se faz presente por meio de procurador. O comparecimento físico do acusado perante a autoridade judicial não é exigido pelo direito internacional nem pela Constituição brasileira.

Com a utilização do interrogatório por meio digital, a desburocratização da justiça criminal poderia ser alcançada. Havendo ainda, um gasto muito elevado à realização de interrogatório tradicional, sendo assim interrogatório virtual ou teleinterrogatório uma forma de economia do erário público.

Neste sentido leciona Carlos Henrique Borlido Haddad que,

Não veríamos problema em utilizar o interrogatório on-line em ocasiões especiais, por exemplo, se o transporte do preso viesse a provocar transtornos de tal monta que fosse recomendável a inquirição via computador. Mas substituir o juiz pela tela de computador, em toda e qualquer situação, é fazer da exceção, regra, e tornar o incomum a solução das questões que se resolve com simples medidas. [13]

 

Para a perfeita validade do interrogatório, é imprescindível a presença de um funcionário da Justiça no local onde se encontra o acusado, visto que este precisa ser identificado, qualificado e devidamente cientificado, em voz alta, das perguntas que serão formuladas pelo Juiz.

Ao funcionário da Justiça cabe fiscalizar a realização do ato. A presença do Ministério Público junto ao Juiz é de suma importância. O local onde se realiza o interrogatório, deve ter acesso possibilitado a quem queira assistir o ato, tendo em vista o princípio da publicidade.

Vários doutrinadores são contra interrogatório on-line, pois alegam que este afasta o acusado da única oportunidade que ele tem de falar ao juiz, além do que o interrogatório on-line, traria frieza e impessoalidade ao depoimento do acusado. Indiscutível que o interrogatório é o momento de contato entre Magistrado e acusado, onde é necessário ouvir o acusado, entretanto, isto ocorre normalmente no caso do interrogatório on-line, pois o juiz mantém contato direto, imediato e, ouvi e vê perfeitamente o acusado em tempo real, como ocorre com o funcionamento do sistema e-learning.

Neste sistema é possível colher elementos suficientes para o convencimento do Magistrado, sem que com isto ocorra nenhum vício.

 Em casos que o acusado estiver sendo ameaçado, de qualquer forma, ou outros fatos de interesse pessoal, como os maus tratos ocorridos no cárcere, ou de interesse da causa, para que tal dificuldade fosse sanada, bastaria que o acusado fosse ouvido em outro local. Não se pode deixar que a “Lei do Silêncio”, havida dentro das prisões, sonegue a chance de o acusado ser ouvido e garantido a ele seus direitos e garantias fundamentais.

A verdade real pode facilmente ser analisada através do sistema atualmente denominado de e-learning, pois o som, voz e imagem são instantâneos, imediatos, diretos, não sendo possíveis tais fraudes. O interrogatório não precisaria ocorrer especificamente no presídio, porém poderia ocorrer em outro ambiente adequado.

Apesar da crescente adoção de processos eletrônicos, bem como a adoção de sistemas informáticos para o tratamento de informações e a prestação de serviços mais céleres aos jurisdicionados, ainda se percebe forte resistência à implementação de sistemas mais modernos que permitam a coleta de provas à distância.

A utilização de videoconferência para a tomada de declarações de suspeitos ou acusados de crimes levanta maior repulsa entre os críticos, principalmente quando se fala em aplicações de novas tecnologias, tais como, a informática jurídica, tendo em vista a necessidade de assegurar ao acusado os princípios da ampla defesa e do contraditório e o princípio do devido processo legal.

Outros países já adotam o interrogatório on-line, sem qualquer lesão a direitos individuais do acusado, podendo citar como exemplo Nações Democráticas da Europa. Nos últimos cinco anos, vários países inseriram em suas legislações dispositivos que permitem a utilização de sistemas de videoconferência para a produção de provas judiciais, tanto em ações civis, como em ações penais.

As Organizações das Nações Unidas (ONU), não tem dúvida dos benefícios que a adoção do sistema de videoconferência pode trazer para a produção de provas processuais penais em todo o mundo, sendo que o Tribunal Penal Internacional de Haia, admite a oitiva de testemunhas e de peritos através de videoconferência.

