Liquidez do crédito tributário
Cacildo Baptista Palhares Júnior
Advogado
Presunção de liquidez e
certeza
De acordo com o art. 204 do
Código Tributário Nacional, a dívida
tributária regularmente inscrita, ou seja, aquela inscrita com observância dos
requisitos expostos no art. 202 daquele código, goza
de presunção de certeza e liquidez. Essas normas foram repetidas nos arts. 2o e 3o da Lei 6.830/80, porque
esta última lei trata não só de exigência de créditos tributários, mas também
de não-tributários.
Requisitos formais para a liquidez
A teor
do art. 202, II, do Código Tributário Nacional, no Termo de Inscrição de Dívida
Ativa e na Certidão de Dívida Ativa devem constar a
quantia devida, a maneira de calcular a correção monetária (1) e os juros de
mora acrescidos, e o dispositivo legal que permite o cálculo da multa. A finalidade dessas regras é atribuir ao
crédito tributário a certeza e liquidez inerentes aos
créditos a que se referem os títulos em geral, concedendo ao executado
elementos para se defender da exigência, de acordo com o princípio da ampla
defesa, obstando exigências arbitrárias (2).
Não é necessária a
explicitação, na Certidão de Dívida Ativa, dos cálculos da correção monetária e
dos juros (3), porque se entende que o executado é capaz de realizá-los.
É necessária a especificação,
na Certidão de Dívida Ativa, das parcelas do crédito tributário, de modo que o
contribuinte possa discutir cada uma (4).
A pena de nulidade da
inscrição e da respectiva Certidão de Dívida Ativa, prevista no art. 203 do
Código Tributário Nacional, deve ser interpretada com certa restrição, porque
um defeito formal insignificante, que não compromete a essência do título
executivo, não implica a expedição de nova Certidão de Dívida Ativa, porque a
nulidade, nesse caso, conspiraria contra o princípio da efetividade, aplicável
ao processo executivo extrajudicial. Assim, a nulidade da CDA não deve ser
declarada por eventuais falhas que não geram prejuízos para o executado na
promoção de sua defesa. Estando o título formalmente perfeito, com a
discriminação precisa do fundamento legal sobre que repousam a obrigação
tributária, os juros de mora, a multa e a correção monetária, revela-se
descabida a sua invalidação (5).
Certidão de Dívida Ativa e
lançamento
Deve haver plena coincidência entre o
crédito tributário que se pode inferir do lançamento e o da Certidão de Dívida
Ativa. Se houver desencontro, a execução deve ser extinta (6).
Alegação de iliquidez
A alegação de que o crédito tributário é
ilíquido pode ser apresentada tanto em embargos do devedor quanto em exceção de
pré-executividade (7). Se a Fazenda Pública entender que ele é ilíquido, pode
proceder à substituição da Certidão de Dívida Ativa até o momento da prolação
da sentença nos embargos do devedor, conforme dispõe o art. 2o, § 8o,
da Lei 6.830/80.
Caracterização da liquidez
Um dos requisitos para a liquidez do crédito
tributário é a demonstração clara, na Certidão de Dívida Ativa, dos elementos
que o compõem. A partir da Certidão de Dívida Ativa deve ser possível inferir
quanto é a dívida. O que não se admite é a obscuridade da qual decorra
necessidade de se realizar novo lançamento tributário (8). Nesse caso, o
crédito seria ilíquido.
Se a supressão da Certidão de Dívida Ativa
de valores indevidamente cobrados puder ser realizada por simples operação
aritmética, não ocorrerá nulidade da execução (9).
A dispensa, por lei posterior à propositura
da execução fiscal, de parte da dívida inscrita, pode tornar ilíquido o crédito
cobrado, se houver impossibilidade de discriminar a parte devida e a indevida.
A impossibilidade daria ensejo à extinção do processo de execução fiscal (10).
Se aplicadas diversas multas de valor fixo,
quando na verdade deveria ter sido aplicada apenas uma, arbitrada segundo os
requisitos da lei, o crédito tributário é ilíquido (11).
O reconhecimento de que o credor está
cobrando mais do que é devido não implica a nulidade do título executivo
extrajudicial, desde que o excesso possa ser discriminado nos próprios autos da
execução, mediante supressão da parcela destacável da Certidão de Dívida Ativa
ou por meio de simples cálculos aritméticos.
