O CIGARRO CONTRA LEGEM
Herez Santos
Bacharel em Ciências Náuticas & Direito
Advogado no Rio de Janeiro.
A Deus
SUMÁRIO:
1.0 INTRODUÇÃO
2.0 NÓTULAS PRÉVIAS
2.1 Humanismo - 2.2 Responsabilidade civil.
3.0 O CIGARRO
3.1 Aspectos físico-químicos - 3.2 Aspecto biológico-patológicos
4.0 O ENFOQUE JURÍGENO
4.1 Atividade lícita - 4.2 Periculosidade inerente - 4.3 Conhecimento dos riscos - 4.4 Obrigação de informar - 4.5 Publicidade enganosa - 4.6 Vício de fumar - 4.7 Iniciação ao vício - 4.8 Abandono do vício - 4.9 Casualidade - 4.10 Doença multifatorial e nexo causal - 4.11 Vício de concepção - 4.12 Cigarro seguro - 4.13 Ônus da prova.
5.0 CONCLUSÃO
BIBLIOGRAFIA
1.0 INTRODUÇÃO
As transnacionais indústrias do tabaco mantiveram por muito tempo a sociedade desinformada a respeito dos riscos da exposição direta e indireta ao fumo. Entretanto, depois de tornados públicos os inúmeros documentos internos que as tabaqueiras trocavam entre si, viram-se confirmadas as mais de 60.000 pesquisas registradas pela Organização Mundial de Saúde sobre os danos causados pelo fumo. Ninguém mais põe em duvida que o cigarro é responsável pelo aparecimento de vários tipos de câncer, como o de pulmão, boca, bexiga e estômago. Por conta disso, inclusive, acabou a jurisprudência das cortes americanas se firmando em desfavor das tabageiras.
No Brasil, a literatura médico-científica associa o tabaco a diversos malefícios desde 1849, quando veio a lume o texto “Breves reflexões higiênicas sobre o uso do tabaco”, de Martinho Xavier Rabelo, disponível na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro. Cita-se ainda, “O fumo e seus efeitos no organismo humano” (Joaquim Nogueira Paranaguá, 1914), “O vício de fumar” (Eugênio Jorge, 1936), “Tabagismo” (Inácio Lopes, 1942), “O fumo” (Francisco de Fuccio, 1953), “Os escravos do século” (Edgard Berger e Oldemar Beskoe, 1964).
E é o art. 18 do Código de Defesa do Consumidor que dita serem impróprios para o consumo, dentre outros, os produtos nocivos à vida ou à saúde.
Por sua vez, as fontes das regras de experiência são variadas. Algumas, a despeito de incorporadas à sabedoria popular, têm base científica, como a de que onde existem águas estagnadas proliferam mosquitos, ou a de que é de nove meses o período de gestação do ser humano, ou, ainda, a de que o cigarro faz mal à saúde.
A despeito de tudo isso, entretanto, o que ainda se faz certo é que, diferentemente do que ocorre em outras plagas, por aqui as ações promovidas por fumantes ou seus familiares em face das fumageiras, na sua maioria, estão sendo julgadas em desfavor dos policitantes.
Mas o fato é que o desato das demandas envolvendo pretensões indenizatórias decorrentes de danos tidos como provocados pelo fumo exige dos envolvidos no drama processual instalado amplos conhecimentos a respeito das disceptações trazidas a juízo.
É sabido por alguns, a exemplo, que o cigarro contém partículas radioativas que seriam as responsáveis pelas doenças, como certos tipos de câncer de que os fumantes tendem a ser vítimas. Ocorre que os fumantes brasileiros podem estar submetidos a riscos maiores do que os viciados de outros países, segundo reportagem editada pela revista Superinteressante (http://super.abril.com.br/superarquivo/1988/conteudo_111275.shtml). O físico nuclear João Arruda Neto, da Universidade de São Paulo, diz o artigo da revista, em pesquisa original, constatou que pelo menos algumas marcas de cigarros vendidas no Brasil contêm duas vezes mais o elemento radioativo urânio do que marcas vendidas no exterior. O motivo, conclui a reportagem, estaria nos solos do norte de Minas e sul da Bahia, ricos em urânio e tório, que abrigam extensas plantações de fumo. Ora, seria esta razão bastante para se aplicar a teoria do risco integral na apuração de responsabilidades (Lei n° 6.453/1977, art. 1°, VII e VIII).
Sem argüir pioneirismo, e não se pretendendo fazer exaurido o assunto, o presente escrito propõe-se a desvelar sob o enfoque jurígeno síntese a mais abrangente possível a respeito das questões contrapostas relativas ao fumo.
2.0 NÓTULAS PRÉVIAS
2.1 Humanismo.
Protágoras mesmo já dizia que o homem é a medida de todas as coisas.
Na concepção filosófica do humanismo a pessoa humana é a razão de ser da ciência, aí incluída a ciência do Direito, devendo situar-se como centro de toda reflexão. Aliás, o Direito não se justifica se não estiver à disposição da pessoa humana.
Nesse passo, pertinente dizer, repetindo os doutos, que o princípio da dignidade da pessoa humana identifica um espaço de integridade moral a ser assegurado a todas as pessoas por sua existência no mundo. Trata-se de um valor supremo da democracia, garantido pela força normativa da Constituição.
No que, a saúde, direito de todos e dever do Estado, integra os direitos sociais, cujo descumprimento gera responsabilização, eis que esta, como direito inerente ao valor supremo da dignidade humana, compõe a ordem pública.
2.2 Responsabilidade civil.
Na seara da responsabilidade civil, abalizada doutrina não hesita em afirmar que o áureo princípio do neminem laedere permanece íntegro.
Ao dizer Josserand que no seu sentido mais amplo a responsabilidade civil qualifica como responsável o causador do dano a si mesmo, o que vem aquele reconhecido civilista confirmar é que responsável é quem quer que, não importa, cause dano.
Nesse sentido, a abonar o que veio expressar aquele jurista francês está Aguiar Dias, para quem a responsabilidade civil emerge do simples fato do prejuízo.
E relativo ao dano, é Alvino Lima quem ressalta com peculiar proficiência que se faz preciso a este vencer, lançando mão de todos os meios preventivos e reparatórios sugeridos pela experiência, porque o dano se faz fator de desperdício e insegurança.
Em complemento àqueles anteriores dizeres proferidos com sabença por seus respectivos autores, vale ainda lembrar, por pertinente, o que afirmou Sólōn desde sua era, quer seja, que a cidade realmente civilizada é aquela em que todos os cidadãos sentem a injúria feita a um só e em que todos exigem sua reparação.
3.0 O CIGARRO
3.1 Aspectos Físico-Químicos
A fumaça do cigarro é uma mistura contendo aproximadamente 4.720 substâncias tóxicas diferentes, constituindo-se de duas fases fundamentais, a saber. A fase particulada, que é composta de nicotina e alcatrão, e, a fase gasosa, que é composta, entre outros elementos, por monóxido de carbono, amônia, cetonas, formaldeído, acetaldeído, acroleína.
A fórmula molecular da nicotina, C10 H14 N2, data de 1843, sendo que a primeira síntese em laboratório ocorreu em 1904. No entanto, desde 1690, na França, a nicotina já era conhecida e era usada como inseticida na agricultura (inseticida de contato, de ingestão e fumigante).
A nicotina é considerada pela Organização Mundial da Saúde/OMS uma droga psicoativa, capaz portanto de causar dependência. Por esta razão o tabagismo é classificado como doença e vem inserida no Código Internacional de Doenças (CID-10) no grupo de transtornos mentais e de comportamento.
Além disso, a nicotina, por conta do efeito de aumentar a liberação de catecolaminas que gera, causa vasoconstrição, acelerando a freqüência cardíaca, dando azo à hipertensão arterial e provocando assim uma maior adesividade plaquetária. Ela e o monóxido de carbono juntos provocam diversas doenças cardiovasculares, além ainda de estimular no aparelho gastrintestinal o aumento da produção de ácido clorídrico, o que pode redundar no surgimento de úlcera gástrica. Ela desencadeia também a liberação de substâncias quimiotóxicas no pulmão, que estimulará o processo de destruição da elastina, provocando o enfisema pulmonar.
