ATA NOTARIAL COMO PROVA
NO PROCESSO CIVIL
SUELENE
COCK CORREA CARRARO[1]
(Bacharel em Direito pela Universidade
Paranaense – Unipar.)
Resumo
Trata-se de um artigo jurídico abordando a ata notarial como
prova no processo civil. Objetivou-se apresentar
estudos sobre a importância da ata notarial para as pessoas em seu cotidiano,
buscando não apenas debate sobre o tema mas, e principalmente, contribuir com
sua divulgação. Longe de se investigar algo novo, buscou-se definir a ata
notarial, apresentar sua fundamentação legal, suas principais características
e, de forma didática, direcionando o estudo para sua concepção enquanto prova
processual, focalizando sua função e importância social, enquanto mais um
instrumento de auxílio à efetivação da justiça, dado seu valor jurídico, não
apenas enquanto prova no processo civil, que por si só já seria o bastante.
Para tanto, inicia-se a investigação apresentando breve menção sobre a
origem e o conceito de ata notarial e a sua normatização no sistema
brasileiro, para então verificar como este documento pode ser utilizado de
forma a beneficiar a sociedade brasileira.
Palavras-chave
Direito
Processual Civil; Direito Constitucional; Lei dos Cartórios; Prova Documental;
Documento Público; Ata; Documento; Ata Notarial; Serviços Notariais e de
Registro; Notário; Tabelião.
Abstract
One
is about a legal article approaching the act notary as test in the civil action.
It was objectified to present studies on the importance of the notary act for
the people in its daily one, searching not only debate on the subject but, e
mainly, to contribute with its spreading. Far of if investigating something new,
one searched to define the notary act, to present its legal recital, its main
characteristics and, of didactic form, directing the study for its conception
while it proves procedural, focusing its function and social importance, while
plus an instrument of aid to the do of justice, data its legal value, not only
while it proves in the civil action, that by itself already it would be
sufficiently. For in such a way, it is initiated soon inquiry presenting mention
on the origin and the concept of notary act and its norm in the Brazilian
system, for then verifying as this document it can be used of form to benefit
the Brazilian society.
Key-Words
Civil
Procedural Law; Constitutional Law; Law of the Notary's Offices; Documentary
Evidence; Public Act; Act; Document; Notary Act; Notary Services and of
Register; Notary; Notary.
1 INTRODUÇÃO
Não é de hoje que o Brasil vem sofrendo intensa atividade
legislativa para desespero de quantos pretendem cumprir rigorosamente suas leis. Faz
parte da cultura deste país o excesso de leis e as dificuldades de serem
conhecidas, quanto mais cumpridas e atendidas. Talvez seja essa a razão da Lei
dos Cartórios ser ainda pouco conhecida e estudada. A citada Lei dos Cartórios
é a Lei nº 8.935, de 18 de novembro de 1994[2],
instituída para regulamentar o artigo 236 da Constituição Federal, dispondo
sobre serviços notariais e de registro.
A
referida lei trata, em seu artigo 7º, inciso III, que aos “tabeliães de
notas compete com exclusividade”, além da prática de outros atos, “lavrar
atas notariais”.
Com o
advento da Lei nº 8.935, de 18 de novembro de 1994, criou-se um novo ato
notarial, denominado “ata notarial”,
cuja lavratura compete exclusivamente aos notários.
Muito
embora ainda pouco conhecida e utilizada pela população em geral, ou pelo
menos não explorada como deveria em decorrência de sua extremada utilidade em
diversas situações, a ata notarial é um instrumento que vem sendo estudado
pelo notariado brasileiro desde o início dos anos setenta, quando começaram a
serem abertas as relações do notariado brasileiro com outros países[3].
Extrai-se,
desta constatação, que, se passou a fazer parte do ordenamento jurídico em
1994, mas desde 1970 vem sendo estudado, não é inovação da Lei dos Cartórios.
Na verdade, trata-se de um ato já praticado desde muito pelos cartórios
brasileiros, eis que foi introduzida no ordenamento após ter seu uso
consolidado pelos notários[4]
como prática costumeira. Neste sentido, é possível afirmar que a ata
notarial, no ordenamento jurídico brasileiro, nasceu da fonte de direito,
denominada “costume”.
Desta
forma, além de uma prática recente na história do notariado brasileiro, a ata
notarial, desde a Lei nº 8.935 de 1994, passa a ter sua lavratura como ato
privativo do tabelionato de notas. Até então este instrumento era pouco
difundido.
Em decorrência do desconhecimento da população de que a ata
notarial constitui elemento de prova para ações judiciais, muito embora ao
tempo decorrido desde a edição da lei referida são relativamente poucas as
atas notariais lavradas nos cartórios brasileiros, cuja não utilização
reflete na quase ausência de jurisprudência sobre essa temática.
Portanto,
a ata notarial enquanto narração objetiva de fato presenciado ou verificado
pelo notário, sem seu juízo de valor, e sendo o notário detentor da fé pública,
a ata adquire singular importância para o processo civil brasileiro, se
constitui em uma pré prova para o poder judiciário.
Apenas
como exemplo ilustrativo do que se pretende confirmar, a ata notarial pode ser
utilizada em inúmeras ações relativas a locação de imóveis, para testar o
estado de conservação do mesmo; em casos de acidente de trânsito, para
retratar a ocorrência, enfim, em inúmeras situações. No entanto, é
importante frisar que a ata notarial não se deve prestar para lavratura de
fatos ilícitos e nem mesmo imorais.
A ata
notarial é o instrumento pelo qual o notário, com sua fé pública, autentica
um fato, descrevendo-o em seus livros. Sua função primordial é tornar-se
prova em processo judicial, mas pode e deve ainda servir como prevenção jurídica
de conflitos.
Neste trabalho, objetiva-se apresentar estudos sobre a importância
da ata notarial para as pessoas em seu cotidiano, buscando não apenas debate
sobre o tema mas, e principalmente, a divulgação. Para tanto, longe de se
investigar algo novo, buscou-se definir a ata notarial, apresentar sua
fundamentação legal, suas principais características e, de forma didática,
direcionando o estudo para sua concepção enquanto prova processual,
focalizando sua função e importância social, enquanto mais um instrumento de
auxílio à efetivação da justiça, dado seu valor jurídico, não apenas
enquanto prova no processo civil, que por si só já seria o bastante.
Oportuno trazer o pensamento de BERNARDINO[5]
que, ao tratar da importância da ata notarial para o direito imobiliário,
apresenta certa preocupação em relação à remuneração do tabelião de
notas, competente exclusivo para a lavratura do ato notarial. Segundo ele:
Talvez
o grande entrave para a utilização rotineira do ato notarial seja a remuneração
do tabelião - que no Estado de São Paulo não alcança R$ 30,00 -
desestimulando sua divulgação pelos cartórios de notas. De qualquer modo está
aí um instrumento poderoso para agilizar certas pendências que ocorrem no
setor de locação de imóveis.
