Autor: Neri Tadeu Camara Souza
Cabe, pois, uma abordagem de quais conceitos jurídicos, e comportamentais que podem até vir a ter implicações legais, são passíveis de virem a ser aplicados na avaliação pelos tribunais brasileiros, em termos de ressarcimento dos danos que porventura venham a sofrer os pacientes como decorrência dos procedimentos radiológicos aos quais venham a ser submetidos.
Os métodos utilizados em imaginologia podem ser agrupados, conforme se lê no site www.abcdi.com.br (ABCDI - Associação Brasileira das Clínicas de Diagnóstico por Imagem), nos seguintes tipos de procedimentos: “radiodiagnóstico convencional e especializado, radioterapia, medicina nuclear, ultra-sonografia, tomografia computadorizada, ressonância magnética, radiologia vascular e intervencionista, radiologia pediátrica, mamografia, densitometria óssea, neurorradiologia, doppler esplâncnico e periférico e outros que venham a ser definidos pelo Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem – CBR” (capturado na Internet: http://www.abcdi.com.br/regulamento.php, em 05.02.2008). Cabe transcrever o que ensina Milton Mizsputen, no site http://webrun.uol.com.br: “Antigamente conhecida apenas por Radiologia, hoje a especialidade é chamada de Diagnóstico por Imagem, porque nas últimas décadas surgiram métodos de exames bastante diferentes da radiologia convencional. Foram inventados os aparelhos/métodos de ultra-sonografia (US), tomografia computadorizada (TC) e ressonância magnética (RM). E todos esses métodos fazem parte do aprendizado, especialização e trabalho do radiologista contemporâneo.” (capturado na Internet: http://webrun.uol.com.br/home/index.php?destinocomum=noticia_mostra&id_noticias=6999&id_eventos= (RX), em 05.02.2008).
Pode-se entender quando ocorrem os erros em imaginologia, radiologia, no escólio de Sandro Fenelon: “Quaisquer métodos de imagem podem estar envolvidos, mas os mais prevalentes são a mamografia e a radiografia de tórax. As condições mais freqüentemente envolvidas em processos judiciais são fraturas, câncer de mama, pulmão e cólon, e complicações de procedimentos.” (ASPECTOS ÉTICO-LEGAIS EM IMAGINOLOGIA. In: Radiologia Brasileira, São Paulo, vol. 36, nº 1, III-IV, Jan-Fev, 2003, capturado no site www.scielo.br da Internet: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-39842003000100001, em 03.02.2008)
No site da FENAESS – Federação Nacional dos Estabelecimentos de Serviços de Saúde é lecionado que: “A medicina não é uma ciência exata e acidentes podem acontecer, principalmente quando se trata de cirurgias e processos invasivos, porém algumas especialidades trazem consigo o apelo por um resultado positivo e quando não ocorre a Justiça é acionada imediatamente. Este é o caso da cirurgia plástica, anestesiologia e radiologia.” (capturado na Internet: http://www.fenaess.org.br/clipping/clip_16032006.htm, em 03.02.2008).
O site da FEBRASGO – Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia, no “Manual de Orientação – Defesa Profissional”, 2002 (em sua página 31), preleciona: “Porém, importante que se diga que existe a figura da culpa presumida. Trata-se de questão doutrinária bastante utilizada pelo judiciário nos processos de responsabilidade civil médica. Consiste no fato de se considerar, em certos casos, principalmente nas especialidades às quais se imputa obrigação de resultado - como é o caso da cirurgia plástica, radiologia, anestesiologia e até mesmo a odontologia - em que o ônus da prova passa à pessoa do médico. Em última análise, há o entendimento de que nas especialidades nas quais se considere haver obrigação de resultado, presume-se a culpa do profissional médico, cabendo a este provar a sua inexistência.” (capturado na Internet: http://www.gosites.com.br/sggo/pdf.asp?path=302553jh%7Cggeyny7zmls2rjl4&arq=rcq%7Chp678682vml, em 03.02.2008).