O alcatrão, por seu turno, é todo produto da queima de um composto natural. Ele não é uma substância em si mesmo. Ao se queimar, v.g., um pé de couve, ao final o que se obterá é uma espécie de alcatrão. Já o alcatrão formado a partir da combustão dos derivados do tabaco é um composto com mais de 40 substâncias comprovadamente cancerígenas, tais como, o arsênio, o níquel, o benzopireno, o cádmio, resíduos de agrotóxicos, além de substâncias radioativas. Ele se gruda nas paredes do pulmão em sua maior parte, mas uma pequena quantidade entra na circulação e faz um passeio destruidor pelo organismo.
Os expertos informam que na engenharia do cigarro os fabricantes controlam uma ampla gama de fatores, quais sejam: manter o cigarro aceso entre as baforadas, reduzir o desperdício de tabaco, alterar o sabor do fumo e controlar as quantidades de substâncias, tais como, o alcatrão e nicotina. Com estes propósitos, os fabricantes de petume costumam adicionar fosfatos ao papel do cigarro para garantir uma queima constante, além de adicionarem aditivos, tais como, açúcares, xaropes, licores, bálsamos, extratos de frutas, óleos mentolados, coca, substâncias aromáticas. Aditivos sintéticos também são utilizados para controlar o sabor, além do próprio tipo de tabaco e dos processos de curtição. Uma grande variedade de outras substâncias é ainda adicionada nas múltiplas etapas de processamento.
Em face do fato do cigarro conter açúcares como aditivos, tem-se como natural conclusão que por conta da omissão da indústria tabaqueira em informar conveniente e ostensivamente essa particularidade ao público em geral, ao ofertar cigarro a todos indiscriminadamente, está ela permitindo que os desavisados diabéticos fumantes joguem aqueles açúcares na corrente sanguínea, o que infringe a norma protetora dos que se fazem detentores de tal enfermidade.
Pesquisa realizada no Canadá sobre a manipulação química do cigarro pelas indústrias confirmou a suspeita da presença de amônia. Ao tempo em que reduz a acidez do fumo tornando-o mais alcalino, a amônia provoca também uma maior entrega de nicotina ao organismo do fumante. Essa quantidade a mais de nicotina, entregue por ação da amônia, faz aumentar de duas a três vezes a dependência do tabagista. A inserção da amônia no cigarro se deu exatamente com o fito de se ver compensada a redução dos teores de alcatrão e nicotina determinada pelas autoridades de saúde.
As marcas de cigarro mais consumidas até então pelos brasileiros continham altas doses de amônia. No Canadá, país onde se deu a pesquisa da adição de amônia nos cigarros, a gramagem desse elemento químico no cigarro é de 8,9 a 9,8 milionésimos de grama, enquanto aqui, no Brasil, a quantidade varia de 13,2 a 15 milionésimos de grama.
Então, como se sustentar que o consumidor é “livre” para fazer o que quiser, tal como argumentado pela indústria do fumo, se ela própria, a indústria, aumentou a quantidade de nicotina entregue ao organismo através da inserção da amônia, visando exatamente a fidelização ad eternum do fumante?
3.2 Aspectos Biológico-Patológicos
Em 1962, o Royal College of Physicians, entidade médica inglesa, divulgou um documento estabelecendo relação de causa e efeito entre o cigarro e o câncer de pulmão. Em 1964 o Ministério da Saúde dos Estados Unidos trouxe a público um relatório de trezentas e oitenta e sete páginas, reconhecendo esse mesmo fato.
Segundo a Organização Mundial de Saúde - OMS, os fumantes têm sua expectativa de vida reduzida de 10 a 15 anos. Como se não bastasse viver menos, o fumante adquire ainda uma taxa de envelhecimento acelerada. A pele, o coração, o pulmão, o cérebro e as artérias dos tabagistas apresentam graus de degeneração, enrijecimento e aterosclerose (quando há depósito de gorduras nas grandes artérias, chamadas de ateromas) mais acentuados do que as pessoas não-fumantes da mesma idade. Além disso, o tabaco causa cinqüenta tipos de doenças, tais como, aneurisma arterial, úlcera do aparelho digestivo, infecções respiratórias, trombose vascular, impotência sexual no homem. Na mulher, o cigarro ainda pode causar complicações na gravidez, risco maior de infertilidade, câncer de colo de útero, menopausa precoce e dismenorréia.
As doenças cardiovasculares (infarto, angina), o câncer e as doenças respiratórias obstrutivas crônicas (enfisema e bronquite) são freqüentes entre os fumantes. A ação danosa do cigarro sobre o organismo é prolongada. São necessários quinze anos para que um ex-fumante volte ao patamar de risco de doenças cardiovasculares de um não-fumante. Isso mesmo: quinze anos. Por esta razão, os médicos acreditam que largar o vício deve ser encarado pelos adeptos do fumo como uma medida urgente de sobrevivência.
Comercializa-se um vício.
Conforme advertência divulgada em 2005 pelo Instituto Nacional do Câncer – INCA na Internet (www.inca.gov.br), os percentuais de morte oriunda das doenças causadas pelo tabagismo são os seguintes: 25% das mortes causadas por doença coronariana - angina e infarto do miocárdio; 45% das mortes causadas por doença coronariana na faixa etária abaixo dos 60 anos; 45% das mortes por infarto agudo do miocárdio na faixa etária abaixo de 65 anos; 85% das mortes causadas por bronquite e enfisema; 90% dos casos de câncer no pulmão (entre os 10% restantes, 1/3 é de fumantes passivos); 30% das mortes decorrentes de outros tipos de câncer (de boca, laringe, faringe, esôfago, pâncreas, rim, bexiga e colo de útero); 25% das doenças vasculares (entre elas, derrame cerebral).
John Huston, Gary Cooper, John Wayne, Robert Mitchum, Vincent Price, Bette Davis, Walt Disney, Steve Mc Queen, Spencer Tracy, Clark Gable, Boris Karloff, Buster Keaton, Groucho Marx, Lee Marvin, Sammy Davis Jr., Errol Flynn, Yul Brinner, Bob Fosse, Lana Turner e Melina Mercouri, morreram todos de doenças diretamente ligadas ao tabagismo. O cigarro, em verdade, deveria ter ganho o Oscar de ator coadjuvante, por exemplo, em Casablanca, vez que em quase todas as cenas lá estava ele contracenando com Humphrey Bogart.
Importante marco histórico representativo do reconhecimento do tabaco como problema social é o tratado internacional denominado Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco. Referido tratado foi adotado durante a 56ª Assembléia Mundial de Saúde, realizada em maio de 2003, por 192 Estados Membros.
O projeto de lei n° 513, de 1999 (Apensos os Projetos de Lei no 708, de 1999, no 798, de 1999, e n° 3.129, de 2000) tramitando no Congresso Nacional, por sua vez, institui o ressarcimento obrigatório aos estabelecimentos públicos de saúde, pelas indústrias de cigarros e derivados do tabaco, das despesas com o tratamento de pacientes portadores de doenças provocadas ou agravadas pelo fumo e seus derivados.
4.0 O ENFOQUE JURÍGENO
4.1 Atividade lícita
A primeira de todas as regras é aquela que estatui não existir direito subjetivo de lesar.
Na preciosa lição que nos legou o douto Miguel Reale, faz este observar-se que “hodiernamente há progressivas exceções ao princípio de fonte romana que estabelece que quem faz uso de seu direito não causa dano a ninguém (qui iure suo uititur alterum non laedere), ora predomina a obrigatoriedade de ressarcimento, segundo o princípio geral do Direito que também remonta a fontes clássicas, e que estabelece que não se deve causar dano a ninguém (alterum non laedere)”
Como bem disse o Desembargador Dr. Coelho Braga, “para que haja responsabilização civil, a conduta não precisa ser necessariamente ilícita, deve ser uma conduta que causa dano a outrem; o que está em jogo não é a natureza jurídica da conduta das empresas fabricantes de cigarro, mas sim os danos causados por essa conduta, seja ela lícita ou não”.