Com essas considerações introdutórias, passa-se a analisar a ata
notarial como prova no processo civil brasileiro. Para tanto, considera-se
imprescindível iniciar os estudos apresentando breve menção sobre a origem e
o conceito de ata notarial e a sua normatização no sistema brasileiro, para
então verificar como este documento pode ser utilizado de forma a beneficiar a
sociedade.
2 ATA NOTARIAL NO DIREITO POSITIVO BRASILEIRO
Antes da análise do tema proposto, importa
apresentar a fundamentação normativa do instituto em tela no direito positivo
brasileiro, informado pelo método histórico-funcionalista.
A atividade notarial remonta à Antigüidade, podendo-se dizer, nas
palavras de FISCHER[6],
que “a ata notarial se confunde com a própria existência da atividade
notarial”. Para o citado tabelião:
As
terminologias escribano, escribae,
e notario, tinham, na sua essência, diferentes significados, mas
todos estes vocábulos possuíam elementos comuns, relacionados a uma pessoa que
tinha a qualidade de registrar acontecimentos. Da mesma forma a ata notarial se
assemelha com a escritura pública, na medida em que ambas têm função de
registrar, documentar[7].
Fazendo
um retrocesso histórico, VOLPI NETO[8]
lembra alguns textos bíblicos que mencionam o registro de acontecimentos, desde
momentos remotos, ainda antes da descoberta da escrita:
No
princípio era o verbo [...] e os gestos que marcavam as manifestações de
vontade, os atos públicos eram praticados nas portas da cidade e no paço
municipal onde se encontravam a administração e a Justiça. Nesse tempo, as
expressões de vontade eram marcadas por rituais, compostos por palavras, gestos
e expressões[9].
Nesta época
romana, “os documentos eram aceitos pela manufirmatio,
pela qual, depois da leitura feita pelo notarius
, passava-se à mão pelo pergaminho em sinal de sua aceitação”. Antes
da escrita, “os negócios se realizavam em público, para que as assembléias
fossem o elemento vivo probante daquele ato”. Mais tarde, com o surgimento da
escrita, as manifestações de vontade e os fatos passaram a serem gravados
quase que exclusivamente em papel.
Com a
escrita, veio então o tempo da materialização da prova jurídica. Pela sua
segurança, os documentos escritos constituem importante meio de prova, embora não
excluam outros, no sistema de livre convicção, eis que devem ser examinados em
cotejo com as demais provas.
No Código
de Processo Civil brasileiro em vigor, a partir do artigo 364, trata da “prova
documental”. A expressão “prova”,
do latim proba, de probare,
significa, em sua origem, demonstrar, reconhecer, formar juízo de, convencer,
tornar crível, estabelecer uma verdade, comprovar. Para a filosofia é aquilo
que serve para estabelecer uma verdade por verificação ou demonstração, ou
seja, o que mostra ou confirma a verdade de um fato[10].
Por sua vez, o “documento” é o instrumento representativo de um fato ou
acontecimento. Segundo CARNELUTTI[11],
documento é “uma coisa capaz de representar um fato”. Conquanto possa
apresentar defeitos, inegavelmente se constitui, em conseqüência de sua
estabilidade, como a forma mais segura de perpetuar a história dos fatos. Como
decorrência, a subscrição de documentos tornou-se hegemônica, provocando uma
clara dicotomia entre a prova oral e a escrita. A prova documental passou a ser
definida em oposição à prova oral, ou seja, aquilo que é palpável,
representativo, material.
Muito
embora o “documento” em sentido lato,
compreende não apenas os escritos, mas “toda e qualquer coisa que transmita
diretamente um registro físico a respeito de algum fato, como desenhos e
fotos”, Quando se fala especificamente da “prova documental”, ou seja,
documentos no sentido estrito, “cuida-se dos documentos escritos, que são
aqueles em que o fato vem registrado através da palavra escrita, em papel ou
outro material adequado” [12].
Por sua
vez, a prova documental é classificada em: documento público e particular,
conforme provenham de repartições públicas ou sejam elaborados pelas próprias
partes. Ressalte-se que “documento” é gênero a que pertencem todos os
registros materiais de fatos jurídicos e “instrumento” é, apenas, aquela
espécie de documento preparado pelas partes, no momento mesmo em que o ato jurídico
é praticado, com a finalidade específica de produzir prova futura do
acontecimento[13].
Conforme
disposição do artigo 364 do Código de Processo Civil, o documento público
faz prova não apenas da sua formação, mas também dos fatos que o escrivão,
o tabelião ou o funcionário declarar que ocorreram em sua presença[14].
Portanto, existe presunção legal de autenticidade do documento público, entre
as partes e perante terceiros, fato que decorre da atribuição de “fé pública”
conferida aos órgãos estatais[15].
Ainda
segundo o artigo 364 do Código de Processo Civil, os documentos públicos podem
ser: judiciais, quando elaborados por escrivão, com base em atos processuais ou
peças dos autos; administrativos, quando oriundos de outras repartições públicas;
e notariais, quando provenientes de tabeliões ou oficiais de registros públicos,
e extraídos de seus livros e assentamentos.
É
seguindo o caminho da subdivisão: “prova documental – documento público
– notariais” que se chega à ata notarial, um dos diversos documentos públicos
notariais que pode ser utilizado como prova documental no processo civil.
Portanto,
ata notarial se presta para materialização de algo com intuito de resguardar o
direito do detentor na sua mais alta validez.
Muito
embora seja considerada a ata notarial, como visto, uma prova documental e, em
decorrência da fé pública do tabelião de notas, com competência exclusiva
para lavratura da ata notaria, e, portanto, com grande força probante, “são
poucos os operadores do direito que se utilizam desta ferramenta poderosa”[16].
Atualmente, a previsão da ata notarial no direito
brasileiro decorre de texto constitucional. Dispõe o artigo 236 da Constituição
Federal de 1988[17]
que “os
serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação
do Poder Público”. No parágrafo 1º deste artigo encontra-se que “lei
regulará as atividades, disciplinará a responsabilidade civil e criminal dos
notários, dos oficiais de registro e de seus prepostos, e definirá a fiscalização
de seus atos pelo Poder Judiciário”. Em seguida prevê o parágrafo 2º que
“lei federal estabelecerá normas gerais para fixação de emolumentos
relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro”. Por
fim o parágrafo 3º determina que “o ingresso na
atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos,
não se permitindo que qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso
de provimento ou de remoção, por mais de seis meses”.
Para regulamentar esse dispositivo, editou-se, em
1994, a Lei nº 8.935, de 18 de novembro[18],
conhecida como “Lei dos Cartórios”, que dispõe sobre serviços notariais e
de registro, atribui aos tabeliães competência (exclusiva) para lavrar atas
notariais, em seu artigo 7º, inciso III, facultando-lhes a realização das
gestões e diligências para isso necessárias ou convenientes (artigo 7º, parágrafo
único).