Mas, mesmo que presumida, a culpa deve estar presente na conduta do médico radiologista que causar dano, prejuízo, a um paciente, para que ocorra a sua responsabilização, já que ocorre ser esta, culpa, um dos quatro pressupostos da responsabilidade civil, dita subjetiva (também chamada Teoria da Culpa). Isto posto, nos termos da Teoria Subjetiva da Responsabilidade (Teoria da Culpa) sobre a qual nos ensina Victor Emanuel Christofari: “Para a teoria subjetiva, a culpa é o elemento essencial para a caracterização do ilícito; sem culpa não há ilícito, não há quem responsabilizar.” (INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO DIREITO. 4.ed., Canoas - RS: Editora da ULBRA – Universidade Luterana do Brasil, 1998, p.284). Os quatro pressupostos - elementos - da responsabilidade subjetiva, gize-se, devem estar presentes, e provada a sua existência nos autos do processo, para que possa vir a ser responsabilizado o profissional responsável por dano a um paciente. Estes quatro pressupostos da responsabilidade subjetiva são: 1. ATO LESIVO - é o procedimento, comissivo ou omissivo, prejudicial, lesivo, ao paciente, 2. DANO - é a lesão, o prejuízo, sofrido pelo paciente, 3. NEXO CAUSAL - é a relação de causalidade, relação de causa e efeito, entre o ato lesivo e o dano sofrido pelo paciente, e 4. CULPA – geralmente, em casos de eventual erro médico, é um agir, um atuar, do causador do dano no paciente tendo presente na sua conduta a negligência,a imprudência ou a imperícia.
Cabe aqui destacar a outra teoria da responsabilidade encontrada em nosso ordenamento jurídico, a denominada responsabilidade objetiva (Teoria do Risco), e para isso nos valemos do ensinamento de Arnaldo Rizzardo: “Quanto à responsabilidade objetiva, unicamente um dos pressupostos acima retira-se, que é o da culpa, não apenas pela dificuldade de ser conseguida em certas situações especiais, mas porque a atividade ou o trabalho importa em indenizar se desencadear algum dano. (...) Os demais elementos – ação ou omissão, relação de causalidade e dano – devem estar presentes.” (RESPONSABILIDADE CIVIL – Lei nº10.406, de 10.01.2002. 2.ed., Rio de Janeiro: Forense, 2006, p.37).
Em casos de erro médico a culpa costuma estar presente, sem se excluir a possibilidade do dolo - comportamento doloso, como culpa em sentido estrito - comportamento culposo. Ambos, comportamento doloso e culposo (em sentido estrito), definidos no artigo 18, do Código Penal brasileiro: “Diz-se o crime:
I - doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo“;
Crime culposo
II - culposo, quando o agente deu causa ao resultado por negligência, imprudência ou imperícia”.
A necessidade da presença de, pelo menos, uma destas modalidades de culpa (nunca se excluindo a possibilidade da presença da culpa sob a forma de dolo), negligência, imprudência ou imperícia – estas três mesmo que sob a forma presumida - no agir do causador de um dano a outrem vem expressa no texto dos artigos 186 (“Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.“) e 951 (“O disposto nos arts. 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício de atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho.“), de nosso Código Civil. Esta é a regra geral em nosso ordenamento jurídico. No microssistema legal do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº8.048/1990), que como lei especial via de regra se sobrepõe ao nosso Código Civil, o que vige é a responsabilidade objetiva, exceção feita aos profissionais liberais, em nosso caso os médicos. Nestes deve ser perquirida pelos tribunais a presença da culpa no seu atuar - conduta - profissional.