No caso do fumante ser acometido por qualquer daquelas doenças tabaco-relacionadas a que todos sabem que o cigarro dá causa, sob o enfoque jurídico restará caracterizado o “fato do produto”. A responsabilidade in casu é objetiva e, portanto, independe esta da licitude ou ilicitude da atividade, conforme previsto na ordem jurídica nacional, mais precisamente no Código de Defesa do Consumidor (art.12) e no novo diploma civil (art. 931, que não exclui sequer os riscos do desenvolvimento).
Nesse mesmo alinhamento, válido ainda afirmar que, dado os fundamentos da responsabilidade civil, não há como ficar incólume uma atividade lícita produtora de resultado ilícito. Até porque, segundo previsão do art. 187 da lei civil ora em vigor, comete ato ilícito o titular de um direito que ao exercê-lo excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes. O abuso de direito, sabe-se, é aferível objetivamente, prescindindo do dolo ou culpa, existindo este ainda que não se tenha verificado dano. Longe, portanto, de se querer alegar configurada a excludente do exercício regular de direito, vez que, se tanto, eliminaria tão só a ilicitude, e, por isso mesmo, relevante apenas em sede de responsabilidade subjetiva, que não é o caso em se tratando de tabaco e derivados.
Por último, traz-se a lume, entre tudo, o princípio informado pelos arts. 1.251, 1.289 e 1.293, todos do novel Código Civil, segundo o qual o exercício de certos direitos deve implicar o dever de reparar o prejuízo que originar.
Em nada altera, pois, o deslinde da questão a licitude da atividade. A prevalecer tal raciocínio simplista, todas as conseqüências ilícitas de atos, a priori, lícitos estariam imunes às regras da responsabilidade civil.
Portanto, se o exercício de atividade lícita compromete direito, passa a interessar à teoria do risco, sobretudo se violada a dignidade da pessoa humana. Daí atribuir-se menor importância ao fato da atividade da qual decorreu o dano ser enquadrada como lícita.
Não encontra mesmo eco na ordem jurídica, pois, o esvaziado argumento de que a produção, distribuição e venda de fumo e derivados, por ser uma atividade lícita e regulada não deve ser responsabilizada, denegando-se assim direito ao fumante ou parentes destes de se verem galadoardos por conta do dano a que o fumo deu causa.
No contexto, maior peso assume o direito e a garantia fundamental à saúde e à qualidade de vida, constitucionalmente assegurados.
4.2 Periculosidade inerente
Periculosidade inerente, também chamada de periculosidade latente, é aquela inata ao produto ou serviço que se faz, este ou aquele, necessário à fruição. Eliminá-la pode representar a própria supressão de toda utilidade do produto ou serviço. Isto porque, a virtude do produto ou serviço decorre justamente de sua inafastável periculosidade, conforme vem dito nos comentários ao Código de Defesa do Consumidor Comentado que fazem os autores do anteprojeto.
Diz o art. 8° do Código de Defesa do Consumidor que “os produtos e serviços colocados no mercado de consumo não acarretarão riscos à saúde ou segurança dos consumidores, exceto os considerados normais e previsíveis em decorrência de sua natureza e fruição, obrigando-se os fornecedores, em qualquer hipótese, a dar as informações necessárias e adequadas a seu respeito”.
Vê-se assim que é plenamente possível comercializar objetos cortantes como facas, que apesar de colocar em risco o consumidor com seu uso, este risco é plenamente previsível e, inclusive, desejável. Também se pode comercializar produtos tóxicos ao ser humano, mas que possuem qualidades desinfetantes para limpeza de ambientes, etc.
Destarte, em primeiro lugar, mister esclarecer que os riscos inerentes ao consumo de cigarro não são considerados normais e previsíveis em decorrência de sua natureza e fruição - art. 8º da Lei nº 8.078/90. E isto porque, segundo deflui da inteligência do referido artigo, a periculosidade inerente é admitida sob condição de que o produto, de alguma forma, assegure algum proveito a quem dele se utilize. Ora, ninguém fuma para desfrutar no futuro de médio-longo prazo, só para citar, um câncer no pulmão ou uma diminuição do desejo sexual.
Demais, tanto o conjunto de substâncias componentes do cigarro como o conjunto de doenças que estas ensejam ainda se fazem desconhecidos do consumidor médio. Nesse sentido, basta lembrar que a maior parcela de tabagistas do País iniciou-se no vício enquanto infante, na adolescência, ou, ainda, que o maior consumo de cigarros ocorre, segundo dados estatísticos, nas classes de menor nível de conhecimento, e, portanto, mais desavisada que as demais classes sociais.
Além do que, a indústria do fumo, deve-se dizer, não apresentou ao público, ao menos até o momento, um único parecer, relatório ou estudo que comprove que as substâncias do cigarro, e aí incluída a nicotina, fazem bem à saúde ou são, no máximo, substâncias neutras ao organismo. Destarte, se não há qualquer benefício conhecido que possa ser atribuído ao cigarro e demais produtos derivados do tabaco, qualquer publicidade voltada a estes terá sido, sem dúvidas, enganosa.
Resta rechaçada, pois, por tudo, a tese de que o cigarro seja um produto ao qual se possa atribuir o qualificativo “periculosidade inerente”.
4.3 Conhecimento dos riscos
Por conta da divulgação dos milhares documentos da indústria de tabaco, restou certo que desde a década de 1950 a indústria tabaqueira como um todo já conhecia os males que o consumo do fumo causa aos seres humanos. Mas os fabricantes de cigarro, entretanto, sempre negaram publicamente a mortal periculosidade do fumo. Os fumantes, destarte, foram e até hoje permanecem vítimas de um tipo de desvio de pensamento conhecido como falácia, que é um argumento falso, ou uma falha num argumento, ou ainda, um argumento mal direcionado ou conduzido.
No Brasil, país de contrastes, com miseráveis e analfabetos, famoso pelo descaso estatal com seus cidadãos, a maioria absoluta das pessoas, de fato, não detém conhecimento bastante a cerca dos males que o cigarro dá causa. Esta é, entre outras, uma das razões pelas quais se afirma que o fumante não teria de sã consciência optado pelo fumo. O tabagista foi, isto sim, induzido ao VÍCIO.
Estatísticas têm demonstrado que no Brasil há um menor consumo de cigarros nas classes de maior rendimento familiar per capta. Segundo dados do Ministério da Saúde, o maior consumo de cigarros está na base da pirâmide econômica. Assim sendo, pode-se mesmo pregar sem erronia que a população brasileira, em grande maioria pobre e de pouca instrução, não consegue mesmo avaliar convenientemente os riscos a que estão se expondo caso se deixem levar ao VÍCIO do fumo, à dependência da nicotina.
Mas ainda assim insiste-se em empregar-se a falácia de sempre, segundo o qual o fumante sabe o que faz. Tenta-se impingir a culpa pelos malefícios decorrentes do fumo ao consumidor, como se não tivesse sofrido esse a influencia das milionárias campanhas publicitárias voltadas à utilização de formas e meios de convencimento, induzindo-o desse modo a incorrer em erros de avaliação e, consequentemente, viciando sua vontade. Haverá algo mais irresponsável do que causar males à saúde das pessoas e, depois, eximir-se dizendo que a culpa é delas? Acaso é certo que uma empresa socialmente responsável se empenhe em desmoralizar um consumidor fiel que está morrendo por usar os seus produtos?
Pelo fato das doenças tabaco-relacionadas se manifestarem no médio-longo prazo, os riscos potenciais decorrentes do fumo acabam mascarados. Como bem coloca o sempre lembrado Professor Lúcio Delfino, “isso sugestiona as pessoas a acreditarem que o cigarro não interfere na saúde ou, ainda, que apenas alguns fumantes são acometidos por doenças relacionadas ao tabagismo, o que, obviamente, não corresponde à verdade”.
