1. INTERROGATÓRIO ON LINE E A AMPLA DEFESA

 

Ana Cláudia da S. Bezerra, Advogada *.
 

1.1. Do Interrogatório

O interrogatório é um ato judicial, presidido pelo juiz, em que se indaga ao acusado sobre os fatos imputados contra ele advindo de uma queixa ou denúncia, dando-lhe ciência ao tempo em que oferece oportunidade de defesa.

O Código de Processo Penal considera o interrogatório como meio de prova e a doutrina atribui-lhe também a natureza de meio de defesa. Logo, o interrogatório possui um caráter híbrido, visto que é considerado tanto meio de prova, bem como ato de defesa (autodefesa).

A lei dispõe que o acusado deve ser interrogado no curso do processo, a ausência do interrogatório gera nulidade (art. 564, III, e, do CPP).

Existem os momentos, fixados pelo Código de Processo Penal, para realização do interrogatório, quais sejam: no inquérito policial (art. 6º,V); no auto de prisão em flagrante (art. 304); logo após o recebimento da denúncia ou queixa e antes da defesa prévia (arts. 394 e 395); no plenário do júri (art. 465) e no Tribunal, em processos originais ou no curso da apelação (art.616).

O artigo 196 do Código de Processo Penal dispõe que: "A todo tempo o juiz poderá proceder a novo interrogatório de ofício ou a pedido fundamentado de qualquer das partes." Com fundamento nos princípios da verdade real e do impulso oficial, autoriza a lei que o juiz, mesmo de ofício, determine novo interrogatório do acusado que se possa mostrar relevante, diante de elementos trazidos aos autos durante a instrução, para formação da sua convicção a respeito da verdade dos fatos. As partes também poderão, desde que fundamentada, requerer novo interrogatório.

O interrogatório traz em seu bojo as seguintes características: é ato público, é ato personalíssimo, possui judicialidade e, finalmente, oralidade.

No interrogatório o acusado deve ter a segurança e garantia de que não se praticará extorsão das confissões. Mesmo se o interrogatório for realizado no sistema prisional em que estiver o acusado preso, deve-se assegurar a publicidade do ato, salvo a exceção prevista no artigo 792, § 1º do CPP, isto é, quando da publicidade do ato puder resultar escândalo, incoveniente grave ou perigo de perturbação de ordem, o juiz, ou o Tribunal, câmara, ou turma, poderá, de ofício ou a requerimento da parte ou do Ministério Público, determinar que o ato seja realizado a portas fechadas, limitando o número de pessoas que possam estar presentes. É ato personalíssimo porque só o acusado pode ser interrogado. Possui judicialidade porque cabe ao juiz e só ele interrogar o acusado. Na oralidade, a palavra do acusado, circundada de sua atitude, pode dar ao juiz um elemento insubstituível por uma declaração escrita, despida dos elementos de valor psicológico que acompanham a declaração falada.

Com o advento da lei nº 10.792/03 que altera a lei nº 7.210/84 (Lei de Execução Penal) e o Decreto-Lei nº 3.689/41 (Código de Processo Penal), o interrogatório tomou novos rumos no sistema processual penal. Algumas inovações no interrogatório serão tratadas no item a seguir.

1.2. As inovações trazidas pela lei 10.792/03 para o interrogatório.

Com a lei 10.792/03 o interrogatório adquiriu importantes alterações quanto a sua aplicação.

O Código de Processo Penal, em seu artigo 185 previa que: "O acusado, que for preso, ou comparecer, espontaneamente ou em virtude de intimação, perante a autoridade judiciária, no curso do processo penal, será qualificado e interrogado".

O artigo 185 do Código de Processo Penal, com o advento da lei 10.792/03, passou a ter a seguinte redação:

Art. 185. O acusado que comparecer perante a autoridade judiciária, no curso do processo penal, será qualificado e interrogado na presença de seu defensor, constituído ou nomeado.

§ 1º O interrogatório do acusado preso será feito no estabelecimento prisional em que se encontrar, em sala própria, desde que garantidas a segurança do juiz e auxiliares, a presença do defensor e a publicidade do ato. Inexistindo a segurança, o interrogatório será feito nos termos do Código de Processo Penal.

§2º Antes da realização do interrogatório, o juiz assegurará o direito de entrevista reservada do acusado com seu defensor.

 

Os opositores a aplicação da videoconferência fundamentam seus argumentos no artigo 185, caput, do CPP ao afirmarem que a expressão "comparecer perante a autoridade judiciária", implica estar diante fisicamente da autoridade judiciária, desta forma inviabilizado está o interrogatório on line.

O promotor de Justiça na Bahia, Vlademir Aras, em seu artigo "Teleinterrogatório não elimina nenhuma garantia processual (Tele-hearing does not eliminate any procedural guarantee)", defende que:

"Não concordamos que uma exegese da letra do artigo 185 do CPP, na sua anterior ou na atual redação, tenha o condão de inviabilizar o sistema de teleinterrogatório. Nações democráticas da Europa já adotam o teleinterrogatório, sem qualquer lesão a direitos individuais de imputados, tanto no plano interno quanto no espaço jurídico comum europeu. Além do mais, sabe-se que a interpretação gramatical ou literal não é a melhor para solucionar uma questão tão complexa.

Na sistemática do CPP, "comparecer" nem sempre significa necessariamente ir à presença física do juiz, ou estar no mesmo ambiente que este. Comparece aos autos ou aos atos do processo quem se dá por ciente da intercorrência processual, ainda que por escrito, ou quem se faz presente por meio de procurador, até mesmo com a oferta de alegações escritas, a exemplo da defesa prévia e das alegações finais.

Vide, a propósito, o artigo 570 do CPP, que afasta a nulidade do ato, considerando-a sanada, quando o réu "comparecer" para alegar a falta de citação, intimação ou notificação. Evidentemente, aí não se trata de comparecimento físico diante do juiz, mas sim de comunicação processual, por petição endereçada ao magistrado.

Se assim é, pode-se muito bem ler o "comparecer" do artigo 185 do CPP, referente ao interrogatório, como um comparecimento virtual, mas direto, atual e real, perante o magistrado.

A Lei n. 10.259/2001, que cuida dos Juizados Especiais Federais (cíveis e criminais), permitiu que as turmas de uniformização de jurisprudência reúnam-se por meios eletrônicos. De fato, o artigo 14, §3º, da lei, diz que "A reunião de juízes domiciliados em cidades diversas será feita pela via eletrônica". Que é isto senão uma audiência virtual? Estamos diante de uma sessão de julgamento plenamente válida, embora os juízes participantes não estejam presentes no mesmo recinto, mas sim presentes em recintos diversos, em plena interação.