Na
previsão da referida Lei dos Cartórios, o artigo 6º, incisos II e III e o
artigo 7º, incisos I, II e especificamente o inciso III, com o manto do artigo
236 da Constituição Federal de 1988 dispõem, verbis: Artigo 6º: aos notários
compete: [...] II - intervir nos atos e negócios jurídicos a que as partes
devam ou queiram dar forma legal ou autenticidade, autorizando a redação ou
redigindo os instrumentos adequados, conservando os originais e expedindo cópias
fidedignas de seu conteúdo; III - autenticar fatos. Artigo 7º: aos tabeliães
de notas compete com exclusividade: I - lavrar escrituras e procurações, públicas;
II - lavrar testamentos públicos e aprovar os cerrados; III - lavrar atas
notariais; [...].
Trata
deste tema, também, o artigo 364 do Código de Processo Civil[19],
segundo o qual “o documento público faz prova não só da sua formação, mas
também dos fatos que o escrivão, o tabelião, ou o funcionário declarar que
ocorreram em sua presença”.
Ressalte-se, no entanto, que
a ata notarial não substitui a prova, mas qualifica o
evento, principalmente perante o poder judiciário, face ao caráter público e
imparcial do tabelião.
Em suma,
a ata notarial consiste em um recente instrumento notarial aprovado pela legislação
federal, ainda pouco desenvolvido no sistema brasileiro, cujo participante vem
ser apenas o tabelião ou aquele que seja determinado para tal fim.
Nas atas
notariais, não existe a figura do outorgante, o tabelião relata aquilo que vê,
ouve, verifica e conclui, com seus próprios sentidos e própria opinião, não
devendo haver interferência de quem quer que seja.
Portanto,
a ata notarial, nada mais é do que a narração objetiva de uma ocorrência ou
fato, presenciado ou constatado pelo notário, que revestido da fé pública,
pode constituir-se em pré-prova para os processos judiciais, conforme expresso
no artigo 215 do Código Civil de 2002[20],
segundo o qual “a escritura pública, lavrada em notas de tabelião, é
documento dotado de fé pública, fazendo prova plena”, cujo procedimento está
previsto no inciso III do já citado artigo da Lei dos Cartórios.
3 ACEPÇÕES DOUTRINÁRIAS DE ATA NOTARIAL
Depois da breve síntese apresentada no tópico anterior, pode-se
dizer que a ata notarial consiste em um documento através do qual o tabelião
relata tudo aquilo que presenciou ou conduziu. É um instrumento que relata com
fidelidade o que aconteceu e vale como testemunho, garantindo autenticidade ao
negócio.
O tabelião de notas, também chamado de “notário”, enquanto
agente delegado do poder público, tem competência para dar forma jurídica aos
negócios estabelecidos pelas partes, de maneira que eles estejam de acordo com
a legislação vigente e que haja equilíbrio contratual, pois é tarefa do notário
esclarecer e orientar as partes antes de assinar os atos.
Portanto,
a ata notarial é o testemunho oficial de fatos narrados pelos notários no
exercício de sua competência em razão de seu ofício. Todavia, é salutar
considerar que, muito embora diante desta noção, a princípio poder-se-ia
imaginar que estariam, na expressão “ata notarial”, incluídas todas as
escrituras, atente-se para a diferença de que as escrituras, por via de regra,
estabelecem uma relação jurídica entre duas ou mais pessoas, cuja declaração
nem sempre é feita a juízo exclusivo do notário, mas, sim, diante dos
elementos negociados que foram ajustados.
De forma
específica e exclusiva, a constituição da ata notarial se dá por diversos
elementos realizados livremente pelo notário, diante de sua perspectiva e
sensibilidade, segundo o seu parecer, independentemente de posições contrárias,
ou seja, é o testemunho segundo o qual o notário relata fatos que vê e sente,
diante de elementos por ele escolhidos.
Conforme
VOLPI NETO[21],
as atas notariais têm, como primeira idéia “documentar acordos, surgido
pela necessidade do uso de documentos firmados por autoridade, ou seja, sob a fé
pública, para que seu conteúdo obtenha crédito entre as partes e
terceiros”. E, segundo este jurista:
Esse
primeiro pressuposto, é gênese da teoria que distingue ata
de escritura, ambas
suportadas pela fé pública. É preciso que se diga, que há um certo terreno
nebuloso nesse tema, onde alguns autores divergem. Porém a nosso ver essa
distinção é importante, principalmente para o direito notarial brasileiro,
onde há uma grande confusão entre uma e outra. Aliás, diga-se de passagem sua
distinção é bastante clara em nossa lei 8.935 de 1994, artigo 7º,
preservando a boa doutrina.
Finaliza
profetizando que “para qualquer estudo referente ao tema, portanto acho
importante definir bem essa linha entre ata
notarial e escritura pública”.
Para
confirmar este entendimento, basta voltar a “visão” às origens, quando os
atos não eram assinados pelas partes, por que não o sabiam ou por que o
suporte era rudimetar.
Assim, a rigor os escribas eram chamados para constatar fatos e transcrevê-los, fossem contratos ou simplesmente acordos entre a comunidade. Portanto, o sentido e uso das atas notariais é arraigado à própria origem da profissão do notário e, dentro dessa gênese, o conceito de constatação de fatos é muito mais importante, do que a transcrição da vontade das partes que veio em segundo tempo (escrituras)[22].
Conforme TESHEINER[23], “a ata notarial distingue-se da
claramente da escritura pública: esta, a conter declarações de vontade;
aquela, a conter o testemunho de fatos presenciados pelo notário”.
Da
doutrina utilizada para o desenvolvimento deste estudo, constata-se que a
maioria dos juristas que escreveram sobre “ata notarial” utilizam a definição
de IPIENS[24],
e, via de regra, a defendem como um dos conceitos mais completos de ata notarial
já formulado.
Na síntese
do conceito de IPIENS[25],
a ata notarial é o instrumento público autorizado por notário competente, a
requerimento de uma pessoa com interesse legítimo e que, fundamentada nos princípios
da função imparcial e independente, pública e responsável, tem por objeto
constatar a realidade ou verdade de um fato que o notário vê, ouve ou percebe
por seus sentidos, cuja finalidade precípua é a de ser um instrumento de prova
em processo judicial, mas que pode ter outros fins nas esferas: privada,
administrativa, registral, e, inclusive, integradores de uma atuação jurídica
não negocial ou de um processo negocial complexo, para sua preparação,
constatação ou execução.