Em outra trilha, deve-se dizer que não fosse a iniciativa governamental de derramar as imagens dos males causados pelo fumo, sem dúvidas que a população em geral, e mesmo aqueles mais instruídos, sequer imaginariam que o cigarro contém, por exemplo, elementos radioativos, veneno para rato e todas aquelas 4.720 substâncias químicas.
Mas ser ou não do conhecimento de todos, os males que o cigarro provoca parece importar pouco, vez que a ordem jurídica, a um tempo, através da Lei n° 8.078/90, assegura que o fornecedor responde por vício (termo este aqui considerado como imperfeição de qualidade ou quantidade capaz, inclusive, de atingir a própria segurança do consumidor) quer oculto quer aparente, indiferentemente, e, em outro, através do Código Civil de 2002, que assenta haver obrigação de reparar o dano quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. Por certo. Assim como ocorre com a companhia de aviação que avisa que aviões podem cair, mas nem por isso fica livre de responsabilidade se este fato vier a ocorrer, também a companhia de fumo não pode se eximir se o dano aparecer, ainda que o consumidor dele o saiba.
Assim, pois, o conhecimento do vício por parte do consumidor não modifica a responsabilidade do fornecedor. Nesse sentido, porque pertinente, relembra-se ser a responsabilidade pelo fato do produto, além do mais, embasada no dever de segurança a que se obriga o fornecedor. Ao exercer sua atividade tem ele de o fazer sem acarretar danos à vida, à saúde ou a outros direitos extrapatrimoniais do consumidor, sob pena de responder pela reparação do prejuízo oriundo do acidente de consumo.
Na opinião sempre valiosa do Professor Lucio Delfino, “mesmo admitindo-se que a sociedade, globalmente considerada, realmente saiba, de maneira genérica e sem maiores detalhamentos, sobre os malefícios que o consumo de tabaco causa à saúde, tal realidade não seria nem de longe suficiente para desobrigar a indústria do tabaco de cumprir seu dever de informar – dever esse robustamente reforçado depois da publicação do Código de Defesa do Consumidor. Também não bastaria para se imputar ao fumante a responsabilidade exclusiva para o seu mal. E isso porque o raciocínio que conduziu a essa tese desconsiderou premissas essenciais, sendo formulado de maneira absolutamente isolada, situação a lhe conferir o mais alto descrédito”.
4.4 Obrigação de informar
Como antecomeço, protesta-se por dizer que o sistema constitucional brasileiro não admite uma livre iniciativa qualquer, mas apenas aquela livre iniciativa fundada em valores sociais. Logo, percebe-se que ao contrário do que pensam alguns muitos, a iniciativa não deve ser livre a ponto de quedar-se ao gosto deles. Ora, não é demais lembrar que o que legitima e permite a atividade empreendedora com vista ao lucro é o benefício social que resulta da geração de empregos, arrecadação de tributos e abastecimento do mercado com o fornecimento de bens e serviços úteis e/ou necessários, jamais a utilização abusiva do poder econômico e o abuso de direito privatizador de lucros e socializador de danos ou prejuízos. O único benefício gerado pela indústria do tabaco, levados em conta os males à saúde e os gastos do poder público em decorrência dos efeitos maléficos do cigarro, e, entre estes, as aposentadorias precoces de indivíduos em plena capacidade laboral, é o alto lucro que a indústria remete às holdings, nada mais.
Em prosseguindo, menção deve ser feita ao fato de que o dever de informar caracteriza-se como dever de bem informar o público consumidor sobre todas as características importantes dos produtos e serviços disponibilizados, para que se os possa adquirir ou contratar sabendo exatamente o que se poderá esperar deles. O intuito é não viciar a liberdade de escolha da parte hipossuficiente.
Verifica-se assim, de plano, que a informação como dever do fabricante há de se dar de duas formas e a um só tempo. A primeira forma se reduz à mera informação sobre a utilização do produto. Já a segunda, diz esta respeito à advertência que se faz mandatória em relação a perigos à integridade física do consumidor. Segundo Luiz Guilherme Marinoni, a idéia de informação necessária, adequada e apropriada implica em dizer que a informação deve ser realizada no idioma nacional, de forma compreensível ao público a que se destina, contendo descrições que possam ser compreendidas pelo homem dotado de conhecimento comum, e não apenas pelo especialista em determinado ramo do conhecimento, como, por exemplo, o médico
Notório, entretanto, que as empresas do fumo nunca tiveram mesmo a intenção de informar sobre os males que o tabaco efetivamente causa à saúde do fumante. E isso, óbvio, por uma questão muito simples: se o fizesse ninguém se permitiria adquirir para consumo produto com tamanha capacidade de produzir danos irreparáveis a médio-longo prazo à saúde.
Ocorre que, conforme pontua com proficiência o Professor Lúcio Delfino em artigo disponível na Internet, locus de domínio público, “um dos sustentáculos mestres do ordenamento jurídico – e isso não só hodiernamente – é representado pelo princípio da boa-fé objetiva, uma norma de conduta que impõe aos participantes do tráfego negocial uma atuação pautada pela colaboração intersubjetiva, pela lealdade, correção e consideração aos interesses do alter”.
Razão cabe àquele jurista, por certo, eis que a boa-fé não foi inventada pelo Código de Defesa do Consumidor. A boa-fé desde sempre integrou os princípios gerais de direito. O princípio da boa-fé regula não apenas o pacto contratual adrede invocado, mas ainda o reconhecimento desses deveres secundários, aqueles não diretamente pactuados, derivados mediatamente do princípio, independentemente da vontade manifestada pelas partes, a serem observados durante a fase de formação e de cumprimento da obrigação. São deveres que excedem o dever de prestação. Assim são os de esclarecimento (informações sobre o uso do bem alienado, capacitações e limites), de proteção (evitar situações de perigo), de conservação (coisa recebida para experiência), de lealdade (não exigir o cumprimento de contrato com insuportável perda de equivalência entre as prestações), de cooperação (prática dos atos necessários à realização dos fins plenos visados pela outra parte), dentre outros.
Mas não é só. Diversos são os diplomas que tratavam e tratam do dever de informar. No que segue, deles se faz menção em lista não exaustiva.
Lei n° 4.680 DE 18/06/1965 - DOU 21/06/1965, que dispõe sobre o Exercício da Profissão de Publicitário e de Agenciador de Propaganda e dá outras providências (art. 17) - desde 1957 já havia um “Código de Ética dos Profissionais da Propaganda”, o que provavelmente, no mínimo, preservava a ética, como o próprio nome diz, na publicidade, aí implícito, pois, o dever de informar.
Decreto n° 690 de 01/02/1966 - DOU 10/02/1966, que aprovou o Regulamento para a Execução da Lei nº 4.680, de 18 de junho de 1965 (arts. 1°, 2°, e 17). Restou estabelecido que (i) não é permitido: a) publicar textos ou ilustrações que atentem contra a ordem pública, a moral e os bons costumes, (ii) sendo dever: a) fazer divulgar, somente acontecimentos verídicos e qualidades ou testemunhos comprovados; c) elaborar a matéria de propaganda sem qualquer alteração, gráfica ou literária, dos pormenores do produto, serviço ou mercadoria.
Código Brasileiro de Auto-Regulamentação Publicitária (arts. 1°, 2°, 3° e 5°). Estabeleceu entre tudo que todo anúncio deve ser respeitador e conformar-se às leis do país, deve ser honesto e verdadeiro; deve ser preparado com o devido senso de responsabilidade social; deve ter presente a responsabilidade do Anunciante, da Agência de Publicidade e do Veículo de Divulgação junto ao Consumidor; nenhum anúncio deve denegrir a atividade publicitária ou desmerecer a confiança do público nos serviços que a publicidade presta à economia como um todo e ao público em particular.
O anexo “J” do CONAR, de sua feita, é especificamente voltado à publicidade do fumo. Preceitua que, “no anúncio de produtos de fumo: (1) Não se sugerirá que os produtos transfiram ou proporcionem ao Consumidor qualquer potência ou força anormal”. ... (4). Não se fará qualquer apelo dirigido a menores. (5). Nenhum anúncio deve ser inserido em qualquer Veículo dirigido basicamente a menores de idade.