Alega-se que o artigo 9º, §3º, do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (Pacto de Nova Iorque) e o artigo 7º, §5º, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), prevêem o direito do réu de ser conduzido à presença física do juiz natural. Ora, as referidas normas falam apenas em levar o detido à "presença do juiz", e a presença virtual, ao vivo, atual e simultânea, por meio de videoconferência, confere ao acusado as mesmas garantias que o comparecimento in persona, diante do magistrado.

Portanto, desde que seja garantida a liberdade probatória ao acusado e que sejam assegurados ao réu os direitos de ciência prévia, participação efetiva e ampla defesa (1) (inclusive com o acompanhamento do ato in loco por seu defensor e/ou por um oficial de justiça), não há razão para temer o teleinterrogatório, sob o irreal pretexto de violação a direitos fundamentais do acusado no processo penal. Até porque só há nulidade processual, quando existir prejuízo, e não se pode afirmar que essa é a regra no tocante a teledepoimentos criminais.

Ademais, o comparecimento físico do acusado perante a autoridade judicial não é exigido pelo direito internacional nem pela Constituição brasileira. Com efeito, o artigo 5º, inciso LXII, declara que "A prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada".

Frise-se: a prisão será "comunicada" ao juiz competente. Não impõe a Constituição a apresentação do réu ao juiz, na sede do juízo, mesmo num momento em que a legalidade ou legitimidade da prisão em flagrante ainda não foi verificada pelo Judiciário.

O teleinterrogatório não é um dos males do tempo. Ao contrário, vem eliminar certas burocracias e óbices ao andamento dos feitos criminais. Não esqueçamos que a videoconferência se presta à ouvida de réus presos e de réus soltos, detidos na mesma ou em comarca diversa do distrito da culpa, ou residentes a longas distâncias do foro. Assim, o sistema atende a interesses fundamentais de uns e outros.

A mera mudança do procedimento de apresentação do réu ao juiz, especialmente nos casos em que estejam em julgamento presos perigosos, não elimina nenhuma garantia processual, nem ofende os ideais do Estado de Direito. Basta que se adote um formato de videoconferência que permita aos sujeitos processuais o desempenho, à distância, de todos os atos e funções que seriam possíveis no caso de comparecimento físico".(1)

Com a nova redação dada ao artigo 185, caput, do Código de Processo penal, a presença do defensor tornou-se obrigatória por ocasião do interrogatório e não mais facultativa. A presença obrigatória do defensor no interrogatório veio a fortalecer o ato de defesa do acusado.

O artigo 185, no § 1º do Código de Processo Penal determina o local do interrogatório do réu preso, ou seja, o interrogatório deverá ser realizado no estabelecimento prisional em que se encontrar preso, em sala própria, desde que estejam garantidas a segurança do juiz e auxiliares, a presença do defensor e a publicidade do ato. Contudo, se o interrogatório não poder ser realizado no estabelecimento prisional, deverá ser observado os termos do código de processo penal, ou seja, o interrogatório deverá ser feito na sede do juízo, como ocorre com o interrogatório do réu que se encontra em liberdade.

O § 2º do artigo 185 do Código de Processo Penal, determina que o juiz deve assegurar o direito de entrevista reservada do acusado com seu defensor. Através desta determinação, abre-se ao acusado a possibilidade de receber do defensor esclarecimentos e orientação sobre o processo, bem como de lhe fornecer informações que possam ser úteis ao exercício do seu direito de defesa. Tal providência trouxe para seara processual penal uma afirmação maior ao direito de defesa do acusado.

O artigo 186 do CPP, prevê, in verbis:

Art. 186. Depois de devidamente qualificado e cientificado do inteiro teor da acusação, o acusado será informado pelo juiz, antes de iniciar o interrogatório, do seu direito de permanecer calado e de não responder perguntas que lhe forem formuladas.

Parágrafo único. O silêncio, que não importará em confissão, não poderá ser interpretado em prejuízo da defesa.

O artigo 186 do CPP, com a alteração, adotou o princípio constitucional de que ninguém é obrigado a auto acusar-se, visto que o artigo mencionado determina que o silêncio não importará em confissão, não podendo ser interpretado em prejuízo da defesa.

Determina o artigo 187 do CPP, in verbis:

Art. 187. O interrogatório será constituído de duas partes: sobre a pessoa do acusado e sobre os fatos.

§ 1o Na primeira parte o interrogando será perguntado sobre a residência, meios de vida ou profissão, oportunidades sociais, lugar onde exerce a sua atividade, vida pregressa, notadamente se foi preso ou processado alguma vez e, em caso afirmativo, qual o juízo do processo, se houve suspensão condicional ou condenação, qual a pena imposta, se a cumpriu e outros dados familiares e sociais.

§ 2o Na segunda parte será perguntado sobre:

I - ser verdadeira a acusação que lhe é feita;

II - não sendo verdadeira a acusação, se tem algum motivo particular a que atribuí-la, se conhece a pessoa ou pessoas a quem deva ser imputada a prática do crime, e quais sejam, e se com elas esteve antes da prática da infração ou depois dela;

III - onde estava ao tempo em que foi cometida a infração e se teve notícia desta;

IV - as provas já apuradas;

V - se conhece as vítimas e testemunhas já inquiridas ou por inquirir, e desde quando, e se tem o que alegar contra elas;

VI - se conhece o instrumento com que foi praticada a infração, ou qualquer objeto que com esta se relacione e tenha sido apreendido;

VII - todos os demais fatos e pormenores que conduzam à elucidação dos antecedentes e circunstâncias da infração;

VIII - se tem algo mais a alegar em sua defesa." (NR)

O interrogatório será constituído de duas partes: sobre a pessoa do acusado e sobre os fatos. A primeira parte do interrogatório, as perguntas devem abordar a pessoa do acusado, visando a obtenção de informações pessoais que possam ser úteis aos processos, à discussão da causa e à formação da convicção do juiz, bem como na hipótese de condenação, à individualização da pena. A segunda parte do interrogatório consiste em questionamentos sobre a procedência da acusação, a infração penal e as provas a ela relacionadas, bem como conferir ao acusado a possibilidade de exercer a sua autodefesa.

Importante lembrar que as perguntas elencadas no artigo 187, § 2º não são as únicas que poderão ser feitas pelo juiz. A este é facultado formular ao acusado quaisquer perguntas que julgue necessárias ao esclarecimento da verdade real.

Prevê o artigo 188 do Código de Processo Penal:

Art. 188. Após o interrogatório, o juiz indagará das partes se restou algum fato para ser esclarecido, formulando as perguntas correspondentes se o entender pertinente e relevante.