Segundo
RODRIGUES[26],
a ata notarial não é tão utilizada como poderia ser em benefício da
sociedade em geral. Para o citado escrevente, “o instrumento em tela é pouco
conhecido e utilizado pelos operadores do direito e clientes mais habituados aos
serviços notariais”. Lembra ainda que:
Prevista
em legislação infraconstitucional, a normatização se deu primeiramente no
Rio Grande do Sul, através de provimentos da Corregedoria Geral de Justiça, em
1990. E a partir de 1994, passou a integrar o capítulo II, seção II, da Lei nº
8.935, que rege as atividades dos notários e registradores, atribuindo ao notário
à exclusividade de lavratura da ata notarial.
Compartilhando do entendimento de
TESHEINER[27],
entende-se inegável a
importância e utilidade prática da ata notarial, sobretudo para comprovação
em juízo de fatos relevantes para a decisão da causa. O citado jurista cita,
como exemplo ilustrativo, a consignação em pagamento. Nas suas palavras, a
consignação em pagamento tem lugar se o credor, sem justa causa, recusa
receber o pagamento, ou dar quitação na devida forma. Proposta a ação, pode
o réu alegar, na contestação, que não houve recusa, fato cuja prova, como
fato constitutivo, incumbe ao demandante. Ao invés de depender de duvidosa
prova testemunhal, pode o devedor comprovar a recusa mediante ata notarial, que
é prova testemunhal pré-constituída e com fé pública.
Este é
apenas um exemplo dentre tantos outros fatos que podem ser documentados através
de ata notarial, solvendo inúmeros problemas com que se defrontam partes,
necessitadas de fazer prova de suas alegações. Portanto, as atas notarias têm
largo emprego no processo civil, o que falta é divulgação, é o conhecimento
de sua existência e utilidade, não apenas entre a população, mas de forma
mais urgente, entre os profissionais de direito, principalmente advogados. Sem dúvidas,
a ata notarial constitui uma revolução no processo civil.
4
CARACTERÍSTICAS DA ATA NOTARIAL
Ata
notarial é um ato unilateral declaratório do notário. Trata-se de uma resenha
ou relato por escrito elaborado com segurança, procurando sempre a narrativa de
fatos com riqueza de detalhes que possam caracterizar o fato ocorrido por meio
de uma simples leitura.
BARDALLO[28] ensina que a ata notarial é
caracterizada pela atitude passiva do notário, ou seja, o notário deve
transcrever o que houve e vê (apreensão sensorial) não excluídos o olfato e
tato, e sem maiores solenidades. Já SEGOVIA[29]
assevera que a ata carece do
sedentarismo da escritura, e pelo contrário, se particulariza pelo
“desenvolvimento ambulativo”. É por essas características que a ata
notarial difere da escritura, eis que a escritura, teoricamente, é instantânea
(artigo 134 do Código Civil de 2002), enquanto que a ata
notarial admite sua consecução de forma estendida. Significa dizer que,
segundo VOLPI NETO[30]:
Na
prática isso significa que o notário não está obrigado a redigir a ata
no momento em que presencia o fato, visto que a grande maioria das atas são
feitas em diligências, podendo o
notário fazer suas anotações para posteriormente redigi-las em seu
tabelionato.
Além
dessa característica, outra distinção entre ata notarial e escritura consiste
no fato de que a ata caracteriza
uma narração e a escritura uma redação.
Nessa, o notário transcreve a
vontade das partes, naquela narra
os fatos que presencia[31].
Outra
característica é que, para que seja procedida a lavratura da ata notarial,
deve haver requerimento, uma vez que o notário, por via de regra, não age de
ofício, devendo haver solicitação para sua prática. Este requerimento poderá
ser feito no próprio corpo da ata ou em apartado, e, se na própria ata, não
terá o requerente o direito de aceitar ou não o que dali consta, devendo
apenas preocupar-se com o requerimento e não com seu conteúdo. Deve ser
assinada pelo notário e por este lavrada, podendo, entretanto, designar um
funcionário para a prática do ato.
Quanto
à classificação das atas notariais, em decorrência da grande variedade de
tipos, é praticamente impossível apresentar uma classificação dos fatos
juridicamente protegidos, o que se pode fazer, no entanto, é citar alguns
exemplos ilustrativos de cabimento. Assim, como exemplos de sua utilidade
podem-se citar: comprovação do estado geral de um imóvel na hora de alugar ou
vender; comprovação da entrega de uma determinada soma em dinheiro; constatação
do conteúdo de um cofre, por ocasião de sua abertura; comprovação da existência
ou não de fundos em uma conta bancária; dentre outros.
No
entanto, frise-se, o notário não poderá narrar fatos que não sejam de sua
competência exclusiva, e muito menos atos ilícitos como constatação de um
assalto e assassinatos. Poderá agir sempre quando verificar que seja lícito o
objeto. Mesmo assim, diante da imensa quantidade de fatos juridicamente
amparados, o notário procurara classificar as atas notariais por tipo.
Conforme
constatação de BUSSIÉRE[32]
a doutrina nacional não traz referências á classificação das atas
notariais, somente na estrangeira poderá ser encontrada alguma matéria a
respeito do assunto, destacando-se, entre elas, as materiais, as formais, as típicas
e as atípicas.
Na síntese do citado autor, as
materiais
são aquelas que afetam fatos jurídicos que, por sua índole, não há como
qualificá-los como contrato. Já as formais consistem naquelas em que a lei
estabelece uma manifestação própria, singular e precisa, como, por exemplo,
aprovação de testamento cerrado ou ata de depósito perante o notário. Por
sua vez, as típicas
são atas previstas em lei, com efeito e regulamentação especial, como, por
exemplo, as atas de protesto de título e de casamentos. Por fim, as atípicas
são aquelas que, embora não previstas no ordenamento jurídico, são possíveis
de serem realizadas, uma vez que possuem objeto lícito, agente capaz e fatos
admitidos em direito.
Em suma,
“o trabalho do notário em matéria de ata é principalmente autenticante,
mesmo que desapareça a atividade de jurista enquanto analizador[33]”.
BUSSIÉRE[34],
além da classificação genérica apresentada, constata a existência de
diversas atas que podem ser elaboradas pelo notário como, por exemplo:
a) as atas
de mera percepção, que são aquelas
em que o notário expressa o pensamento adquirido pelos seus próprios sentidos
(constatação de entrega de um documento ou a retificação unilateral de um
erro material cometido em ato notarial). Segundo BUSSIÉRE[35]
esta:
É
a mais pura manifestação de ata notarial, pois trata-se daquela em que o notário
se limita a transcrever conforme a percepção sensorial adquirida quanto ao
fato ocorrido. No entanto, neste tipo de ata, tem que se abster de formulações
a título de juízo pessoal quanto a determinados acontecimentos, sem que para
tal possua conhecimentos técnicos suficientes, no sentido de preservar a genuína
função notarial. Por ser missão do notário a de dar fé aos fatos, atos e
manifestações de vontade ocorrentes em sua presença, não deverá emitir juízo
de valor. Deve limitar-se à narração do que haja percebido, não devendo, de
maneira alguma, realizar uma atividade passiva, porque tem que se esforçar ao máximo,
a fim de obter perfeita identificação da coisa e exata captação da
realidade.