Do exposto, se conclui que, ao contrário do que vem por aí sendo sustentado, mesmo antes da promulgação do CDC a publicidade já era regulada, proibindo, pelos valores legais (boa-fé) e éticos presentes no seio da sociedade e na ordem jurídica, a publicidade enganosa, ainda que por omissão.
Desde aquele momento de passado longínquo, quando a indústria do fumo por meio de pesquisas – a exemplo da que se promoveu por esfregaço de nicotina em pele de ratos vivos -, constatou que o fumo causa câncer e diversos males à saúde, tinham as tabaqueiras, sem dúvidas, o DEVER DE INFORMAR aos fumantes sobre tais malefícios.
Argumentar-se que os regulamentos do setor a quem cabe fiscalizar a atividade são observados na integra não basta por si só, eis que estes não têm o condão de afastar o alcance do CDC, norma de ordem pública.
E para mais ainda dizer, porque ávidos por lucros, os fabricantes de petume omitiram deliberadamente os fatores prejudiciais à saúde aos seus consumidores feitos nicotino-dependentes. Este agir se subsome, não restam dúvidas, na teoria civilista do abuso de direito.
Segundo entoa Antonio Herman de Vasconcelos e Benjamin, em verdade, uma análise atenta revela que, sem exagero, quase todos os tipos penais do CDC estão relacionados, sob os mais variados ângulos, com o tema da informação do consumidor. É assim com os delitos de oferta não-publicitária enganosa (art. 66), de oferta publicitária enganosa (art. 67), de oferta publicitária abusiva (arts. 67 e 68), de cobrança irregular de dívidas (art. 71), de perturbação do acesso do consumidor aos arquivos de consumo (art. 72) e de não entrega de termo de garantia adequadamente preenchido (art. 74).
4.5 Publicidade enganosa
Cabe ressair, ante do mais, que a ordem jurídica nacional prevê que o ônus da prova da veracidade e correção da informação ou comunicação publicitária cabe a quem as patrocina (art. 38 do CDC).
No que se prossegue, deve-se mais dizer que, pela mesma razão que se admite a aplicação do CDC ao fato do produto decorrente do cigarro, também o mesmo diploma é aplicado à publicidade abusiva e enganosa promovida pelas indústrias do fumo. O que com isto vem significar é que, se uma pessoa começou a fumar antes da vigência da lei consumerista, por força, entre tudo, da insidiosa publicidade do cigarro, e o dano por ela suportado veio ocorrer depois da entrada em vigor do referido Código, em março de 1991, poderá, então, o caso concreto ser submetido aos preceitos da lei consumerista.
Não é por demais afirmar que, em se tratando de informação publicitária, que é parcial por natureza, a imparcialidade deve estar presente nas informações sobre a qualidade do produto, especialmente quando seu uso puder ser nocivo à saúde.
Entende-se que há publicidade abusiva, nos termos do artigo 37, parágrafo 2º, parte final do CDC, quando seja esta capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança. O cigarro é o único produto consumido que mata se for usado exatamente como indicado pelo fabricante. Resta evidente, portanto, que a publicidade do cigarro se enquadra no conceito de publicidade abusiva, a qual ocorre quando vem realizada com fins contrários à ordem pública, ao direito, à moral. Esta se diferencia da publicidade enganosa que ocorre, quando o fornecedor induz o consumidor ao erro, ou seja, quando o fornecedor apresenta um produto ou serviço com qualidades que não possui.
Enganosa, por certo, é, portanto, a publicidade que gera na pessoa uma perspectiva diferente daquela que é própria do produto que compra. No pretérito, por exemplo, eram mostrados a todos aqueles caubóis maravilhosos, hoje mortos precocemente por câncer no pulmão. E se diga que tampouco o cigarro traz “sucesso”, traz “beleza”, traz “dinheiro”, porque na verdade não traz nada disso. Mas é exatamente essa adulação astuciosa que a publicidade da indústria vende.
Na verdade, os produtos derivados do fumo não são apenas objetos de publicidade; não são eles simplesmente levados ao mercado e anunciados. São, isto sim, transformados em símbolos, status de uma sociedade ávida por auto-afirmação. A publicidade liga-os à “juventude”, à “força”, à “beleza”, ao “sucesso pessoal”, às “vitórias esportivas” e ao que mais surja de valoroso ao ego dos desavisados. É, na realidade, portanto, mais que publicidade; é propaganda, naquele sentido próprio de venda de uma idéia, em vez de simplesmente promoção de um produto. A mensagem subliminar consiste, exatamente, sabe-se, em estabelecer na mente do consumidor uma ligação automática entre o produto e o status que este deseja possuir, ainda que inalcançável. Além de nocivos, os derivados do fumo são produtos desnecessários, já que todos podem passar a vida sem eles. Para tanto, bastaria que jamais houvesse qualquer contato com aqueles produtos. A venda de uma idéia, um fetiche, e, enfim, a propaganda, é que, entretanto, torna isso impossível na prática.
Por outro lado, claro que, se não viciada a vontade por conta das publicidades enganosas, cada um, segundo critério pessoal, irá aderir ou não, ao fumo. Mas, além de tudo, a pauta da discussão é o direito do consumidor de conhecer o produto a ser consumido, seus componentes químicos, seu responsável técnico.
E mais. Ao tornar-se dependente, a decisão de abandonar o fumo, que também deve ser livre, sem dúvidas, restará tremendamente dificultada.
O fato induvidoso, diga-se, é que, como produto consumido no país, o cigarro está, entre o mais, sujeito às regras do Código de Defesa do Consumidor, lei própria. Assim, os fabricantes e fornecedores de produtos potencialmente nocivos à saúde ou segurança devem, portanto, segundo determina aquele diploma consumerista, informar de maneira ostensiva e adequada os consumidores a respeito da nocividade ou periculosidade de seu produto, sem prejuízo da adoção de outras medidas cabíveis em cada caso concerto, respondendo pelos danos que causarem (artigos 7°, 9°, 12°, todos do CDC). Tanto o termo “ostensivo” como o termo “adequado” implica ambos no fornecimento de informações corretas, claras, precisas e em língua portuguesa sobre características, qualidades, quantidade, composição, origem, entre outros dados, bem como os riscos que estes produtos apresentam à saúde e segurança dos consumidores.
Pelo fato de que até mesmo substâncias radioativas tais como o “rádio 226 e 228”, só para citar, desconhecidas da maioria absoluta das pessoas, são entregues ao organismo do fumante, pergunta-se: alguém em sã consciência poderia sustentar que os fumantes são efetivamente informados tal como exigido pelo CDC?
“A estratégia adotada pela indústria do fumo não se limitou à omissão das informações que detinha acerca dos malefícios do fumo à saúde e sobre a qualidade psicotrópica da nicotina”, aduz o Professor Lúcio Delfino em um de seus vários escritos encontradiços na Internet.
Assim é que, no Brasil e em todo o mundo, fez a indústria uso de massiva publicidade insidiosa, no afã de enaltecer os perigosos produtos que fabrica, tendo como alvos, principalmente, crianças e adolescentes, indivíduos mais propensos a experimentarem cigarros e deles se tornarem dependentes. Valeu-se, ainda, de manobras voltadas a desacreditar estudos e dados científicos sérios, esses que jungiam o consumo de cigarros a várias enfermidades. Contratou atores cinematográficos, esportistas e outras celebridades para que divulgassem seus produtos.
Por tudo, o fator vulnerabilidade existente em qualquer relação de consumo fica muito mais presente quando se trata de cigarro. Isso, inclusive, pode-se sustentar, se mostra indiscutível.
Além do que, a veiculação publicitária do cigarro, produto que mata mesmo se utilizado como determina o anunciante, se mostra mesmo paradoxal e logicamente alarmante. Ainda mais se feita insidiosa nos moldes de antes, no pretérito.
No Brasil, a Portaria nº 490 editada pela União Federal em 1988 confirmou que fumar é prejudicial à saúde. Em nenhum momento, entretanto, as companhias de tabaco justificaram o seu silêncio de tantos anos a respeito desse fato.