Antes da modificação trazida pela lei 10.792/03 ao artigo 188 do Código de Processo Penal, o antigo artigo 187 da lei processual vedava qualquer tipo de intervenção ou participação do defensor, do Ministério Público ou querelante no interrogatório. O Superior Tribunal de Justiça, o Supremo Tribunal Federal e a doutrina entendiam que o interrogatório do acusado era um ato pessoal do juiz, logo, não comportava a intervenção nem do Ministério Público, nem do defensor no ato. Hoje, com a alteração, a lei processual determina que as partes (defensor, Ministério Público ou Querelante) podem participar do interrogatório através de perguntas dirigidas ao juiz, e este achado-as pertinentes e relevantes as fará ao acusado.

A lei 10.792/03 não descaracterizou o interrogatório como meio de prova e ato de defesa. Contudo, as referidas modificações objetivaram o aperfeiçoamento do ato em sua dúplice natureza, embora com ênfase na pesrpectiva da defesa, tanto que o próprio artigo 187 do CPP, após enumerar algumas perguntas que devem ser feitas pelo juiz ao acusado, por ocasião do seu interrogatório, enfatiza em seu inciso VIII que o magistrado deverá ainda questionar o acusado se o mesmo ainda tem algo a alegar em sua defesa.

1.3. Interrogatório on line

Interrogatório por videoconferência, tele-interrogatório, interrogatório on line, teleaudiência, interrogatório virtual, videoconferência são expressões utilizados pelos estudiosos do direito e juristas do nosso país ao se reportarem ao interrogatório realizados por meios tecnológicos. Tais expressões serão vistas ao longo do nosso texto, seja em opiniões emanadas pelos doutrinadores, seja pelas jurisprudências já formuladas a respeito do assunto.

O que vem a ser o interrogatório on line?

O interrogatório on line é um ato judicial, presidido pelo juiz, em que se indaga ao acusado sobre os fatos imputados contra ele advindo de uma queixa ou denúncia, dando-lhe ciência ao tempo em que oferece oportunidade de defesa, realizado através de um sistema que funciona com equipamentos e software específicos.

No interrogatório on line, câmeras e recepção de áudio podem ser monitorados por controle remoto, identificando os presentes em cada sala. A conexão é via linha telefônica, com Redes ISDN (Integrated Services Digital Network) que formam uma conexão de 512 Kbps (quilobit por segundo).

No universo da tecnologia de comunicação, o interrogatório on line surge facilitando a comunicação de longa distância utilizando não só o som, mas também as imagens em tempo real.

1.4. As Legislações e o interrogatório on line

Vários países estão inserindo em suas legislações dispositivos que permitem a utilização de sistemas de interrogatórios on line nas intervenções processuais do direito.

Os Estados Unidos da América já adota o interrogatório on line em ações criminais e civis.

Os Tribunais de Cingapura já realizam audiências de oitiva de testemunhas através de interrogatórios on line nos processos civis, com projetos para ser aplicado também na seara criminal.

Na Itália, país onde há um grande combate aos setores das Máfias siciliana, napolitana e calabresa, já se tem a aplicação d interrogatório on line. Giancarlo Sandro Caselli, ex-chefe do pool antimáfia italiano atualmente responsável pelo sistema carcerário da Itália afirma que:

"Os interrogatórios são feitos por circuito interno de televisão. Dessa maneira não há constrangimento para testemunhas e existe mais segurança para os setores que estão investigando os mafiosos." Explicou ainda que: "Para evitar que os mafiosos fossem resgatados ou fizessem ameaças às testemunhas durante os interrogatórios, o Ministério Público passou a utilizar o que eles chamam de videoconferência."(2)

No Brasil não há lei que regulamente o interrogatório on line, muito embora já esteja sendo aplicada, mas existem diversos projetos de lei tramitando no Congresso Nacional, os quais versam sobre o assunto.

Em 1999, o deputado Luiz Antônio Fleury apresentou ao Congresso Nacional o projeto lei n. 1.233, o qual modifica a redação dos artigos 6º, 10, 16, 23, 28, 185, 195, 366 e 414 do Código de Processo Penal, alterando os critérios para realização do inquérito policial e possibilitando a realização de interrogatórios e audiências à distância por meio telemático, através de um canal reservado de comunicação entre o réu e seu defensor ou curador.

 

Projeto de Lei nº 1.233, de 1999
(Do Sr. Luiz Antonio Fleury)

Modifica redação dos arts. 6º, 10, 16, 23, 28, 185, 195, 366 e 414 do Código de Processo Penal.

O Congresso Nacional Decreta:

 

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Art. 2º.: O art. 185, 366 e 414, passam a vigorar acrescidos de parágrafos com as seguintes redações:

 

Art. 185:

Parágrafo único: Se o acusado estiver preso, o interrogatório e audiência poderão ser feitos à distancia, por meio telemático que forneça som e imagem ao vivo, bem como um canal reservado de comunicação entre o réu e seu defensor ou curador.(grifo nosso)

 

Art. 366:

§ 3º: Na hipótese do art. 362, o não-comparecimento do citado ao interrogatório acarretará a decretação de sua revelia, com nomeação de defensor, prosseguindo-se nos demais termos do processo.

Art. 414:

Parágrafo único: Se o réu não for encontrado, não correrá a prescrição, a partir do dia da juntada aos autos do mandado de intimação em que tiver sido certificada essa circunstancia, até a data de sua intimação pessoal."

Art. 3º: Revogam-se as disposições em contrário.

Art. 4º: Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.


JUSTIFICATIVA:

..............................................................................................................

Ao introduzir um parágrafo ao art. 185, procura-se evitar constantes deslocamentos de réus presos ao Fórum, com os perigos e percalços burocráticos que essa remoção muitas vezes representa.

Esta inovação - interrogatório telemático, não será aplicável ao interrogatório no plenário do júri, que possui regras próprias.

A alteração da redação do parágrafo único, do art 195, visa adeqüá-lo ao interrogatório telemático proposto.

Com o acréscimo do parágrafo 4º ao artigo 362 procura-se evitar a suspensão do processo no caso em que o réu, maliciosamente, se oculta para não ser citado pessoalmente, como vem acontecendo com freqüência. Se ele se oculta e ficou sabendo da acusação que pesa conta si, não tem sentido prema-lo pela própria torpeza.

Acrescentando o parágrafo único ao art. 414, pode-se evitar o que acontece muitas vezes, em casos em que o réu permanece oculto ou foragido para não ser intimado pessoalmente da pronúncia, ocasionando o indesejável evento da prescrição.

Sala das Sessões, 17 de junho de 1999.