Além
disso:
Na
lavratura desta espécie de ata, o notário não poderá excluir nenhum preceito
legal e deve conhecer a primazia do sentido do que foi visto e apreciado como
fonte de evidência. Assim agindo, o notário lavrará uma ata com maior efeito,
sendo sua presença fundamental, permitindo o convencimento para verificação
da situação jurídica e identificação do objeto[36].
b) as atas de controle e percepção,
aquelas em que o notário não se limita à narração de um
resultado que haja percebido, mas, também, fazendo um controle da legalidade de
sua atuação, mediante a qual chegou à conclusão.
c) atas de manifestação e
declaração de fatos próprios do notário, que são os fatos narrados e testemunhados pelo
notário diante de sua pessoa, que, por erro ou omissão, deixou de fazer
constar de atos notariais de declaração de vontade que tenha realizado. O
citado jurista salienta, no entanto, que “não se aplica essa regra nas
declarações e disposições de última vontade, pois se trata de direito
personalíssimo e de difícil comprovação”.
E
finaliza:
Nesta
qualidade de ata, poderá o notário proceder a retificações de erros
materiais cometidos na lavratura de ato jurídico, por exemplo, retificar os números
de um RG ou CGC/MF erroneamente anotados ou declarar o negócio jurídico
realizado, desde que não perfeitamente relatado anteriormente[37].
5 ATA NOTARIAL COMO PROVA NO PROCESSO CIVIL
Antes de
se abordar, especificamente, a ata notarial enquanto prova no processo civil,
importa identificar as funções da ata notarial, ou seja, sua utilidade e
finalidade.
Como já
apresentado, a Lei nº 8.935, de 18 de novembro de 1994, criou um novo ato
notarial, chamado “ata notarial”,
de competência exclusiva dos notários. No entanto, da análise do texto da
referida lei, percebe-se que o legislador não definiu e nem conceituou o que
vem a ser “ata notarial”,
como também não estatuiu para que finalidade ela se presta.
Utilizando-se
do entendimento RIBEIRO[38],
passa-se a expressar o entendimento doutrinário sobre o que chamou de “novel
instrumento”. O referido autor iniciou sua exposição particularizando a
expressão “ata notarial”, apresentando o significado da palavra “ata”.
No sentido laico, “ata”, do latim acta, que significa “coisas feitas”, é o registro escrito no qual se relata o que se passou numa sessão, convenção, congresso, como, por exemplo, ata da reunião dos condôminos ou da convenção dos advogados, dentre muitos outros[39]. Também pode ser definida como sendo “o registro de uma obrigação contraída por alguém, como, por exemplo, a ata da venda do apartamento”[40].
No sentido jurídico,
“ata” é definida como sendo “registro escrito de fatos ou ocorrências e
resoluções tomadas em sessão de diretoria, conselho consultivo e
deliberativo” [41]. Significa dizer que esta expressão, tanto no
sentido jurídico como no laico, serve para designar, em sentido genérico, o
ato pelo qual se registra por escrito tudo o que ocorre em certas reuniões ou
solenidades, promovidas por associações, por sociedade ou entidade qualquer[42].
Portanto,
pode ser compreendida como “o registro exato e metódico das deliberações
tomadas em uma reunião de sociedade, associação ou corporação de qualquer
espécie, que vai assinada ou autenticada pelas pessoas que presidiram à sessão
(reunião)”. Representa, assim, “os assentos, que se determinam após a sessão
de qualquer entidade, relativos às resoluções tomadas, para que se conserve
escrito sob registro” [43].
Já a
palavra “notarial” deriva de nota, que significa, neste sentido,
“registro”, ou notar, que quer dizer “lançar no livro (escritura) de
notas pelo notário (tabelião)”[44].
Portanto, o adjetivo “notarial”
vem a significar que a ata se fez
por notário e sob o seu testemunho, sendo que a função da “ata
notarial” é a de “tão-somente registrar, documentar e comprovar
atos e fatos já existentes”[45].
Na
tentativa de buscar a efetiva finalidade da ata notarial, conforme imaginada no
direito brasileiro, CENEVIVA[46],
interpreta que:
Ata,
na linguagem comum, é o relatório de fatos ocorridos e de resoluções
adotadas numa reunião formal ou informal, para satisfação de objetivos de
direito público ou privado. O termo surge qualificado pelo adjetivo “notarial”,
no inciso III do artigo 7º. Trata-se do mesmo relato genérico porém,
garantido pela fidelidade na narrativa dos eventos. A neutralidade e a rigorosa
vinculação à verdade são essenciais, convindo que o delegado reproduza
fielmente as declarações pronunciadas pelas partes, embora possa orientá-las,
na área de sua competência estrita, a respeito do que pretendem fazer constar
da ata.
Portanto,
conforme enfatiza RIBEIRO[47]
“a ata notarial não é
ato de iniciativa do notário”, eis que este, “para praticá-lo isto é,
lavrar a ata notarial, necessita
de ser provocado por algum interessado em deixar consignado ou registrado em
livros do Serviço Notarial algum ato ou fato ocorrido”[48].
Neste
sentido, a acepção de ata notarial recebe significativa ampliação, eis que,
mais do que registrar o relato de atos ou fatos ocorridos, ou de resoluções
adotadas em uma reunião ou assembléia, pode ser utilizada para documentar o
estado e as condições de bens que vão ser entregues a seus novos proprietários,
por terceiras pessoas, a fim de prevenir responsabilidades, dentre outras situações
que irão surgindo, conforme a familiarização e conhecimento do tema for
abrindo horizontes.
Por
outro lado, a ata notarial não pode ser utilizada como instrumento para
retificação ou correção de erros em escrituras públicas ou em qualquer
outro ato praticado no Serviço Notarial e nem para aditamento ou mesmo para
ratificação de tais atos, em caso de omissão de algum elemento ou requisito
que deles devia constar. Esse é o entendimento de RIBEIRO[49],
sob o argumento de que para essas hipóteses, “há necessidade de ser lavrada
escritura de reti-ratificação ou de aditamento, conforme o caso, colhendo-se
as assinaturas dos interessados” (sic).
Conforme
o citado jurista:
Se
um notário lavrar, eventualmente, uma ata notarial, cuja finalidade seja
reti-ratificar ou aditar ato lavrado anteriormente, tem-se então aí não uma
“ata”, mas sim uma escritura de retificação, ou de ratificação, ou de
aditamento, conforme seja a hipótese. Isso porque, na interpretação dos atos
jurídicos, não se leva em conta o rótulo ou o título que lhe é dado, mas o
seu conteúdo, a sua essência[50].