A nova tecnologia evitaria ainda os julgamentos à revelia e os fenômenos processuais a ela correlatos, nos casos de impossibilidade física de comparecimento do incriminado, seja por motivos de doença ou por incapacidade financeira, reduzindo assim as hipóteses de aplicação do artigo 366, do Código de Processo Penal, que se o réu comparece virtualmente ao processo não haverá porque suspender o andamento da ação penal e o curso do prazo prescricional, pois sua presença é real e atual. Nem mesmo haveria motivos para a decretação de Prisão Preventiva do acusado, que "não comparecer", havendo uma grande vantagem processual e material para o réu, isto sem que levemos em conta a celeridade processual obtida com esta nova tecnologia.

Uma outra vantagem deste sistema é a maior amplitude e efetividade do princípio da publicidade, previsto no artigo 5º, inciso LX, e no artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal, pois quando os atos processuais são realizados por videoconferência, um número infinito de pessoas poderiam tomar conhecimento desses.

5. Conclusão

O Judiciário não pode ficar alheio à modernidade tecnológica. A informática, evidentemente, trouxe avanços indiscutíveis e devemos utilizá-la para proporcionar a tão almejada eficiência da Justiça, mas com uma certa dose de critério e atentos a princípios inseparáveis do devido processo legal.

O interrogatório criminal on-line pode ser realizado, em perfeita compatibilidade com a ordem constitucional vigente e em harmonia com os mais caros princípios de proteção à pessoa humana, desde que assegurados som e imagem nos ambientes onde estão, respectivamente, juiz e interrogado.

O interrogatório a distância não é algo maléfico em si, mas é evidente que deve ser dotado de uma série de garantias, sob pena de total desrespeito à Constituição Federal. Sendo que jamais pode ser realizado sem a presença do defensor e do Ministério Público, permitindo-se, ademais, a ambos, a participação contraditória.

São poucas as possibilidades de interrupção da transmissão por falhas técnicas e a perda de contato físico  entre os sujeitos processuais, sendo preciso perceber que os mecanismos tecnológicos atuais permitem grande grau de detalhe nas transmissões. Pequenas reações corporais e faciais e tênues variações da voz podem ser captadas e transmitidas pelas mídias mais modernas. Não há assim razão para temer a impossibilidade de feedback e/ou delays entre o juiz e o interrogado.

Portanto, desde que seja garantida a liberdade probatória ao acusado e que sejam assegurados ao réu os direitos de ciência prévia, participação efetiva e ampla defesa  (inclusive com o acompanhamento do ato in loco por seu defensor e/ou por um oficial de justiça), não há razão para temer o teleinterrogatório, sob o irreal pretexto de violação a direitos fundamentais do acusado no processo penal. Até porque só há nulidade processual, quando existir prejuízo, e não se pode afirmar que essa é a regra no tocante a teledepoimentos criminais.

A mudança do procedimento de apresentação do réu ao juiz, não elimina nenhuma garantia processual, nem ofende os ideais do Estado de Direito. Sendo necessário para isso somente que se adote um formato de videoconferência que permita aos sujeitos processuais o desempenho, à distância, de todos os atos e funções que seriam possíveis no caso de comparecimento físico.

 

 

 

 

6. Referências Bibliográficas

 

AZEVEDO, David Teixeira de. Atualidades no Direito e Processo Penal. 1 ed., São Paulo: Método, 2001.

 

BRASIL. Código de Processo Penal. 5.ed. São Paulo: RT, 2000.

 

BRASIL. Código Penal. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2003.

 

BRASIL; Constituição (1988). Constituição Federal, Código Penal, Código de Processo Penal. 5. ed., São Paulo: RT, 2003.

 

BARROS, Marco Antônio de. A busca da verdade no processo penal. 1. ed., São Paulo: RT, 2002.

 

CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal, 3. ed. São Paulo: Saraiva, 1999.

 

CHOUKR, Fauzi Hassan, AMBOS, Kai, Tribunal Penal Internacional. São Paulo: RT, 2000.

 

CORRÊA, Gustavo Testa.  Aspectos Jurídicos da Internet. 1. ed., São Paulo: Saraiva, 2000.

 

DOTTI, René Ariel. O interrogatório à distância. Brasília: nº. 29.

 

DEMERCIAN, Pedro Henrique. MALULY, Jorge Assaf. Curso de Processo Penal. 1. ed., São Paulo: Atlas, 1999.

 

D’URSO, Luiz Flavio Borges. O interrogatório on-line uma desagradável justiça virtual. Publicado no Jornal Síntese, n°. 11 – Jan/1998, p. 13.

 

ESPÍNOLA FILHO, Eduardo. Código de Processo Penal Brasileiro Anotado. 1. ed., Campinas: Bookseller, 2000.

 

GOMES, Luis Flavio. O interrogatório à distância.