Sobre as formas de culpa leciona Sérgio Cavalieri Filho: “Chegamos, desta forma, à noção de culpa, que tem, aqui, sentido amplo (lato sensu), abrangente de toda espécie de comportamento contrário ao Direito, seja intencional, como no caso do dolo, ou não, como na culpa.” (PROGRAMA DE RESPONSABILIDADE CIVIL. 7.ed., São Paulo: Editora Atlas, 2007, p.29), Complemente-se o entendimento do que seja culpa em sentido estrito (comportamento culposo) com o ensinamento de Hans Kelsen: “O momento a que chamamos “culpa” é uma parte integrante específica do ato ilícito: consiste numa determinada relação positiva entre o comportamento (atitude) íntimo, anímico, do delinqüente e o evento produzido ou não impedido através da sua conduta externa; consiste na sua previsão ou na sua intenção, àquele evento dirigida.” (TEORIA PURA DO DIREITO. 6.ed., São Paulo: Editora Martins Fontes, 1999, p.134). O que Hans Kelsen ensina sobre negligência complementa o entendimento da culpa em sentido estrito: “Sob o conceito de responsabilidade pela culpa costuma também abranger-se a hipótese da chamada negligência. Esta surge quando a produção ou o não-impedimento de um evento (resultado), indesejável segundo a ordem jurídica, é proibido, mesmo que não tenha sido efetivamente previsto ou intencionalmente visado pelo indivíduo através de cuja conduta ele foi produzido ou não foi evitado, já que normalmente teria podido e devido prevê-lo e, portanto, teria podido e devido não o provocar ou evitá-lo.” (op. cit.). Sobre as modalidades de culpa em sentido estrito preleciona Sérgio Cavalieri Filho: “A imprudência é falta de cautela ou cuidado por conduta comissiva, positiva, por ação. (...) Negligência é a mesma falta de cuidado por conduta omissiva. (...) a imperícia, por sua vez, decorre da falta de habilidade no exercício da atividade técnica (...) O erro médico grosseiro também exemplifica a imperícia.” (op. cit., p.37). Conclui Arnaldo Rizzardo: “A ação humana eivada de máculas, isto é, de culpa no sentido estrito ou lato, denomina-se ‘ato ilícito’, porque afronta a ordem jurídica, ou desrespeita o que está implantado pela lei. E a responsabilidade consiste na obrigação de sanar ou recompor, ou ressarcir os males e prejuízos que decorrem de mencionadas ações.” (op.cit, p.28).
A relação que se estabelece, entre o médico e o paciente, em um atendimento médico, é contratual. Isto já é aceito maciçamente pela doutrina nacional e internacional, e no que se refere aos atendimentos em radiologia não ocorre diferente. Cabe aqui mencionar, que esta relação contratual entre o paciente e o executor de um serviço de radiologia que seja realizado neste paciente é submetida ao que determina o Código de Defesa do Consumidor (Lei nº8.048/1990), já que o prestador de um serviço de radiologia, pessoa física ou jurídica, apresenta-se como fornecedor de serviços de exames médicos, assim caracterizando-se uma relação de consumo. O Código de Defesa do Consumidor em seu artigo 3º, no caput, define fornecedor: “Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de (...) prestação de serviços”. O mesmo Código de Defesa do Consumidor exclui como prestação de serviço, dentro de uma relação de consumo regida por este código, aquelas atividades exercidas como decorrência de uma relação de caráter trabalhista. A lei consumerista, em seu artigo 2º, nos apresenta também a definição de consumidor: “Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”. O paciente que é submetido a um exame radiológico é, pois, um consumidor deste serviço, ou seja, nada mais é que o destinatário final, portanto consumidor do serviço utilizado para fazer um diagnóstico, ou até tratamento, do seu eventual problema de saúde.