E
conclui:
Afora
os casos de relato de atos ou fatos ocorridos e de resoluções ou deliberações
adotadas em uma reunião formal ou informal, ou de registro de condições ou
estado de conservação de bens, quer para servir de prova, quer para prevenir
responsabilidades, não vemos qualquer outra função a que se possa valer do
novel instrumento ata notarial[51].
Até
este momento, apresentaram-se origens, a normatização, as características e
se buscou identificar a função, a aplicabilidade e a importância da ata
notarial para a sociedade brasileira. A partir de agora se passa a analisar a
ata notarial enquanto meio de prova no processo civil.
RODRIGUES[52],
ao tratar da ata notarial como meio de prova, e utilizando-se de embasamento teórico
de diversos autores estrangeiros, escreve que:
O
poder certificante do notário é uma faculdade que a lei lhe dá para, com sua
intervenção, evitar o desaparecimento de um fato antes que as partes o possam
utilizar em proveito de suas expectativas. A fé pública é, em todo o momento
do negócio jurídico, o caminho mais efetivo para a evidência. Tudo se reduz
à intervenção notarial que, com sua presença ou sua atuação, soleniza,
formaliza e dá eficácia jurídica ao que ele manifesta ou exterioriza no
instrumento público, seja este escriturado ou não. Isto se relaciona, também,
com o poder certificante do notário, o que permite às partes em forma voluntária,
escolher a forma e o modo de resolver seus negócios; neste caso, como afirma
Gatán, a função notarial pode considerar-se como jurisdicional. O notário,
dentro de sua ampla gama de faculdades, logrará, com sua intervenção,
estabelecer a prova pré-constituída, que há de servir de pauta legal, no
momento em que seja necessário solicitá-la
Conforme
o direito espanhol e peruano, ainda na constatação de RODRIGUES[53],
quando o notário "constata, verifica, escuta, vê, observa", salva
futuros vazios e fotografa a verdade, constituindo, sua afirmação traduzida em
um papel, um documento público perfeito. E conclui:
Quero
dar a maior importância às atas notariais, como instrumento público em sua
mais alta validez; têm mais simplicidade que o instrumento formal, vale como a
escritura propriamente dita, e há de servir em juízo, na oportunidade de se
estabelecerem os direitos, de se abreviarem procedimentos de peritagem, e de
outros trâmites relacionados com as pretensões de quem tem o justo direito,
muitas vezes, aliás, turvado no seu aspecto de verdade. As atas notariais,
conforme o direito espanhol, têm por objeto a comprovação e fixação de
fatos notórios, sobre os quais poderão ser fundados e declarados direitos e
qualidades com transcendência jurídica.
Inegável,
ante todo o exposto, a utilidade da ata notarial como meio de prova no processo
civil. A ata notarial, por sua natureza, se reveste de especial importância
para obter-se uma produção antecipada de provas de boa qualidade e
credibilidade, com presteza, sem ficar o interessado na dependência de
movimentar o aparato judiciário que deve ser preservado para a solução de
contendas de maior complexidade e não solucionáveis pelos mecanismos mais
simples[54].
É
evidente que o Código de Processo Civil oferece mecanismos para a demonstrar a
verdade ou falsidade de fato conhecido ou controvertido ou para convencer da
certeza de ato ou fato jurídico. Permite, inclusive, a produção antecipada de
provas, que se dá no bojo de circunstâncias especiais, com o intuito de se
preservar a veracidade de afirmação ou fato. Como exemplo ilustrativo, cita-se
o livro III do referido código, que trata do “processo cautelar”, cuja seção
VI, do seu capítulo II, trata de um conjunto de medidas preconizadas sob a epígrafe
de “produção antecipada de provas” e que se reduzem a três, enumeradas no
artigo 846, a saber: interrogatório da parte, inquirição de testemunhas e
exame pericial[55].
Portanto:
O
interrogatório e a inquirição antes da propositura de uma demanda ou na fase
inicial desta são providências previstas para as hipóteses de a parte ou a
testemunha ter de ausentar-se do lugar, ou ainda de haver justo receio, por
motivo de idade ou moléstia grave, de não mais existir ou estar
impossibilitada de depor ao tempo em que a prova possa vir a ser produzida[56].
Constituem
cautelas pertinentes, razoáveis e louváveis, disso não restam dúvidas. No
entanto, como é conhecido, o sistema jurídico brasileiro é extremamente forma
e o emperramento do serviço judiciário, muitas vezes não atingem o resultado
que se propugna alcançar pela falta de agilidade necessária.
Ante
esta inegável realidade, emerge a instituição da ata notarial, que pode e
deve ser difundida, como um instrumento a acrescer esse rol de cautelas, e que
é capaz, pela sua função já identificada, auxiliar na concretização rápida
e efetiva da tão esperada justiça.
Trata-se
aqui, especificamente, da ata notarial de declaração, seja de interesse próprio,
seja testemunhal, como contribuição efetiva do tabelionato de notas a fim de
agilitar e preservar a formação da prova no processo judiciário, desde que
amparada nas premissas de urgência por causa de viagem, de idade avançada ou
de moléstia grave, verificadas ao prudente arbítrio do tabelião.
Outro
tipo de ata notarial que também pode ser utilizada é a ata notarial de presença,
quando a produção antecipada de prova pericial, ou seja, a tradicionalmente
conhecida vistoria ad perpetuam rei
memoriam, prescindindo da presença física do juiz em diligência, pode e
deve ser difundida e praticada sob a modalidade de ata notarial de presença,
mediante a qual o tabelião de notas, deslocando-se dentro da circunscrição de
sua competência territorial, verifica in
locu a existência de um fato e o relata minuciosamente, com o auxílio de
quem esteja presente e queira colaborar; mais ainda, se for o caso, com a
participação de perito ou peritos que lhe esclareçam as questões técnicas
e, se convier, emitam laudo ou laudos a fazer parte integrante da ata[57].
Portanto, é inegável, ante todo o exposto, a importância da ata notarial como
meio de prova no processo civil.
Todavia,
mais do que sua imprescindível utilização do instrumento público notarial
como meio de prova pré-constituída, o que é um dos aspectos importantes de
sua natureza, e que por si só já justificaria a escolha deste tema para debate
e divulgação, o que se defende é que a relevância da ata notarial, na
realidade atual, se sobrepõe à função meramente probatória, que pressupõe
litígio potencial a dar-lhe ou a lhe negar respaldo. Neste particular, SILVA[58]
consegue extrair a essência do instituto em tela ao proclamar que:
O
instrumento público notarial existe e é eficaz por si mesmo, faz realizar o
direito na normalidade da vida social e, acima de tudo, sua qualificação e
respeitabilidade, pela certeza e segurança a ele inerentes, são fatores de
prevenção de litígio. Então, mais que meio de prova pré-constituída, o
instrumento público notarial vale pelo que é, desde o momento em que se
concretiza, e já nasce com o destino de harmonizar as pessoas em suas relações
jurídicas no meio social.