Deputado Luiz Antonio Fleury

A principal modificação do projeto de lei n. 1.233/99 está relacionada ao artigo 185 do CPP, cujo parágrafo único determinava que "Se o acusado estiver preso, o interrogatório e audiência poderão ser feitos à distância, por meio telemático que forneça som e imagem ao vivo, bem como um canal reservado de comunicação entre o réu e seu defensor ou curador".

O projeto lei n. 2.504/00, do deputado Nelson Proença é bastante sucinto, in verbis:

Projeto de Lei nº 2.504, de 2000
(Do Sr. Nelson Proença), apresentado em 23/02/2000.

Dispõe sobre o interrogatório do acusado à distância com a utilização de meios eletrônicos
(APENSE-SE AO PROJETO DE LEI Nº 1.233, DE 1999.)

O CONGRESSO NACIONAL decreta:

Art. 1º - No Processo Penal poderá o juiz, utilizando-se de meios eletrônicos, proceder à distância ao interrogatório do réu.

Parágrafo único - O interrogatório, neste caso, exigirá que o réu seja assistido por seu advogado, ou à falta, por Defensor Público.

Art. 2º - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.

JUSTIFICATIVA:

A lei determina que o réu seja interrogado no curso do processo penal (Art. 185 do CPP). É imprescindível o interrogatório do acusado, pois, constitui-se em meio de prova e também de defesa no processo penal. Diariamente, uma média de 120 presos são deslocados dos presídios para o Fórum do Distrito Federal. Esses deslocamentos obrigam á Secretaria de Segurança Pública a mobilizar um contingente de cerca de 300 policiais, entre civis e militares, para evitar fugas e garantir a segurança de Juízes, Promotores, advogados e do público em geral. Essa movimentação custa aos cofres do Distrito Federal R$3.5 mil por dia ou algo em torno de R$840 mil por ano.

De outra parte, esses deslocamentos têm ensejado oportunidades de fuga com lesões e até mortes de policiais da escolta, de pessoas do povo presentes no momento da fuga e também de presos.

Inquestionável, pois, o ganho em economia e segurança que o interrogatório à distancia, através do equipamento conhecido como videoconferência ensejará.

A medida possibilitará, ainda, maior celeridade na instrução processual, demonstrando a experiência que, em muitos casos, o interrogatório é adiado e o preso retorna à penitenciária para aguardar nova convocação.

A Justiça do Distrito Federal tem procurado adaptar-se às inovações tecnológicas, para agilizar os serviços judiciários.

O sistema de videoconferência já vem sendo usado com sucesso em atividades como telemedicina, teleeducação, design, engenharia, etc. Conectado a um ou vários pontos em uma sala especialmente preparada o sistema permite que os interlocutores se vejam e se falem como se estivessem no mesmo ambiente, mercê de uma perfeita qualidade de imagem que torna possível observar até os detalhes da expressão da pessoa, controlando-se a aproximação da imagem com o recurso zoom.(Revista Consultor Jurídico, 26 de março de 2002)

Em 12 de julho de 2001, o relator da matéria na Comissão de Constituição e Justiça e Redação da Câmara, deputado Aldir Cabral emitiu parecer pela aprovação, com substitutivo, do projeto Fleury, e pela rejeição do projeto de lei n. 2.504/00, que tramita em apenso. A proposta do ano de 2000 tem artigo único e é menos complexa que a iniciativa n. 1.233/99.

O projeto de lei 2.437/00, apresentado em 24/02/2000 por Germano Rigotto acrescenta parágrafo ao art. 217 do Decreto-lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, para permitir que testemunhas deponham via televisão, em caso de ameaças.

O projeto de lei n. 248, do senador Romeu Tuma, acrescenta aos artigos 185 e 792, ambos do Código de Processo Penal, a realização de interrogatórios à distância nas audiências, através de recursos tecnológicos.

O projeto de lei apresentado pelo Senador Romero Juca, acrescenta no Código de Processo Penal o artigo 217-A versando a realização do interrogatório à distância e a utilização de meios de presença virtual do réu preso nas audiências de averiguações de testemunhas. Este projeto também altera os dispositivos 185 e 792 do CPP.

O projeto de lei n. 704/01, de autoria do deputado Edson Gomes, dispõe sobre a instalação de aparelhos de videoconferência para interrogatórios à distância dos presidiários.

O projeto de lei n. 1.237/03, cujo autor é Luiz Antônio Fleury, altera o Código de Processo Penal, disciplinando o interrogatório de réu preso pelo sistema de videoconferência e possibilita a realização de audiência sem sua presença nas hipóteses previstas.

A Medida Provisória nº 28, de 2002, em seu artigo 6º, autorizou o uso de equipamentos que permitiam o interrogatório e a inquirição de presidiários pela autoridade judiciária, bem como a prática de outros atos processuais, de modo a dispensar o transporte dos presos para fora do local de cumprimento da pena.

MEDIDA PROVISÓRIA No 28, DE 4 DE FEVEREIRO 2002.

Dispõe sobre normas gerais de direito penitenciário e dá outras providências

        O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 62 da Constituição, adota a seguinte Medida Provisória, com força de lei:

.... .........................................................................................................

        Art. 6o  O estabelecimento penitenciário ou prisional poderá ter instalações e equipamentos que permitam o interrogatório e a inquirição de presidiários pela autoridade judiciária, bem como a prática de outros atos processuais, de modo a dispensar o transporte dos presos para fora do local de cumprimento de pena.

..............................................................................................................

Brasília, 4 de fevereiro de 2002; 181o da Independência e 114o da República.

FERNANDO HENRIQUE CARDOSO
Aloysio Nunes Ferreira Filho

 

O Tribunal de Justiça da Paraíba, regularizou o interrogatório on line através da Portaria 2.210/02.

No Estado de São Paulo, a Lei nº 11.819, de 5.1.2005, dispõe sobre a implantação de aparelhos de videoconferência para interrogatório e audiências de presos à distância.

 

1.5. Interrogatório on line no Poder Judiciário

A internet surgiu na década de 60 e tratava-se de uma rede de informática de aplicação militar, e que estava sob o poderio do governo norte-americano.

Com a revolução tecnológica, a informatização ganha campo na área das comunicações afetando todos os setores da sociedade.

O Poder Judiciário começou a utilizar dos meios tecnológicos para agilizar determinados atos de procedimento, desburocratizando vários de seus setores, por exemplo, o da distribuição, do arquivo, entre outros.

Hoje há um debate caloroso no meio jurídico quanto a utilização da tecnologia na realização de interrogatórios.

No Brasil, como vimos, ainda não existe uma lei que regulamente os interrogatórios on line, contudo estes já estão sendo realizados em alguns estados da nação, por exemplo, Brasília, Pernambuco, Paraíba, São Paulo e Rio Grande do Sul.