A falta de transparência e de lealdade demonstrado pelas tabageiras confirma o fato do consumidor ter sido mantido enganado por décadas, quiçá séculos. .Destarte, tendo a indústria pleno conhecimento dos malefícios à saúde de fumantes e não-fumantes, criado assim conscientemente o risco, nada fez para evitá-lo. Ao contrário, a ocultação de fatos de interesse da sociedade, restou, isto sim, mascarada por publicidade enganosa, massificante e aliciante.
Dessa forma, publicidade do tabaco, como quedou demonstrado, é sem dúvidas abusiva e enganosa.
4.6 Vício de fumar
O psicanalista Dr. Flavio Gikovate no livro Drogas - Opção de Perdedor explica de maneira simples e autêntica o tema relativo a hábito, vício e dependência.
Pode-se resumir o que diz o articulista médico com o que segue.
- Não há a menor dúvida de que o grande problema relacionado com os vícios é o da dependência psicológica, eis que ela é muito mais forte e mais difícil de tratar do que a dependência física.
- O cigarro serve muito bem de exemplo para o estudo dos vícios, principalmente porque é uma das coisas que mais vicia.
- Quase todas as pessoas que fumaram algumas vezes passaram a ser fumantes regulares e, portanto, se viciaram.
- Estatisticamente, 90% dos que fumaram por brincadeira acabaram se viciando.
- O mais grave mesmo é a dependência psicológica.
- A ausência do cigarro fica relacionada com o reaparecimento - que mais parece um aparecimento - das nossas angústias mais profundas. O vínculo que se estabelece entre o homem e o cigarro não é uma coisa simples, banal; é uma coisa muito forte e profunda. Daí a dificuldade que as pessoas têm de largar o vício de fumar.
- Vício e hábito são a mesma coisa? Não. Por isso é que se torna importante distinguir um do outro. Podemos dizer que existe o hábito quando a dependência psicológica é pequena, ou seja, quando o fato de abandonar aquela prática ou aquele ritual nos entristece um pouco, mas não a ponto de nos deixar pensando no assunto o dia inteiro. Assim também podemos saber se trata-se de hábito ou vício a nossa relação com uma droga pelo tamanho da falta que sentimos quando somos obrigados a nos afastar dela.
Esclarecidos esses pontos relativos a hábito e vício com o socorro do eminente psicanalista citado, no que se segue deve-se dizer que a Portaria nº 695/1999 do Ministério da Saúde faz referência ao fato da “nicotina ser droga e causar dependência”.
Aliás, quanto a isso, a Philip Morris Internacional mesmo admitiu para o mundo, em confissão pública, através de seu sítio mantido na rede mundial de computadores – Internet, locus de domínio público -, que o cigarro causa dependência e males, como se pode ver no texto extraído daquele sítio (http://www.philipmorrisinternational.com). Veja-se:
“Fumar cigarro causa dependência. Pode ser muito difícil deixar de fumar, mas, se você é um fumante, isso não deve impedi-lo de tentar fazê-lo. Fumar cigarro causa câncer no pulmão, doenças cardíacas, enfisema e outras doenças sérias em fumantes. Fumantes são muito mais propensos a desenvolver doenças como o câncer de pulmão do que não-fumantes. Não existe cigarro seguro. Fumar cigarro é perigoso e causa dependência“.
E mais. O INCA, órgão de fé pública, divulgou em seu sítio na Internet (www.inca.gov.br), os seguintes trechos de documentos da indústria, hoje tornados públicos. Vejam-se.
“A BAT deveria aprender a se ver mais como uma companhia de droga do que como uma companhia de tabaco (Um memo escrito por cientistas da British American Tobacco – BAT / Souza Cruz, 1980)”
“Nicotina causa dependência. Nós estamos, portanto, no ramo de vender nicotina, uma droga que causa dependência.” (Addison Yeaman da Brown and Williamson - B&W, 1963)
Ante ao exposto, no que se conclui, o nicotino-dependente não tem hábito, mas, sim, vicio, que o leva a continuar fumando.
4.7 Iniciação ao vício
Os argumentos da indústria tabagista a respeito da iniciação ao vício e a tudo mais não merecem respaldo, pois dissociados de plausibilidade. É fácil argüir, por exemplo, que só consome cigarro quem quer, sem levar em consideração todos os artifícios disponíveis de indução de comportamento, a vulnerabilidade do consumidor e a dependência química gerada.
Consabido que o homem influencia e se vê influenciado pelo meio onde vive. Assim, a partir do momento em que se passou a idear o fumo como comércio, os fabricantes de tabaco e derivados desenvolveram eles mesmos uma cultura voltada ao tabagismo, aprofundada depois na sociedade. Em pouco tempo o fumo assumiu ares de importância, virou moda, passou ao cinema, transmudando-se assim em fetiche. Fumar era um ato normal, inocente até, já que a grande maioria fumava.
Não foi, portanto, a publicidade por si que, a despeito de abusiva e enganosa, difundiu o fumo no meio social. Foi, isto sim, o culto ao tabaco, a cultura tabagista criada. Tanto que nos países da cortina de ferro onde não se veiculava publicidade alguma, as pessoas também se viciaram graças exatamente a cultura, ao culto ao tabaco.
No início, a publicidade ajudou apenas a arraigar a cultura tabagista criada. Claro que, depois, uma vez transformado o cigarro em fetiche, a insidiosa publicidade passou à propaganda, que nada mais esta é do que a difusão de uma idéia, e, no caso, a difusão do cigarro como fetiche.
Segundo dados de acreditados organismos ligados à área de saúde, a maior parte dos fumantes se iniciaram no vício enquanto infantes, numa faixa etária no mais das vezes entre 12 e 14 anos, fase do desenvolvimento humano para a qual o próprio Direito, sob o fundamento de falta de discernimento, estabelece limites à capacidade legal.
Destarte, se a própria ordem jurídica, o direito positivado, tem os impúberes como aqueles com falta de discernimento para o exercício pleno da vida civil, como, então, se quer atribuir livre-arbítrio quando da escolha deles se iniciarem no fumo, no VÍCIO de fumar? Ilógico, porque o livre-arbítrio pressupõe exatamente plena capacidade de discernimento.
O fato é que se inicia cedo no vício. Para parecer mais velho, fazer tipo ou agradar aos amigos, o adolescente, como decorrência da cultura tabagista arraigada na sociedade, dribla aquele gosto de cinzeiro e disfarça os acessos de tosse até que ganha intimidade com o cigarro e passa a se sentir parte da turma. Com o tempo, a nicotina age, a dependência se instala e ele pode nem se lembrar de como tudo começou.
Valor caro ao homem é a autoconservação. Um juízo livre e lúcido não abrevia conscientemente a autodestruição. Somente um complexo processo de indução psicológica é capaz de introjectar a supressão ou a inversão deste valor imanente.
No mais, como defender uma suposta liberdade de opção quando o consumidor não detém o inventário de informações – e grande parte da massa de consumidores ainda não as detém – necessárias a realizar uma escolha consciente e bem trabalhada, em relação a iniciar-se ou não no tabagismo?
Não se pode deixar de reiterar os ensinamentos do tantas vezes aqui citado, o Professor Lúcido Delfino, autor do best seller “Responsabilidade civil e tabagismo no Código de Defesa do Consumidor” – ed. DelRey, no que diz respeito ao presente tópico. Com a sabença que lhe é peculiar, o consagrado jurista aduz “ser truncado o argumento que se ancora numa propensa liberdade de opção por parte do consumidor, de sorte que seria ele o único responsável pelas decisões que adota, podendo investir no vício ou não, e até mesmo abandoná-lo, sempre que sua vontade assim determinar”.
Importante lembrar, ademais, que a indústria do tabaco sempre agiu com negligência, omissão ou mendacidade em nome do lucro, encobrindo os malefícios do fumo. E não bastasse isto, estudos também comprovam que o vício muitas das vezes se faz herança, isto é, se o recebe dos ascendentes.