Percebe-se,
desta forma, que não apenas a sociedade brasileira, mas inclusive os
profissionais ligados, de alguma forma, à esfera jurídica, muito já perdeu e
ainda tem a deixar de ganhar pela absoluta falta de conhecimento sobre os
instrumentos que o sistema jurídico oferece em benefício de toda a
coletividade, e que, se aplicados como podem e deveriam ser, contribuiriam não
somente com o resgate da credibilidade do sistema judiciário como um todo, mas
na própria pacificação e segurança social.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
De todo o estudo, que foi de extremada importância para o
conhecimento desse valoroso instrumento público, e principalmente pela divulgação
e disseminação de conhecimentos, muito embora se tenha consciência de que
nada foi acrescido ou inovado, mas apenas ressaltado, reconhece-se que a ata
notarial é uma prática recente na história do notariado brasileiro e por essa
razão basilar ainda pouco utilizado.
Constatou-se que foi a Lei nº 8.935 de 1994 foi a responsável
pela definição a lavratura da atas notariais como ato privativo do tabelionato
de notas. Até então este ainda era um instrumento pouco difundido, mesmo
dentro do notariado.
Considera-se, portanto, extremamente positiva e necessária a
valorização e o reconhecimento da sociedade brasileira e do poder judiciário
sobre a importância e a relevância da atuação dos tabeliães. Na medida em
que o judiciário encontra-se profundamente emperrado em todos os setores,
incapaz de atender às demandas, emerge a ata notarial como instrumento para que
a sociedade possa atingir o equilíbrio há muito almejado.
Neste contexto, é de suma importância a ação de um delegado do
serviço público, dotado de fé pública, na medida em que ele tem competência
e credibilidade para retratar uma situação de fato que pode ajudar qualquer
cidadão, tanto na área jurisdicional como em outras atividades. Portanto,
deve-se apoiar e valorizar a qualidade deste instrumento público.
Verificou-se que a utilidade da ata
notarial no meio jurídico é abrangente. Na esfera civil, a
ata notarial pode ser utilizada em inúmeras ações relativas à locação de
imóveis. Esse instrumento pode dar fundamento em casos como reclamações de
moradores na desocupação de um imóvel, para atestar o estado de conservação
do mesmo.
No âmbito processual civil, embora o Código de Processo Civil
forneça o instrumento da produção antecipada de provas, é de conhecimento
geral no mundo jurídico que se trata de um recurso não tão ágil como deveria
ser e que demanda alto custo e tempo. Se esta prova for substituída por uma ata
notarial, já que o tabelião tem a competência para descrever com minúcias o
estado em que se encontra o bem, o processo resultaria muito mais dinâmico,
eficaz e menos oneroso.
7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BERNARDINO, Álvaro.
A ata notarial e a locação de imóveis. Disponível em:
<http://www.poolimobiliario.net/materias/102022200087637.php>. Acesso em:
16.Mar.2005.
BRASIL,
Constituição de 1988. Constituição da
República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao.htm>.
Acesso em: 14.Mar.2005.
______,
Legislativo. Lei nº 10.406, de 10 de
janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível em:
<http://www.presidencia.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.htm>. Acesso em:
14.Mar.2005.
______,
Legislativo. Lei nº 5.869, de 11 de
janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil brasileiro. Disponível
em<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5869.htm>. Acesso em:
15.Mar.2005.
______,
Legislativo. Lei nº 8.935, de 18 de
novembro de 1994. Regulamenta o artigo 236 da Constituição Federal,
dispondo sobre serviços notariais e de registro - Lei dos Cartórios. Disponível
em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8935.htm>. Acesso em:
15.Mar.2005.
BUSSIÉRE,
Renaldo Andrade. Ata notarial.
Disponível em: <http://www.cartorio6oficio.com.br/atas.htm>. Acesso em:
15.Mar.2005.
CENEVIVA,
Walter. Lei dos notários e registradores
comentada. São Paulo: Saraiva, 1996.
COZZOLINO,
Andréa; et alli. Mini dicionário LUFT. 3. ED. São Paulo: Ática, 1991.
FERREIRA,
Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário
AURÉLIO. São Paulo: Nova Fronteira. 1999.
FISCHER,
José Flávio Bueno. Ata
notarial e as novas tecnologias. Disponível em:
<http://www.tabelionato.com.br/atanotarial.asp>. Acesso em: 15.Mar.2005.
RIBEIRO,
José. Ata notarial: qual é a sua função? Disponível em:
<http://www.anoregpr.org.br/jornais/15/pag10.htm>. Acesso em: 15.Mar.2005.
RODRIGUES,
Felipe Leonardo. Ata notarial e sua eficácia
na produção de provas com fé pública do tabelião no ambiente físico e
eletrônico. In: IRIB – Boletim
Eletrônico nº 1158 - Ano IV - Editores: Fátima Rodrigo e Sérgio Jacomino. São
Paulo, 3 de junho de 2004.
SILVA,
De Plácido e. Vocabulário jurídico.
Atualizadores Nagib Slaibi Filho e Geraldo Magela Alves. 16. ed. Rio de Janeiro:
Forense, 1999.
SILVA,
João Teodoro. Ata notarial. Disponível
em: <http://www.6oficiobh.not.br/doc/10.doc>. Acesso em: 15.Mar.2005.
TESHEINER, José Maria. Ata notarial como meio de prova: uma revolução no processo civil. Disponível
em: <http://www.espacovital.com.br/asmaisnovas17082004f.htm>. Acesso em:
16.Mar.2005.
THEODORO
JÚNIOR, Humberto. Curso de direito
processual civil. 13. ed., v. I. Rio de Janeiro: Forense, 1994. p. 440.
VOLPI
NETO, Ângelo. Ata notarial de documentos
eletrônicos. Disponível em:
<http://www.internetlegal.com.br/artigos/>. Acesso em: 16.Mar.2005.
______.
Ata notarial: essa nobre desconhecida. Disponível em:
<http://www.internetlegal.com.br/artigos/>. Acesso em: 16.Mar.2005.
[1] (Bacharel em Direito pela Universidade Paranaense – Unipar.).
[2]
BRASIL, Legislativo. Lei nº 8.935, de 18 de novembro de 1994. Regulamenta o artigo 236
da Constituição Federal, dispondo sobre serviços notariais e de registro
- Lei dos Cartórios. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L8935.htm>. Acesso em:
15.Mar.2005.
[3]
VOLPI NETO, Ângelo. Ata notarial de documentos eletrônicos. Disponível em:
<http://www.internetlegal.com.br/artigos/>. Acesso em: 16.Mar.2005.