Os tribunais brasileiros, nos seus julgados, têm decidido no sentido de ser responsabilidade objetiva a das empresas prestadoras de serviços em radiologia, por eventuais danos causados aos pacientes. Mas, mesmo avaliando a prestação de um serviço de radiologia, por pessoa física ou jurídica, nos termos do Código de Defesa do Consumidor, e o caput, do artigo 14 deste código determinar: “O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”, este mesmo artigo em seu parágrafo 4º (“A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa”) expressa que o caput deste artigo não se aplica aos profissionais liberais, no caso os médicos. Nesta direção vai Regina Beatriz Tavares da Silva ao analisar o teor de um acórdão: “Como esclareceu o acórdão, o alegado dano não ficou provado, sendo que não se aplica o Código de Defesa do Consumidor, em responsabilidade civil dos profissionais liberais, por determinação legal expressa do artigo 14, §4º, desse diploma legal.” (Responsabilidade Civil na Odontologia. In: Silva, Regina Beatriz Tavares da, RESPONSABILIDADE CIVIL NA ÁREA DA SAÚDE. Série GVlaw, São Paulo: Saraiva, 2007, p. 212). Assim quando se analisar a responsabilidade civil de uma empresa prestadora de serviços de saúde em radiologia (imaginologia), antes de considerar objetiva a responsabilidade desta há que se averiguar, em juízo, se houve responsabilidade, aqui em termos de responsabilidade subjetiva (presença de culpa na atuação do profissional), do médico - profissional liberal - que porventura tenha causado dano a um paciente. Só, então, comprovado que o dano eventual a um paciente resultou do agir culposo do médico, poderá vir a ser responsabilizado objetivamente, nos tribunais, o serviço de radiologia onde este exerce as suas atividades.
Sublinha Oscar Ivan Prux ser uma obrigação de resultado aquela pela qual se obriga o médico radiologista: “Trazendo para a prática, podem ser listados, exemplificativamente, alguns casos de obrigações de resultado que são contratadas pelos diversos tipos de profissionais liberais. (...) o “radiologista” que contrata a feitura ou análise de uma ultrassonografia ou tomografia computadorizada” (A RESPONSABILIDADE CIVIL DO PROFISSIONAL LIBERAL NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. Belo Horizonte: Editora Del Rey, 1998, p.193).
Sobre obrigações de meios e obrigações de resultado alude Regina Beatriz Tavares da Silva: “Em forma esquemática, é retomado o estudo na natureza das obrigações de meio e de resultado:
- o fim é contratado
- obrigação de agir com lisura, correção empenho, dedicação, técnica e prazo (obligatio ad diligentiam) + resultado (meta optata)
- presume-se a culpa do devedor, que se obrigou a alcançar um certo objetivo
- presume-se a culpa do causador do dano, ao qual cabe provar que não agiu com negligência, imperícia ou imprudência.
- a atividade é contratada
- obrigação de agir com lisura, correção, empenho, dedicação, técnica e prazo (obligatio ad diligentiam)
- cabe ao credor provar a culpa do devedor, que se obrigou a empregar todos os meios e esforços para a consecução de um objetivo e não a alcançá-lo
- vítima deve provar que o causador do dano agiu com negligência, imperícia ou imprudência.
Alguns critérios auxiliam na identificação da natureza da obrigação, se de meio ou de resultado.
Um desses critérios é a verificação da complexidade do procedimento, com a mensuração das respectivas dificuldades. Quanto menores as dificuldades mais fácil será a identificação de uma obrigação de resultado; quanto mais complexo for o procedimento, a identificação se voltará a uma obrigação de meio.” (Responsabilidade Civil de outros profissionais na área da saúde. In: Silva, Regina Beatriz da - Coordenadora - e outros, RESPONSABILIDADE CIVIL NA ÁREA DA SAÚDE. São Paulo: Saraiva, 2007, p.228). Mas, ressalte-se, a complexidade de um determinado caso médico não eximirá, via de regra, o fornecedor de serviço de saúde, aqui um serviço de radiologia, de executar corretamente a sua atividade.