O primeiro interrogatório on line no sistema processual penal do Brasil ocorreu em 1996, numa vara criminal de São Paulo, com uso do sistema rudimentar, ou seja, a audiência foi realizada por meio de e-mail.

O estado de Brasília foi o pioneiro a realizar o interrogatório on line, sendo seguido por Pernambuco.

 

2. PRÓS E CONTRAS AO INTERROGATÓRIO ON LINE

2.1. Doutrina

Apesar de estar sendo realizado o interrogatório on line em alguns estados do nosso país, há no mundo jurídico duas correntes quanto a questão de sua realização.

Os adeptos ao interrogatório on line apontam vantagens quanto a sua utilização, tais como: a) diminuição dos gastos públicos, não necessitando o deslocamento de escoltas de soldados, carros e motos; b) agilização no interrogatório, diminuindo a demanda da saída dos processos, e sanando o problema da falta de transporte para os presos serem conduzidos ao Fórum, fato que acontece com freqüência; c) o problema da superlotação carcerária tende a ser minimizada na medida em que os processos serão agilizados; d) diminuição de fugas de presos, devido ao não deslocamento do preso ao Fórum, conseqüentemente haverá uma segurança maior a população; e) integridade de informação no interrogatório na medida em que a videoconferência é gravada em disquete ou CD-ROM e arquivada, sendo acompanhada por um assessor jurídico da penitenciária junto ao preso e um defensor juntamente com o juiz; etc.

O juiz da 1ª Vara de Execução Penal do Tribunal de Justiça de Pernambuco, Adeildo Nunes, ao ser entrevistado pela equipe da impressa do PPAB (Presídio Aníbal Bruno), emitiu o seguinte posicionamento, logo após a realização do lançamento oficial da videoconferência na justiça pernambucana.

"[...] Imprenssa:Na sua opinião, isso vai facilitar o trabalho da Justiça, Dr. Adeildo? Juiz: Mas é claro, isso é um pioneirismo, talvez no Brasil. Eu lhe asseguro que no nordeste não existe um modelo como este. Não sei no sul do País, que é sempre mais evoluído. Eu considero essa solução da maior importância. Você pode observar que eu tenho contato direto com o preso. Isso é um motivo de humanização que a gente tanto pretende dentro das penitenciárias, não é? É a condição de o preso poder falar diretamente com o Juiz, que é muito importante. Não é para o Juiz não, é para o preso. O preso se sente mais seguro com o Juiz. E, muitas vezes, por falta de estrutura material e física, naquelas visitas que a gente faz normalmente, não há condição de falar com o preso. Quantas e quantas vezes eu vou para a penitenciária e, é o caso do Aníbal Bruno, por exemplo, e deixo de atender 15 a 20 presos por que não deu tempo. É demorado, e procura a pasta e não acha...E aqui não, aqui a gente já tem uma estrutura. O fato de a relação dos processos poder chegar antecipadamente por fax e a gente então poder agilizar é ótimo(3)

A imprensa pernambucana, precisamente o Jornal do Commercio, em maio de 2001 divulgou para sociedade a seguinte notícia:

" A justiça pernambucana dispõe de mais de um instrumento para agilizar os processos dos detentos do Presídio Aníbal Bruno. Em caráter experimental, o juiz da 1ª Vara de Execução Penal, Adeildo Nunes, interrogou ontem três presidiários através de teleaudiência. Em poucos minutos, Adeildo Nunes ouviu Sebastião Luiz de Araújo, Renildo José da Silva e José Severino do Nascimento Júnior. Os casos de Renildo e Sebastião tiveram resultados imeditos, devendo os dois saírem do regime fechado para o semi-aberto. "Há oito meses que pedia para revisarem meu processo e em cinco minutos o juiz resolveu tudo" comemorou Renildo, condenado há reclusão de dois anos e três meses por porte de arma e mais seis anos pela Comarca de Abreu e Lima e que deve ir para Penitenciária Agrícola de Itamaracá. Apenas o caso de José Severino, preso, também, por porte ilegal de arma, não foi resolvido no momento, mas terá o parecer na próxima semana ".(J.C., maio/2001)

 

Doutor em direito penal, co-fundador e primeiro presidente do IBCCRIM, Luiz Flávio Gomes, em seu artigo "O Uso da videoconferência na Justiça", afirma que:

"Não vejo sinceramente nenhum mal na utilização de toda essa inovação tecnológica no âmbito da Justiça, ao contrário, isso constitui considerável avanço, que até pode combater a sua clássica morosidade[...].[...]Os interrogatórios em juízo são cada vez mais demorados. O custo do transporte dos presos não é irrisório. A insegurança que traz é patente. Incontáveis resgates acontecem justamente quando estão sendo transportados. Uma precatória para ouvi uma testemunha demora meses. A rogatória anos. Até quando a Justiça ficará excluída da modernidade comunicacional?[...]A difusão da videoconferência na Justiça está fadada a evitar o envio de milhões de of´cios, de requisições, de precatórias, é dizer, economiza-se tempo, papel, serviço, dinheiro etc. Pode-se ouvir uma pessoa em qualquer ponto do país ou do planeta, sem necessidade do seu deslocamento. Elimina-se riscos, seja para o preso( que pode ser atacado ou resgatado quando está sendo transportado), seja para a sociedade."(4)

A corrente contrária a realização de interrogatórios on line entendem que: a) o interrogatório on line retira do preso ou acusado o contato físico, sendo fundamental tais características; b) o interrogatório on line não pode ser aplicado por falta de lei; c) o interrogatório virtual fere princípios e garantias constitucionais, tais como o devido processo legal, a dignidade, a ampla defesa, o contraditório, a legalidade, etc.

O movimento de oposição ao interrogatório on line tem como adeptos a Associação Juízes para Democracia(AJD), o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCRIM), a Associação dos Procuradores do Estado de São Paulo (APESP), o Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD) e outras entidades de âmbito estadual e nacional, inclusive órgãos públicos.