E mais. Mesmo que o sujeito tenha passado a ser usuário de drogas ilícitas por seu livre-arbítrio, esse argumento não se prestaria a justificar a descriminalização delas. Pela mesma razão, não se presta para afastar o dever de indenizar imputado às companhias fumageiras pelos danos causados pelo fumo a alegação de ter o sujeito passado a ser usuário de nicotina, droga lícita contida no cigarro, por seu livre-arbítrio.
Deve-se dizer por esclarecedor que, se há pessoas, aquelas que, mesmo ante os apelos da indústria, não aderiram ao fumo a despeito da cultura ao tabaco arraigada na sociedade, ótimo para elas. Mas isso não implica em dizer que aquelas outras que o fizeram não tiveram sua vontade viciada por força, entre o mais, da publicidade tabageira, eis que por certo desinformados de todos os verdadeiros males que o cigarro causa.
A tese do livre-arbítrio, da liberdade de opção de se aderir ou não ao fumo, se mostra, por tudo, insustentável perante a razão jurídica, qualquer que seja o ângulo com que se enfoque a questão.
4.8 Abandono do vício
Inicia-se por dizer que o prazer que se alardeia produzir o cigarro não passa de mito. A sensação de bem estar que o cigarro transmite ao fumante se dá tão só por conta do VÍCIO, ou seja, porque o organismo antes ressentido da falta da nicotina se vê atendido com a absorção da droga que lhe é entregue pelo cigarro. A sensação orgânica do atendimento da falta que fazia a nicotina se iguala mutatis mutandis àquela sensação de alívio quando atendida alguma necessidade fisiológica produzida por qualquer dos processos orgânicos naturais. Atentem-se que demonstrado ser a nicotina uma droga como o anuncia a OMS e os centros de excelência médica, evidencia-se, outrossim, que o prazer gerado pelo cigarro, reitera-se, longe de ser natural, é claramente artificial. Na verdade, a sensação de relaxamento ocorre porque a nicotina agiu sobre um mecanismo produzido por ela própria: o da dependência. Ao tragar o cigarro, o fumante acalma-se porque estava em crise de abstinência. A nicotina que ele consumira já havia se dissipado do organismo, começando aí os sintomas da abstinência – uma ansiedade que parece irritação, nervosismo e incapacidade de concentrar-se. Quando se inala o cigarro, a crise de abstinência é interrompida e tem-se a sensação de relaxamento. Em resumo, a nicotina não acalma nem estabiliza o humor. Ela só alivia os sintomas provocados por sua própria falta; é a cura para um mal que ela própria criou e realimenta.
Não fosse isto verdade e o fumante não estaria cada vez mais a reduzir o intervalo entre um cigarro e outro em busca de mais nicotina quanto mais enraizada a dependência, o VÍCIO.
No que se vê, as indústrias do tabaco se utilizam da nicotina para criar uma situação de dependência nos fumantes, cultivando em seus organismos uma necessidade química que os transformam em fiéis, ainda que involuntários, consumidores de cigarros. O fumante passa a necessitar ter de alimentar, minutos após minutos, seu vício, sua dependência, impedindo, através de cada tragada, a manifestação de uma desagradável crise de abstinência, sob o débil abrigo do prazer postiço criado pela nicotina. A nicotina faz do fumante um viciado.
Tabaco é doença, é drogadição. Não tal qual aquela causada pelo álcool ou pela cocaína ou heroína, mas uma drogadição mais intensa e poderosa. Para se ter idéia, ao redor de 31,9% daqueles que experimentarem tabaco tornar-se-ão drogaditos, contra 15,4% daqueles que experimentarem álcool, 16,7% dos que experimentarem cocaína ou 23,1% dos que experimentarem heroína. O uso crônico da nicotina provoca alterações no cérebro com aumento do número de receptores nicotínicos e cada vez necessidades maiores de nicotina. É de doença que está se falando, é de alterações fisiopatológicas importantes. E por ser doença precisa ser tratada.
E isso sem esquecer de mencionar o fumo geneticamente modificado, o Y1, com maior concentração de nicotina.
No mais, pode-se dizer que as pessoas leigas tendem a não ser sensíveis a riscos distribuídos individualmente, isto é, àqueles que não afetam simultaneamente um grupo numeroso, como um acidente aéreo, por exemplo, e também a não ser sensíveis aos riscos que ocorram no longo prazo. Tem sido enfatizado no meio médico o otimismo irreal que leva os indivíduos a acreditar que os eventos de risco ocorrem com algum nível de efeitos negativos, mas com pouca probabilidade de que os afete pessoalmente. Assim, cada um tende a se conceber como mais invulnerável do que os demais outros. Esta constatação, inclusive, é atribuída exatamente à falha de informação da parte das fumageiras.
Improvável que a opção de deixa de fumar seja livre, exatamente por causa da dependência química e física, que, inclusive, afastam, por certo, a hipótese de culpa concorrente ou exclusiva da vítima.
Aliás, é o próprio senso comum que não permite que se aceite que motivação pessoal e força de vontade se fazem suficientes contra a dependência química.
Neste particular, diga-se que se é certo não se poder apontar a busca de nicotina como motivo para que alguém se inicie no vício, também é certo dizer-se que a dependência química uma vez instalada representará para esse alguém o maior obstáculo para que interrompa de vez o vício.
Segundo informa o INCA em http://www.inca.gov.br/tabagismo/frameset.asp?item=
atento&link=arquivos_secretos.pdf, em um dos documentos secretos da indústria tornado de domínio público, se pode ler:
“Tem sido sugerido que a fumaça do cigarro é a droga mais adicta. Certamente um grande número de pessoas continuará a fumar porque eles não conseguem deixar. Se eles pudessem eles o fariam. Não se pode mais dizer que eles fizeram uma escolha adulta. (Dr Green da BAT, 1980)”.
Acrescente-se que o tabagismo é visto como uma doença crônica, vez que há enorme dificuldade para se eliminar o vício do fumante, como já restou provado pela ciência.
Especialistas concordam que tratar a dependência é muito difícil. A abdicação do vício não depende apenas de uma decisão do próprio fumante ou da sua autodeterminação. Tal assertiva não conta com qualquer embasamento técnico-científico. E isto porque as estatísticas demonstram exatamente o contrário, quer seja, que 80% dos que tentam abandonar o vício fracassam na empreitada.
Adianta o pneumologista Ciro Kirchenchtejn, coordenador do Helpfumo e do Serviço de Avaliação Pulmonar do Hospital Beneficência Portuguesa de São Paulo que se livrar do VÍCIO deve ser considerado um superdesafio. Isto porque, além da dependência física também se instala no organismo do fumante a dependência psicológica.
A psicóloga Ana Maria Munhoz, por sua vez, acredita que é necessário o acompanhamento médico para auxiliar o paciente que deseja parar de fumar. Segundo ela, não basta só ter força de vontade para deixar um vício, seja ele qual for. O paciente, diz mais, precisa freqüentar terapias para entender porque fuma. Se for ansiedade, insegurança, falta de auto-estima, ou até mesmo se foi influenciado por alguém; junto com esse processo é preciso aliar medicamentos receitados por outro especialista para que o vício da nicotina seja totalmente eliminado, afirma.
Estudos desenvolvidos nos Estados Unidos confirmam que dos 50 milhões de americanos que fumam, 70% querem parar e, todo ano, mais de um terço tenta, mas só cerca de 3% obtém sucesso.
No julgamento do Recurso Especial nº 140.097, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça houve por bem não conhecer do recurso promovido pela Philip Morris Marketing S/A, em desfavor da Associação de Defesa da Saúde do Fumante – ADESF –, no qual aquela empresa pugnou, entre outras questões, pelo descabimento da inversão do ônus da prova para demonstrar que a nicotina não causa dependência aos fumantes. O ministro César Asfor Rocha, relator do processo, esclareceu:
"Ora, é evidente que a ré/recorrente está muito mais apta a provar que a nicotina não causa dependência que a autora/recorrida provar que ela causa. Uma empresa de tamanho porte, com atuação em quase todos os quadrantes do mundo, certamente não iria propositadamente fabricar produtos com a convicção de que nele haveria um componente a causar dependência maléfica à saúde. E se pelo estágio atual da ciência, a questão da nocividade constitui, ao menos, ponto aberto ao debate, que ela faça essa prova de modo irretorquível, pois mais do que qualquer consumidor ou entidade poderá a ré/recorrente evidenciar essa assertiva, que a recorrente tem como verdadeira."