Nos ensina Genival Veloso de França: “Ainda: o médico, nas relações de consumo com seus clientes, não está obrigado a um resultado, pois entre eles existe um contrato de meios e não de fins. Seu compromisso é utilizar todos os meios e esgotar as diligências ordinariamente exercidas. Em suma: usar de prudência e diligenciar normalmente a prestação do serviço. Haverá inadimplência se a atividade for exercida de forma irregular, atípica ou imprudente, e se na prestação do serviço venha ocorrer um acidente de consumo, o médico terá sua responsabilidade civil apurada dentro dos limites da má prática. Discute-se tal conceito, no que se refere aos contratos de meios ou de resultados, na anestesiologia, na cirurgia plástica, na radiologia e na patologia clínica.” (O CÓDIGO DO CONSUMIDOR E O EXERCÍCIO DA MEDICINA. Capturado no site www.erromedico,org na Internet: http://www.erromedico.org/genival_codigo.htm, em 16.02.2008).
Os serviços de radiologia, como regra geral, respondem pelos danos causados por erros dos radiologistas, e outros profissionais, que exercem atividades nestas empresas de saúde. Isto se dá em termos de responsabilidade in eligendo e in vigilando. Sobre a responsabilidade in eligendo nos diz Rui Stoco: “Culpa in eligendo é a oriunda da má escolha do representante, ou preposto.” (RESPONSABILIDADE CIVIL E SUA INTERPRETAÇÃO JURISPRUDENCIAL. 4.ed., 1999, p.67). Sobre a mesma responsabilidade in eligendo, nos ensina Caio Mário da Silva Pereira: ”culpa in eligendo, quando há má escolha de uma pessoa a quem é confiada uma certa tarefa” (RESPONSABILIDADE CIVIL – De acordo com a constituição de 1988. 9.ed., Rio de Janeiro: Forense, 1999, p.72). O mesmo Caio Mário leciona sobre a responsabilidade in vigilando: “culpa in vigilando, quando uma pessoa falta ao dever de zelar, ou comete uma desatenção quando tinha o dever de observar“. (op. cit., p.71). Isto tudo, presente em nosso ordenamento jurídico, nos termos do artigo 932, inciso III, do Código Civil brasileiro, verbis: “São também responsáveis pela reparação civil: (...)
III – o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais ou prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir ou em razão dele”, que dá um caráter de responsabilidade objetiva àquela do empregador ou comitente pelos atos lesivos pelos quais sejam responsabilizados, em juízo, os seus empregados, serviçais ou prepostos. No mesmo sentido, mesmo sem mencionar que a responsabilidade seja objetiva e, sim, presumindo a culpa no agir do patrão ou comitente - preponentes - foi o enunciado da Súmula 341, do STF – Supremo Tribunal Federal: “É presumida a culpa do patrão ou comitente pelo ato culposo do empregado ou preposto”.
Os serviços de radiologia podem, portanto, serem responsabilizados, nos tribunais, pelos prejuízos que venham a sofrer pacientes em decorrência dos procedimentos aos quais são submetidos. Esta responsabilização poderá ocorrer mesmo quando causados danos aos pacientes por seus agentes ou prepostos. No que se refere aos médicos, e aí se incluem não só radiologistas como também médicos de outras especialidades, que não possuam vínculo trabalhista com estas empresas, os serviços de radiologia poderão não conseguir se eximir, em juízo, da responsabilidade de ressarcir os pacientes que sofrerem dano em virtude das características das atividades profissionais destes nestas empresas de saúde. Isto porque, o preposto, médico radiologista ou não, estará sempre executando atividades com um objetivo específico: realizar exames médicos especializados na área da radiologia oferecidos por estas entidades.