O advogado criminalista, Luiz Flávio Borges D’Urso, em seu artigo "O interrogatório por teleconferência: uma desagradável Justiça virtual", expõe que o interrogatório on line ( videoconferência):

" revela-se perversa e desumana, afastando o acusado da única oportunidade que tem para falar ao seu julgador, trazendo frieza e impessoalidade a um interrogatório.[...]O interrogatório é a grande oportunidade que tem o juiz para formar juízo a respeito do acusado, de sua personalidade, da sinceridade, de suas desculpas ou de sua confissão.[...]Além disso, pensamos que a tese não resiste há uma análise de constitucionalidade, porquanto nossa Carta Magna consagra a ampla defesa(art. 5º, LV, CF), bem como o Brasil subscreveu pactos internacionais, nos quais, entende-se que não há devido processo legal, se não houver apresentação do acusado ao juiz( Convenção Americana sobre Direitos Humanos)."(5)

 

2.2. Jurisprudência

Os Tribunais do nosso País têm emitidos os seguintes entendimentos quanto a questão do interrogatório on line:

"INTERROGATÓRIO JUDICIAL ON-LINE.Valor-Entendimento – O sistema de teleaudiência utilizado no interrogatório judicial é válido à medida que são garantidas visão, audição, comunicação reservada entre o réu e seu defensor e faculta, ainda, a gravação em compact disc, que será anexado aos autos para eventual consulta. Assim, respeita-se a garantia da ampla defesa, pois o acusado tem condições de dialogar com o julgador, podendo ser visto e ouvido, além de conversar com seu defensor em canal de áudio reservado."(TACRM/SP – Apelação nº 1.384.389/8 – São Paulo – 4ª Câmara – Relator: Ferraz de Arruda – 21.10.2003 – V.U., Voto nº 11.088).

"Hábeas Corpus – Pretensão de se anular instrução realizada pelo sistema de videoconferência – Alegação de violação dos princípios do devido processo legal, contraditório e ampla defesa – Nulidade inocorrente – violação não caracterizada porque mantido o contato visual e direto entre todas a partes e porque facultada a permanência de um defensor na sala de audiência e outro na sala especial onde o réu se encontra – Medida que, ademais acarreta celeridade na prestação jurisdicional e sensível redução de custos para o Estado- Ordem denegada"( Tribunal de Justiça de São Paulo, Hábeas Corpus nº 428.580-3/8)

 

" Recurso de habeas corpus. Processo Penal. Interrogatório feito via sistema conferencia em real time. Inexistindo a demonstração de prejuízo, o ato reprochado não pode ser anulado, ex vi artigo 563 do CPP. Recurso desprovido" (STJ, RHC 6272/SP, 5ª Turma, Rel. Ministro Félix Fischer, j. 3/4/97, impetrante Evaldo Aparecido dos Santos)

 

Em 14 de setembro de 2004, ao analisar o recurso ordinário em Habeas Corpus 15.558/SP, impetrado em favor de Jair Facca Junior, a 5ª Turma do STJ decidiu, por unanimidade, que o uso do interrogatório on line em ação penal não acarreta cerceamento do direito de defesa, não havendo portanto nulidade a sanar.

Na verdade o interrogatório on line não afeta as garantias do presos. A presença virtual do preso, através da videoconferência, é real e interativa. As partes são vistas e ouvidas simultanteamente sem prejuízo nenhum de som ou imagem.

O novo sistema de instrução evita os julgamentos à revelia e os fenômenos interligados aos atos processuais, tais como, a impossibilidade do deslocamento do acusado seja por doença ou condição financeira.

2.3. Opinião do Preso

 

A opinião de um detento concessionado, Paulo Ricardo feito no encontro feito por interrogatório on line entre a FISEPE, a equipe da coordenação do projeto em Pernambuco, o Tribunal de Justiça – TJPE, o Presídio Aníbal Bruno – PPAB e autoridades do Tribunal de São Paulo e da área de Segurança Pública, foi:

"[...]Há o entusiasmo dos presos aqui dentro, porque tudo o que vem ajudar na saída deles, do detento para sociedade, é bem visto pela comunidade do presídio. Vocês têm aí em São Paulo uma situação explosiva. A comunidade carcerária, aí, vive tensa, vive em rebeliões. Quem sabe, seja pela lentidão dos processos criminais e esse sitema está aí para liquidar com tudo isso. Todo dia aqui é para apresentar 40 presos à Justiça, que nem sempre são levados ao juiz por diversos motivos. E isso pode ser resolvido pela teleconferência dependendo de quantas salas estiverem montadas."(6)

3. AMPLA DEFESA

Preceitua a Constituição Federal em seu artigo 5º, LIV que "Ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal".

Determina o artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal que "aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes".

A ampla defesa como corolário do devido processo legal serve de segurança jurídica dada ao acusado ou réu para que ele traga ao processo todos os elementos tendentes a elucidar a verdade, podendo até valer-se do silêncio, se entender necessário.

A ampla defesa contém duas regras, quais sejam: a) a possibilidade do acusado se defender (esta contida na defesa técnica e na autodefesa) e, b) na possibilidade de recurso.

Entende-se por defesa técnica aquela realizada por meio de advogado. Já a autodefesa é aquela em que o acusado assume a proteção processual dos seus próprios interesses em face da acusação que pesa contra si. Salutar observar que a defesa pessoal (autodefesa) no processo penal brasileiro só é conhecida por ocasião do interrogatório.

Defesa ampla, na realidade, assegura ao acusado a autodefesa, a defesa técnica, a defesa efetiva, defesa por qualquer meio de prova (inclusive a prova ilícita, que só é admitida pro reo, para comprovar a sua inocência), o direito do acompanhamento da prova produzida, de fazer a contraprova, etc.

Segundo a súmula 523 do STF: "No processo penal, a falta de defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu".

Sabemos que o acusado não está obrigado a praticar nenhum ato que lhe desfavoreça, podendo, por exemplo, mentir durante o interrogatório. Não há o crime de perjúrio no Brasil (privilégio contra auto-incriminação).

Por fim o processo penal, como instrumento para realização do Direito Penal, deve observar a sua dupla função: tornar viável a aplicação da pena,e servir como efetivo instrumento de garantia dos direitos e liberdades individuais, assegurando os indivíduos contra atos abusivos do Estado.

4. PRINCÍPIO DA VERDADE REAL (DA VERDADE PROCESSUAL)

Para o processo penal o que importa é descobrir a realidade dos fatos.

Por força do princípio da verdade real, vigora no processo penal brasileiro a regra da liberdade de provas, ou seja, todos os meios probatórios, em princípio, são válidos para demonstrar a verdade real. Contudo, existem exceções e restrições, quais sejam: provas ilícitas, prova ilícita por derivação, prova ilegítima e o artigo 475 do Código de Processo Penal.

As provas ilícitas e a prova ilícita por derivação são inadmissíveis no processo, mas passam a ter valor jurídico se forem a favor do réu ou acusado, por força do princípio da proporcionalidade, uma vez que a presunção de inocência deve preponderar sobre a inadmissibilidade da prova ilícita.

Trabalhar com a verdade real (ou material) é colher elementos probatórios necessários e lícitos para se comprovar, quem realmente praticou um ato ilícito.

A prova existe para ajudar a formação do convencimento do juiz sobre a veracidade de uma afirmação de fato alegada pelas partes em juízo.