[4]
Entenda-se como “notário” o oficial público de notas, tabelião,
incumbido de elaboração de escrituras públicas, como contratos e outros
atos jurídicos previstos
[5]
BERNARDINO, Álvaro. A ata
notarial e a locação de imóveis. Disponível em:
<http://www.poolimobiliario.net/materias/102022200087637.php>. Acesso
em: 16.Mar.2005.
[6]
FISCHER, José
Flávio Bueno. Ata notarial e as novas tecnologias. Disponível em:
<http://www.tabelionato.com.br/atanotarial.asp>. Acesso em:
15.Mar.2005.
[7]
Idem, ibidem.
[8]
VOLPI NETO, Ângelo. Ata notarial de documentos eletrônicos... Op. cit.
[9]
João, capítulo I e Gênesis, capítulo XIII, versículos
[10]
SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. Atualizadores Nagib Slaibi Filho e Geraldo
Magela Alves. 16. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 491.
[11]
CARNELUTTI. La prueba civil. Apud
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso
de direito processual civil. 13. ed., v. I. Rio de Janeiro: Forense,
1994. p. 440.
[12]
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Op. cit., pp. 440.
[13]
Idem, ibidem, pp. 440-1.
[14]
BRASIL, Legislativo. Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de
Processo Civil brasileiro. Disponível
em<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5869.htm>. Acesso em:
15.Mar.2005.
[15]
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Op. cit., pp. 442.
[16]
RODRIGUES, Felipe Leonardo. Op. cit.
[17] BRASIL, Constituição de 1988. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao.htm>. Acesso em: 14.Mar.2005.
[18]
BRASIL, Legislativo. Lei nº 8.935... Op. cit.
[19]
BRASIL, Legislativo. Lei nº 5.869... Op. cit.
[20]
BRASIL, Legislativo. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil.
Disponível em:
<http://www.presidencia.gov.br/ccivil_03/LEIS/2002/L10406.htm>. Acesso
em: 14.Mar.2005.
[21]
VOLPI NETO, Ângelo. Ata notarial: essa nobre desconhecida. Disponível em:
<http://www.internetlegal.com.br/artigos/>. Acesso em: 16.Mar.2005.
[22]
VOLPI NETO, Ângelo. Ata notarial: essa nobre desconhecida... Op. cit.
[23]
TESHEINER, José Maria.
Op. cit.
[24]
IPIENS, José Antonio Escartin. El acta notarial de presencia en
el proceso. In: Revista del
Notariado. nº 399, p. 176. Citado pelos seguintes autores, dentre
outros: ARMELA Cristina Noemi. Tratado
de derecho notarial, registral e inmobiliario. p. 957. RODRIGUES,
Felipe Leonardo. Ata notarial e sua eficácia na produção de provas com fé pública do
tabelião no ambiente físico e eletrônico. In: IRIB – Boletim Eletrônico nº 1158 - Ano IV - Editores: Fátima
Rodrigo e Sérgio Jacomino. São Paulo, 3 de junho de 2004. TESHEINER, José Maria. Ata
notarial como meio de prova: uma
revolução no processo civil. Disponível em:
<http://www.espacovital.com.br/asmaisnovas17082004f.htm>. Acesso em:
16.Mar.2005.
[25]
IPIENS, José Antonio Escartin. El acta notarial de presencia en
el proceso. In: Revista del
Notariado. nº 399, p. 176. TESHEINER,
José Maria. Op. cit.
[26]
RODRIGUES, Felipe Lonardo. Op. cit.
[27]
TESHEINER, José Maria.
Op. cit.
[28]
BARDALLO, Julio R. Revista del
notariado, nº 708. Buenos Aires, 1969. Apud
VOLPI NETO, Ângelo. Ata notarial: essa nobre desconhecida... Op. cit.
[29]
MARTINEZ SEGOVIA, Francisco. Las actas notariales em la
legislacion”, ante-projeto da Lei Notarial Argentina. Apud
VOLPI NETO, Ângelo. Ata notarial:
essa nobre desconhecida... Op. cit.
[30]
VOLPI NETO, Ângelo. Ata notarial: essa nobre desconhecida... Op. cit.
[31]
Idem, ibidem.
[32]
BUSSIÉRE, Renaldo Andrade. Ata notarial.
Disponível em: <http://www.cartorio6oficio.com.br/atas.htm>. Acesso
em: 15.Mar.2005.
[33]
GARCIA, Julia Siri. Cuestiones de técnica notarial em
materia de actas. Montevideo, publicaciones
jurídicas, associacion de Escribanos del Uruguay, 1995. Apud
VOLPI NETO, Ângelo. Ata notarial:
essa nobre desconhecida... Op. cit.
[34]
BUSSIÉRE, Renaldo Andrade. Op. cit.
[35]
Idem, ibidem.
[36]
BUSSIÉRE, Renaldo Andrade. Op. cit.
[37]
Idem, ibidem.
[38]
RIBEIRO, José. Ata notarial:
qual é a sua função? Disponível em:
<http://www.anoregpr.org.br/jornais/15/pag10.htm>. Acesso em:
15.Mar.2005.
[39]
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo
Dicionário AURÉLIO. São Paulo: Nova Fronteira. p. 152.
[40]
COZZOLINO, Andréa; et alli. Mini dicionário
LUFT. 3. ED. São Paulo: Ática, 1991. p. 60.
[41]
GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri. Op.
cit. p. 98.
[42]
SILVA, De Plácido e. Op. cit., p. 90.
[43]
RIBEIRO, José. Op. cit.
[44]
COZZOLINO, Andréa; et alli. Op, cit., pp.
444-5.
[45]
RIBEIRO, José. Op. cit.
[46]
CENEVIVA, Walter. Lei dos notários e registradores comentada. São Paulo: Saraiva,
1996. p. 49
[47]
RIBEIRO, José. Op. cit.
[48]
“Por exemplo: é possível solicitar-se a lavratura de uma ata notarial
para documentar as condições de integridade de lataria e de pintura de um
automóvel adquirido, de alto custo, e que vai ser entregue em outra
localidade, por terceira pessoa, para comprovar o seu real estado de
conservação no momento em que o automóvel é entregue ao transportador.
Ou ainda: registrar as condições e aspectos físicos de um animal caro, de
raça, vendido e que vai ser entregue, por transportador, ao adquirente, em
localidade distante” (RIBEIRO, José. Op.
cit.).
[49]
RIBEIRO, José. Op. cit.
[50]
Idem, ibidem.
[51]
Ibid.
[52]
RODRIGUES, Felipe Leonardo. Op. cit.
[53]
Idem, ibidem.
[54]
SILVA, João Teodoro. Ata notarial. Disponível em:
<http://www.6oficiobh.not.br/doc/10.doc>. Acesso em: 15.Mar.2005.
[55]
BRASIL, Legislativo. Lei nº 5.869...
Op. cit.
[56]
SILVA, João Teodoro. Op. cit.
[57]
SILVA, João Teodoro. Op. cit.
[58]
Idem, ibidem.