Disponível em: www.iusnet.com.br.

Acesso em 27 abr. 2004.

 

GOMES FILHO, Antônio Magalhães. Presunção de inocência e prisão cautelar. 1. ed., São Paulo: Saraiva, 1991.

 

HADDAD, Carlos Henrique Borlido. O interrogatório no processo penal. 1. ed., Belo Horizonte: Del Rey, 2000.

 

JESUS, Damásio E. de. Código de Processo Penal Anotado. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2002.

 

JUIZADO especial criminal estadual e a Lei n.10.259, de 2001: doutrina, jurisprudência, legislação. 1. ed. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002.

 

MARQUES, José Frederico. Estudos de Direito Processual Penal. 1. ed., Forense, 1960.

 

MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. 13. ed., São Paulo: Atlas, 2002.

 

MORAES, Alexandre de. Direito constitucional.  7. ed., São Paulo: Atlas, 2000.

 

__________________. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2003.

 

MOREIRA, Rômulo de Andrade. Direito Processual Penal. 1. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2003.

 

MOSSIN, Heráclito Antônio. Curso de Processo Penal, vol. 3. 3. ed., São Paulo: Atlas, 1998.

 

NOGUERIA, Pedro Lúcio. Curso Completo de Processo Penal. 11. ed., São Paulo: Saraiva, 2000.

 

NORONHA, Edgard Magalhães. Curso de Direito Processual Penal. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1972.

 

PECK, Patrícia. Direito Digital. 1. ed., São Paulo: Saraiva, 2002.

 

PRADO, Luiz Regis; BITENCOURT, Cezar Roberto. Código penal anotado e legislação complementar. 2. ed., São Paulo: RT, 1999.

 

STEINER, Sylvia Helena de Figueiredo. A convenção americana: sobre direitos humanos e sua integração ao processo penal brasileiro. 1. ed., São Paulo: RT, 2000.

 

TORNAGUI, Hélio Bastos. Curso de Processo Penal, V. 1. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 1997.

 

TOURINHO NETO, Fernando da Costa; FIGUEIRA JÚNIOR, Joel Dias. Juizados Especiais Federais Cíveis e Criminais: comentários à lei 10.259, de 10.07.2001. 1. ed., São Paulo: RT, 2002.

 

_________________________________. Processo Penal, v. 3. 24. ed., São Paulo: Saraiva, 2002.

 


 

[1] Mestrando em Direito pela Universidade Metodista de Piracicaba/SP – UNIMEP. Bacharel em Direito pelas Faculdades Integradas “Antônio Eufrásio de Toledo” de Presidente Prudente/SP. E-mail: vinicius_demolay@yahoo.com

[2] Bacharel em Direito pelas Faculdades Integradas “Antônio Eufrásio de Toledo” de Presidente Prudente/SP. E-mail: lucianalaura80@itelefonica.com.br

[3] É o que para muitos se denomina direito fundamental de quarta dimensão, relacionado ao direito a informação.

[4] CORRÊA, Gustavo Testa.  Aspectos Jurídicos da Internet. 1ed., São Paulo: Saraiva, 2000, p. 08.

 

[5] PECK, Patrícia. Direito Digital. 1ed., São Paulo: Saraiva, 2002, p. 01.

 

[6] Conforme especifica o artigo 188 do Código de Processo Penal, com a redação dada pela Lei nº 10.792/03.

[7] CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal, 3 ed. São Paulo: Saraiva, 1999, 260.

[8] MOREIRA, Rômulo de Andrade. Direito Processual Penal. 1ed., Rio de Janeiro: Forense, 2003, 183.

 

[9] Conforme especifica o artigo 186 do Código de Processo Penal, com a redação dada pela Lei nº 10.792/03.

[10] TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal, v. 3. 24ed., São Paulo: Saraiva, 2002, p. 240.

 

[11] O projeto do novo Código de Processo Penal não mais prevê a possibilidade de condução coercitiva do agente que não comparece para ser interrogado. O motivo da retirada de tal formalidade se faz pelo fato de que, se o agente possui o direito constitucional de permanecer calado e de não responder as questões a ele formuladas, então não há motivos para conduzi-lo para somente estar diante do magistrado.

[12] Verifica-se a impossibilidade de realização de interrogatório sem a presença de defensor. Caso o defensor constituído não compareça deverá ser nomeado um ad hoc para o ato.

[13] HADDAD, Carlos Henrique Borlido. O interrogatório no processo penal. 1ed., Belo Horizonte: Del Rey, 2000, 214.