A aplicação da norma penal no infrator somente poderá ser efetivada se todos os esforços e meios legais tenham sido devidamente empregados, assim demonstrando a culpa do indivíduo.

Nos dizeres de Carnelutti, a tarefa do processo penal está em saber se o acusado é inocente ou culpado.

O Direito deve socorrer-se de outras ciências e meios para que se possa chegar o mais próximo possível da verdade real.

Descobrir a verdade do fato praticado, através da instrução probatória, proporciona ao juiz, no momento da sentença, aplicar a lei penal ao caso concreto, extraindo a regra jurídica que lhe é própria.

Importante ressaltar que, não obstante chamarmos de verdade real (material), nem sempre ela condiz com a realidade fática ocorrida no mundo físico.

Conceituar a verdade é adentrarmos no mudo filosófico. O que pode ser verdade para uns pode não ser para outros. Porém, em se tratando de verdade material a ser apurada nos autos de um processo há que se considerar a adequação entre o fato objeto do processo e o fato ocorrido no mundo dos homens.

Filósofos que estudaram a teoria da verdade afirmam que a verdade absoluta é inatingível. Logo, o processo deve buscar a verdade que seja possível atingir sem violar a moral e prejudicar o sujeito que irá responder pelos atos ilícitos a ele atribuídos. O desejo de se descobrir a verdade é o desejo de se  realizar a justiça.

O advogado e professor, Gustavo Henrique, entende que:


"Regras de Teoria Geral do Processo distinguem claramente a verdade buscada pelo processo civil da buscada pelo processo penal. O professor EGAS MONIZ DE ARAGÃO disserta que, de há muito se repete, com se estivesse certo haver, no mínimo, três "verdades", ou três graus da "verdade", perante o Direito: "a que é verdade mesmo"; "a que se supõe que seja", "verdade material" (que perseguem os processualistas penais); a que não o é, conquanto possa também sê-lo, sendo até irrelevante se é ou não é, "verdade formal" (com que deveriam contentar-se os processualistas civis). Basta enunciar essas proposições para perceber sua improcedência.
Pondera o mesmo professor, mais adiante, que a busca do processo, tanto civil quanto penal, nem pode ser outra que a verdade dos fatos, mas tendo ou não alcançado este estágio, há um momento que o processo tem de ser dado por encerrado e o julgador tem de proferir sentença. Portanto, se não se atinge o objetivo (verdade), não é porque sua finalidade não seja alcançá-la, e sim por meras circunstâncias acidentais, que sobre ele influem com intensidade maior ou menor. A verdade do juiz é subjetiva.
A posição atualmente mais aceita é a de que o processo penal busca a descoberta da verdade material – sinônimo de verdade real -, enquanto para o processo civil basta a verdade formal, esta entendida como aquilo que resulta ser verdadeiro em face das provas carreadas aos autos. Em outras palavras, no processo civil cabe às partes convencer o juiz, apresentando-lhe provas. Já o processo penal deve buscar a verdade real, e só contentar-se com a verdade formal para absolver.
Assim, uma condenação criminal sempre deverá pressupor o encontro da verdade real acerca dos fatos descritos na acusação. Isso é indeclinável e sobre isso não pode haver exceção alguma, sob pena de ilegais violações a direitos fundamentais do homem.
Desde logo percebe-se, todavia, que a verdade material é difícil de ser atingida sem o auxílio de meios científicos. Sim, pois se a palavra de uma testemunha tem o seu quantum de verdade apurada meramente pelo juiz, através de métodos empíricos, não se poderá falar, em absoluto, em verdade material. Pois a verdade material pressupõe – ou deveria pressupor – o máximo de verdade possível de ser encontrada em relação à construção histórica de determinado fato. É certo que a verdade absoluta é inatingível. Todavia a reconstrução dos fatos ou a busca da verdade deve ser feita através dos mais eficazes meios para tanto.
Assim é que a polícia técnica atualmente auxilia o magistrado, apontando-lhe, através de critérios científicos, detalhes que possam, ao máximo possível, levar ao conhecimento da verdade real.
Conclui-se, portanto, que a verdade real ou material deve ser buscada pelos meios mais eficazes disponíveis na sociedade em determinada época. Isso também deve ocorrer, portanto, em relação à prova testemunhal. Ora, se atualmente existem métodos científicos - principalmente afetos à psicologia - disponíveis para a busca da verdade material, inconcebível que ainda sejam utilizados métodos empíricos."(8)

 


O Processo Penal moderno deve perseguir a verdade material (real), utilizando-se da verdade científica, e até mesmo utilizar meios tecnológicos para tais fins.

 

5. CONCLUSÃO

O interrogatório no processo penal com o advento da Lei 10.792/03, sofreu modificações substanciais. Muito embora a referida Lei seja silente quanto a realização do interrogatório por meio de videoconferência, alguns Tribunais do nosso país já estão realizando os chamados interrogatórios on line. Contudo, a utilização da tecnologia no interrogatório gerou na seara processual penal duas correntes.

A primeira corrente defende que tais meios lesam direitos e garantias do réu ou acusado(devido processo legal, ampla defesa e contraditório), pois o momento "face a face" com o juiz é único para o preso. Alegam também que a aplicação desta tecnologia não está prevista em lei. Lamentável tal argumento, pois se não está previsto explicitamente, também não há proibição legal, o que há é uma omissão em que a lei 10.798/03 fez questão em mantê-la quanto ao artigo 185 do Código de Processo Penal.

Os adeptos a realização do interrogatório on line afirmam que o fato da presença ser virtual em nada atinge os direitos e garantias do preso (devido processo legal, ampla defesa e contraditório), pelo contrário tal tecnologia proporciona ao processo penal agilização, e com isso o preso terá os seus direitos observados no seu devido tempo, pois aqueles que esperam, por exemplo, pela progressão de regime não perecerá no tempo para obtê-la.

A realização do interrogatório on line fere a ampla defesa do acusado ou réu?

Vimos ao longo do presente artigo que as modificações ocorridas quanto ao interrogatório, na verdade ampliaram os direitos e as garantias do acusado, dentre elas: a) as partes poderão, desde que fundamentada, requerer novo interrogatório; b) antes da realização do interrogatório, o juiz assegurará o direito de entrevista reservada do acusado com seu defensor; c) presença obrigatória do defensor no interrogatório; d) após o interrogatório as partes (Defensor, Ministério Público e Querelante) poderão participar do mesmo formulando perguntas e dirigindo-as ao juiz, e este achando-as pertinentes e relevantes as fará ao acusado; e) o silêncio do acusado não poderá ter interpretação de confissão, etc. Tais modificações trazem de forma clara a ampliação a favor da defesa do acusado. A preocupação do legislador em garantir a máxima defesa ao acusado é notória, fazendo assim jus a um sistema processual penal que tem bases em um Estado Democrático de Direitos.