E, não só por seus prepostos, responde o serviço de radiologia mas também está sujeito aos preceitos legais da responsabilidade civil pelo fato da coisa, já que os medicamentos que causarem danos aos pacientes podem responsabilizar pelos prejuízos aquele que os utilizou, numa interpretação extensiva, nos termos do artigo 938, do Código Civil brasileiro (“Aquele que habitar prédio, ou parte dele, responde, pelo dano proveniente das coisas que dele caírem ou forem lançadas em lugar indevido.”). E, sublinhe-se, as substâncias utilizadas como contrastes radiológicos, bem como seus similares, são consideradas medicamentos à luz do nosso direito positivo no Decreto federal nº 79.094/77, em seu artigo 3º, inciso II: “Medicamento é o produto farmacêutico, tecnicamente obtido ou elaborado, com finalidade profilática, curativa, paliativa ou para fins de diagnóstico”.
Os serviços de radiologia estão comprometidos com a necessidade de comunicar os pacientes sobre os riscos dos procedimentos, e aqui cabe a elaboração de um adequado “consentimento informado” (informed consent) para ser assinado pelo paciente, ou seu responsável, dentro do dever maior de informação, e educação, do consumidor que cabe aos fornecedores de serviços, inclusive na área da saúde. Como sublinha Antonio Carlos Matteis de Arruda Júnior: “O direito básico à informação (art.6.°, inciso III, da Lei 8.078/1990) decorre do princípio da informação, previsto no art. 4.°, IV, da Lei 8078/1990, sendo que este último implica educação do consumidor e da mesma decorre. Guarda, ainda, relação direta com o princípio da transparência e boa-fé, previstos no art. 4.°, caput, da Lei 8.078/1990
Ocorre que, ao declinar a informação como um direito, a lei consumerista, no art. 6.°, inciso III, especifica de que forma deve ser prestada a informação ao consumidor de forma clara, precisa, esmiuçada e sem omissões, de modo que não restem dúvidas ao consumidor.” (RESPONSABILIDADE CIVIL PELA VENDA DE MEDICAMENTOS SUJEITOS À PRESCRIÇÃO MÉDICA. São Paulo: Editora Método, 2004, p.59).
Diz o artigo 6º, inciso III, do CDC – Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990): “São direitos básicos do consumidor: (...)
III – a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço, bem como sobre os riscos que apresentem”. Diz o artigo 4º, da mesma lei, em seu caput, e no inciso IV: “A Política das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: (...)
IV – educação e informação de fornecedores e consumidores, quanto aos seus direitos e deveres, com vistas à melhoria do mercado de consumo”.
No mesmo sentido vai Luciana Mendes Pereira Roberto: “Cabe ao profissional de saúde a obtenção do consentimento informado de seu paciente, anteriormente a qualquer procedimento. As explicações e esclarecimentos que serão dados ao paciente deverão ser de forma clara e no seu nível de compreensão, devendo o profissional de saúde evitar o uso de expressões técnicas.” (RESPONSABILIDADE CIVIL DO PROFISSIONAL DE SAÚDE & CONSENTIMENTO INFORMADO. Curitiba: Juruá, 1.ed. - ano 2005 -, 2ª tiragem, 2006, p.136). Isto exposto sobre o consentimento informado, em tudo e por tudo, se aplica ao serviços radiológicos prestados aos pacientes. Ninguém é livre - autônomo – para decidir, se não estiver adequadamente informado, instruído, sobre o que vai decidir. Esta autonomia do paciente, um dos três princípios éticos pelos quais deve se pautar a atividade médica, impõe-se ser resguardada em respeito ao princípio geral da dignidade humana. Sobre este principio geral nos transmite Edmilson de Almeida Barros Júnior: “Dignidade deriva do latim dignus – aquele que merece estima e honra, aquele que é importante. A dignidade humana, como fundamento constitucional, é valor-guia dos Direitos fundamentais e de toda ordem constitucional, razão por que é caracterizado como o princípio constitucional de maior hierarquia axiológico-valorativa.” (A RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO – Uma Abordagem Constitucional. São Paulo: Atlas, 2007, p.77).