No caso de serem cobrados, no lançamento,
Imposto Predial e Territorial Urbano e taxas municipais, se for indevido o
imposto, não ocorre nulidade da execução, se houver separação, na Certidão de
Dívida Ativa, dos valores do imposto e das taxas, caso em que basta simples
cálculo aritmético para se apurar o montante de cada tributo (12).
O pagamento parcial da dívida realizado
antes da emissão da Certidão de Dívida Ativa não afeta a liquidez do crédito
(13), quando é possível, por meio de simples cálculos aritméticos, apurar-se o saldo remanescente, dando ensejo ao
prosseguimento da execução fiscal (14). No entanto, existe entendimento em
contrário (15). A primeira posição parece ser procedente. Quando forem julgados
os embargos do devedor, tendo havido algum pagamento anterior, basta diminuir
do crédito o valor pago. Por ser mera operação aritmética, não haverá
discordância jurídica.
Se o parcelamento realizado no curso da
execução for descumprido, e a execução for retomada, o crédito não pode ser
considerado ilíquido por terem sido pagas algumas parcelas (16).
A aplicação de índice indevido de correção
monetária, assim julgado nos embargos do devedor, não torna ilíquido o crédito
tributário, porque é possível, com mera operação aritmética, refazer o cálculo,
agora considerando o novo índice (17).
A exclusão da taxa de juros por decisão nos
embargos do devedor não afeta a liquidez do crédito (18).
Ônus da prova da iliquidez
O Superior Tribunal de Justiça tem decidido
que cabe ao embargante o ônus de provar a improcedência do crédito tributário
objeto da execução (19).
No entanto, o embargante pode alegar
nulidade ocorrida em momento anterior à execução, como, por exemplo, no caso de
ausência de notificação do lançamento. Nessa hipótese, cabe ao Fisco o ônus de
refutar a ocorrência da nulidade (20), porque é impossível ao contribuinte
realizar prova negativa.
Podem ser contestados os critérios
utilizados para a elaboração do lançamento que deu origem à inscrição em dívida
ativa (21).
Por exemplo, no caso de o INSS haver
considerado como empregados pessoas que não são, e tal erro tiver sido provado
documentalmente nos embargos do devedor, a presunção relativa de liquidez e
certeza do crédito tributário é afastada, mesmo se os documentos comprobatórios
constarem já do processo administrativo (22).
Notas
(1) Superior
Tribunal de Justiça, agravo regimental no agravo de instrumento 485548.
(2) Superior
Tribunal de Justiça, agravo regimental no agravo de instrumento 485548.
(3) Superior
Tribunal de Justiça, recurso
especial 106119.
(4) Tribunal
Regional Federal da 5ª Região, apelação cível 99731.
(5) Superior
Tribunal de Justiça, agravo regimental no agravo de instrumento 485548.
(6) Superior
Tribunal de Justiça, recurso
especial 396192.
(7) Superior
Tribunal de Justiça, recurso
especial 472514.
(8) Superior
Tribunal de Justiça, recurso
especial 19366.
(9) Superior
Tribunal de Justiça, recurso
especial 499502.
(10) Superior
Tribunal de Justiça, agravo regimental no recurso especial 658002.
(11) Tribunal
Regional Federal da 4ª Região, apelação cível 496729.
(12) Superior
Tribunal de Justiça, recurso
especial 64634.
(13) Superior
Tribunal de Justiça, recurso
especial 164158.
(14) Superior
Tribunal de Justiça, embargos de
declaração no recurso especial 429611.
(15) Tribunal
Regional Federal da 1ª Região, apelação cível, 199901000731043.
(16) Superior
Tribunal de Justiça, recurso
especial 175890.
(17) Tribunal
Regional Federal da 1ª Região, remessa ex-officio, 200101000265974.
(18) Superior
Tribunal de Justiça, recurso
especial 188784.
(19) Superior
Tribunal de Justiça, recurso
especial 624842.
(20) Superior
Tribunal de Justiça, recurso
especial 493881.
(21) Tribunal
Regional Federal da 1ª Região, remessa ex-officio, 9601205063.
(22) Superior
Tribunal de Justiça, recurso
especial 488903.
Título
do trabalho |
Liquidez
do crédito tributário |
Mês
e ano da elaboração ou atualização do trabalho |
Maio
de 2005 |
Nome
completo do autor |
Cacildo Baptista Palhares Júnior |
Profissão
e qualificações do autor |
Advogado |
Cidade
de domicílio do autor |
Araçatuba
(SP) |
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