No interrogatório on line, câmeras e recepção de áudio podem ser monitorados por controle remoto, identificando os presentes em cada sala.

No momento da realização do interrogatório on line, todas as determinações legais são cumpridas, senão vejamos: existe a presença das partes(Defensores, Ministério Público ou Querelante) no referido ato; o magistrado fala que o réu não está obrigado a responder a nenhuma pergunta, mas que é o interrogatório o momento próprio para que o acusado exponha a sua verdade sobre a acusação; é feita a leitura da denúncia; são realizadas as perguntas em sua duas fases (sobre a pessoa do acusado e sobre os fatos); as partes participam do interrogatório realizando perguntas, entre outros procedimentos.

Quando falamos de "ampla defesa do acusado" devemos entende-la como aquela em que o réu ou acusado tem assegurado a autodefesa, a defesa técnica, a defesa efetiva, a defesa por qualquer meio de prova, o direito de acompanhamento da prova produzida, de fazer a contraprova, de manter o silêncio e até mesmo de mentir durante o interrogatório, pois não há o crime de perjúrio no Brasil. Sabemos que o acusado não está obrigado a praticar nenhum ato que lhe desfavoreça, e que a falta de defesa gera nulidade absoluta. Portanto, o acusado pode valer-se de vários meios para elucidar, esclarecer os fatos a ele imputados.

Defesa ampla como corolário do devido processo legal serve de segurança jurídica dada ao acusado ou réu para que ele traga aos autos todos os elementos tendentes a esclarecer a verdade, podendo até valer-se do silêncio.

A realização do interrogatório on line não veta os procedimentos que a justiça deve assegurar quanto a ampla defesa do acusado, posto que todos os atos impostos por lei são observados pelos magistrados.

A presença do acusado, do defensor, do magistrado e demais pessoas presentes no interrogatório on line é uma presença em tempo real. O juiz ouve e vê o acusado, sendo a recíproca verdadeira. Imagens e sons são transmitidos e recebidos reciprocamente, sem interferências ou falhas. A tecnologia é de "ponta", considerada de alta qualidade e eficiência. Na verdade, a tecnologia utilizada no interrogatório on line só difere do interrogatório " frente a frente" quanto ao espaço, ou seja, um é virtual o outro não. O fato do espaço ser virtual não traz prejuízos aos procedimentos a serem adotados e não tira do acusado a sua possibilidade de exercer a sua autodefesa, o seu silêncio, a sua ampla defesa.

Os Tribunais pátrios entendem que a videoconferência em nada afeta os direitos e garantias do preso, posição esta já encontrada no Superior Tribunal de Justiça.

A própria comunidade carcerária vem aceitando e acatando tal procedimento(interrogatório on line), afinal é um meio ágil e eficaz deles – presos- terem seu direito a liberdade em tempo, tendo a certeza que não correm o risco de pagarem além do que devem para sociedade.

Não resta dúvidas que a realização do interrogatório on line não fere a ampla defesa do acusado, posto que todos os seus direitos são observados e exercidos.

Para o processo penal o que importa é descobrir a realidade dos fatos.

Por força do princípio da verdade real, vigora no processo penal brasileiro a regra da liberdade de provas, ou seja, todos os meios probatórios, em princípio, são válidos para demonstrar a verdade real.

A prova existe para ajudar a formação do convencimento do juiz sobre a veracidade de uma afirmação de fato alegada pelas partes em juízo.

O interrogatório, como meio de prova, deve ser analisado em conjunto com as outras provas acostadas aos autos.

A aplicação da norma penal no infrator somente poderá ser efetivada se todos os esforços e meios legais tenham sido devidamente empregados, assim demonstrando a culpa do indivíduo.

Finalmente, o Direito é dinâmico e deve acompanhar os passos da sociedade. A descoberta da tecnologia em beneficio da humanidade deve ser usada em todos os setores, como o é atualmente. Os aplicadores do direito devem ser reciclados em suas visões para que não parem no tempo e sirvam de verdadeiros monumentos de museus.

Portanto, se a videoconferência não elimina os direitos e garantias do preso, não há motivos para não realiza-la, ao contrário, segundo alguns juízes que tiveram a oportunidade de realizá-las opinaram por mantê-las, pois sentiram que poderiam levar ao réu, ao acusado uma Justiça mais célere.

Isto posto, o interrogatório on line traz para o mundo do processo penal o dinamismo que tanto necessitava, fazendo Justiça a tempo, e quiçá, no futuro, sanando todos os problemas que o sistema prisional tem em conjunto com o Judiciário.

* Ana Cláudia da S. Bezerra, Advogada atuante em
Recife(PE), pós-graduanda latu sensu em Direito Penal e Direito
Processual Penal pela Escola Superior de Magistratura de Pernambuco e
Faculdade Maurício de Nassau.

 

 

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NOTAS.

(1) ARAS, Vlademir. Teleinterrogatório não elimina nenhuma garantia processual (Tele-hearring does not eliminate any procedural guarantee), p. 02. Sociedade Digital. Disponível em: htpp://www.cbeji.com.Br/Br/novidades/artigos/main.asp?id=3601. Acesso em: 25 janeiro 2005.

(2) GÜNTHER, Ulrich N. Proteção de Vítimas e Testemunhas no Processo Penal na Alemanha. Revista Direito Mackenzie. Número 2. Ano 1. 24/3/2003.

(3) PEREZ, Carlos Alexandre Dias, et al. Aplicações de Videoconferência em Áreas Críticas de Gestão Governamental. Disponível em: www.cqgp.sp.gov.br/downloads/T00144.pdf Acesso em: 01/02/2005.

(4) GOMES, Luiz Flávio. O Uso da Videoconferência na Justiça.Artigos Clássicos. p. 1 –2. Disponível em: http://www.justicavirtual.com.br/artigos/art120.htm. Acesso em:11 fev 2005.

(5) D’URSO, Luiz Flávio Borges. O interrogatório por teleconferência: uma desagradável Justiça virtual.Jus Navegandi, Terezina, ª7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=3471. Acesso em: 01 fev. 2005.

(6) PEREZ, Carlos Alexandre Dias, et al. 144- Aplicações de videoconferência em áreas críticas de gestão governamental.p. 13. Disponível em: www.cqgp.sp.gov.br/downloads/T00144.PDF. Acesso em: 01/02/2005.

(7) DIETRICH, Gustavo Henrique.A Verdade no processo penal moderno.Disponível me: http://www.dietrich.adv.br/i_ler_artigos.asp?id=15. Acesso em: 02 fevereiro 2005.