A par disto, devem os serviços de radiologia zelar pela incolumidade dos pacientes, prestando um serviço que não os exponha a riscos desnecessários. Sempre deve ser considerada a relação risco-benefício dos procedimentos favorável ao paciente, em respeito a outro dos três princípios básicos da ética médica, ou seja, o princípio da beneficência / não-maleficência - o terceiro seria o da justiça. Sobre a beneficência nos lecionam Délio José Kipper e Joaquim Clotet: “O princípio da beneficência tem como regra norteadora da prática médica, odontológica, psicológica e da enfermagem, entre outras, o bem do paciente, o seu bem estar e os seus interesses, de acordo com os critérios do bem fornecidos pela medicina, odontologia, psicologia e enfermagem.” (Princípios da Beneficência e Não-maleficência. In: INICIAÇÃO À BIOÉTICA. Brasília: Conselho Federal de Medicina, 1998, p.44). No que tange ao princípio da justiça encontramos no site www.crmmg.org.br - Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais, o que nos assevera Luís Gonzaga do Amaral: “Princípio da Justiça – é o princípio que garante os benefícios dos serviços de saúde, assegurados na Constituição, que tem efeitos para todos (erga omnes).” (capturado na Internet: http://www.crmmg.org.br/Noticias/Entrevistas/28_12_2006-entrevista_01, em 05.02.2008).
A responsabilidade civil em radiologia, e por extensão em imaginologia, caracteriza-se por ser regida pela responsabilidade subjetiva quando nos reportarmos a danos causados pelos serviços de radiologia propriamente ditos, ou seja, atos médicos, radiológicos ou não, mas há casos em que essa responsabilidade poderá ser avaliada, em termos da responsabilidade objetiva (Teoria do Risco), prescindindo-se pois da presença da culpa no agir do causador do ato lesante. Como acontece no que tange à responsabilidade civil dos hospitais, serviços de saúde em geral, a responsabilidade civil dos serviços de radiologia (imaginologia) quando se referir a atos lesivos que não sejam causados pelos serviços médicos (regidos estes pela responsabilidade subjetiva), poderá ser avaliada pelos tribunais brasileiros sob o prisma da responsabilidade objetiva. Exemplifique-se os serviços que podem ser regidos pela responsabilidade objetiva, caso venham a causar danos aos pacientes, citando os serviços de transporte, recepção, limpeza, dentre outros.
No que tange ao tipo de obrigação contratual pela qual o prestador do serviço radiológico se compromete com o paciente ao executar o seu serviço em saúde, há possibilidade de que esta seja encarada, pelos tribunais brasileiros, como uma obrigação de resultado. Mas não se exclui que procedimentos radiológicos sejam encarados, em juízo, como uma obrigação de meios, mormente aqueles mais complexos. A doutrina até já admite que se mencione a possível presença, em determinadas situações, de uma obrigação mista, ou seja, com algumas características de obrigação de resultado mas apresentando aspectos das obrigações de meios, ou vice-versa. É conveniente, pois, que, sempre, na avaliação judicial de um dano causado a um paciente por um procedimento radiológico, sejam avaliadas as circunstâncias do caso concreto já que em vez de uma obrigação de resultado, podemos estar frente a uma obrigação de meios ou mesmo mista. Estes conceitos aqui expostos se aplicam integralmente, sem sombra de dúvida, aos procedimentos executados em todo o campo de atividade da especialidade médica da RADIOLOGIA E DIAGNÓSTICO POR IMAGEM (“imaginologia”).
NERI TADEU CAMARA SOUZA ADVOGADO E MÉDICO – DIREITO DA SAÚDE
Rua Upamaroti, 649 - Porto Alegre - RS - CEP 90820-140 Telefones: 0xx51.32472530 / 32472572 E-mail: resp@via-rs.netAutor do livro: RESPONSABILIDADE CIVIL E PENAL DO MÉDICO - 2ª edição – 2006 e autor do E-book: “ERRO MÉDICO E DIREITO CIVIL” – 2006 - LZN Editora - Campinas – SP |