Nesse mesmo julgamento, o Ministro Rui Rosado de Aguiar, ao proferir seu voto, seguindo o entendimento do Relator, acrescentou:
"No que diz com a inversão do ônus da prova, realmente a questão da dependência é um fato que pode ser provado. Não é, penso eu, um fato moral ou filosófico, como foi afirmado da tribuna, que excluiria a possibilidade de demonstração científica. É um fato acessível à ciência, é um fato biológico. A prova pode ser feita. Processando-se o pedido, a empresa recorrente terá a excelente oportunidade de demonstrar que o produto que vende não é nocivo à saúde. Observo que essa inversão do ônus da prova, consagrada no Código de Defesa do Consumidor, é uma das hipóteses em que se transfere a carga do ônus probatório de uma parte para a outra, quando a outra, no caso a ré, é quem dispõe de elementos, das informações e das condições para conhecer o fato e demonstrar a sua existência e as suas características."
O Desembargador do TJ-RS, Dr. Nereu José Giacomolli, ao julgar caso concreto a respeito do tema esclareceu :
"Ademais, tal agir omissivo, indubitavelmente, afetou a autonomia da vontade do consumidor, interferindo no seu direito de tomar decisões válidas e de agir de acordo com esse entendimento, pois, mesmo a demandada negando este fato, o consumo do cigarro implica em dependência física e psíquica, além de diversos males à saúde, e tal informação foi subtraída do conhecimento de quem acabou por se tornar tabagista." (Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Apelação Cível nº 70007090798, julgado em 19 de novembro de 2003).
O novo cigarro Quest 2 contém metade, e o Quest 3 chega praticamente ao teor zero de nicotina, informa a tabaqueira Vector, dos Estados Unidos, dona da marca. "Pedir que as pessoas parem de fumar é como lhes pedir que não tomem sol. Não funciona", diz Bennett LeBow, presidente da Vector (http://veja.abril,com.br/050203/p
_084.htm).
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Afinal, o usuário de uma droga, no caso, a nicotina, que causa dependência física e psíquica, exerce mesmo liberdade de escolha para deixar o vício, ou sucumbe ante sua necessidade orgânica de fumar?
4.9 Concausas
O problema da causalidade se torna dificultado quando várias causas concorrem para a ocorrência de um dano. Dá-se o que é denominado concorrência de causas.
Um dano pode decorrer de várias causas. E essa participação de causas no dano pode se dar de formas diversas. Assim, se as dizem subseqüentes, complementares, cumulativas e alternativas.
Na primeira hipótese o fato praticado por uma pessoa é a causa do fato praticado por outra. A segunda ocorre quando duas ou mais causas concorrem para a produção de um resultado que não seria alcançado de forma isolada por nenhuma delas. Nas hipóteses de causalidade cumulativa os fatos praticados pelos agentes não necessitariam somar-se um ao outro para a ocorrência do dano, visto que qualquer deles produziria o resultado isoladamente. A última hipótese é a situação em que não se pode definir exatamente qual dos vários participantes causou o dano. Isto é, o agente de um grupo causou um dano, mas não é possível determinar qual agente.
As causas complementares e as concorrentes, por sua vez, podem ocorrer de forma simultânea ou sucessiva. Regra o art. 942 do C. Civil “que todos os que contribuíram para o dano respondem solidariamente perante a vítima”.
As concausas podem ainda, em outro giro, ser classificadas em supervenientes, preexistentes ou concomitantes.
As concausas preexistentes não são hábeis a eliminar a relação causal. Por conta disso é que as condições peculiares da vítima em nada reduzem a responsabilidade do agente, ainda que sirvam para agravar o resultado da conduta. Sérgio Cavalieri Filho, diz que “será irrelevante que de uma lesão leve resulte a morte por ser a vítima hemofílica; que de um atropelamento resultem complicações por ser a vítima diabética; que da agressão física ou moral resulte a morte por ser a vítima cardíaca; que de pequeno golpe resulte fratura de crânio em razão da fragilidade congênita do osso frontal etc”.
Deve restar bem ressaltado que em todos aqueles casos citados pelo celebrado Desembargador do TJ-RJ o agente responde pelo resultado mais grave, independentemente de ter ou não conhecimento da concausa antecedente que agravou o dano.
As concausas concomitantes são aquelas que se dão simultaneamente ao fato gerador do dano e as supervenientes são aquelas que, naturalmente, ocorrem após o evento danoso. Em ambos os casos, o tratamento a ser dado às concausas concomitante e superveniente é aquele dispensado às concausas preexistentes.
No entanto, uma observação se faz quanto às concausas supervenientes. Estas terão relevância quando inaugurarem um novo curso de acontecimento que rompa com o nexo causal anterior. Isso significa que se a concausa superveniente for suficiente para gerar o dano por si só, ela interromperá o nexo causal eximindo o agente de responsabilidade.
Em face do abordado antes, pode-se dizer que, tratando-se de doenças em que dentre os vários fatores de risco lá está o fumo, sob o ponto de vista jurídico a todos aqueles fatores se atribuirá a decorrência do dano, por se tratar exatamente de concausas simultâneas, respondendo o agente pelo resultado mais grave.
4.10 Doença multifatorial e nexo causal
O grande sustentáculo das companhias de tabaco é a tentativa de estabelecer uma diferença entre fator de risco e causa, como se isso tivesse o efeito liberatório pretendido. Porém, olvidam que para sua responsabilização civil basta o risco, aliás, inerente à sua atividade econômica.
No que se segue, informa-se o que no boletim Informativo n° 9, de junho de 2001, ISSN 1518-6377, divulgado na Internet pela ANVISA, órgão de fé pública, em dois de seus trechos se lê:
“Em nosso país, o tabagismo é a principal causa do crescimento de casos de câncer, por estar ligado a oito tipos da doença e responder, direta ou indiretamente, por cerca de 30% do total de mortes causados pela enfermidade ...”. - grifamos
“No total, o cigarro está ligado à origem de tumores malignos em oito órgãos (boca, laringe, pâncreas, rins e bexiga, além de pulmão, colo de útero e esôfago)”.
Aliás, há muito vem sendo sustentando pela Organização Mundial da Saúde - OMS, pelo acreditado Ministério da Saúde dos Estados Unidos - Surgeon General, e, enfim, pela comunidade médico-científica em geral, que “as evidências são suficientes para se inferir existir uma relação causal entre o fumo e o câncer de pulmão, da laringe, da cavidade oral, do esôfago, do pâncreas, da bexiga, dos rins, e etc., dentre tantos outros males“.
Nessa linha, a Lei 9.294/1996, alterada pela Lei10.702/2003, no parágrafo 2°, do art. 3° C, estatui que “o Ministério da Saúde adverte que fumar causa mau hálito, perda de dentes e câncer de boca; que fumar causa câncer de pulmão; que fumar causa infarto do coração; que fumar na gravidez prejudica o bebê; que, em gestantes, o cigarro provoca partos prematuros, o nascimento de crianças com peso abaixo do normal e facilidade de contrair asma; que crianças começam a fumar ao verem os adultos fumando; que a nicotina é droga e causa dependência; e, que fumar causa impotência sexual. E veja-se que a citada lei não diz que fumar é fator de risco para esta ou aquela doença que cita. A lei preceitua categoricamente que fumar causa todas aquelas doenças que arrola.
Válido ainda mencionar que basta se compulsar o sítio do Ministério da Saúde na Internet para lá se verificar tantas outras categóricas afirmações confirmando os males que o fumo motiva.
Daí se deduzir que o Estado reconheceu expressamente a nocividade do tabaco.
Ademais, no que se prossegue, admitida, ainda que por hipótese, a tese de ser o cigarro apenas um inocente fator de risco de eventual doença que o fumante venha a desenvolver (?), o certo é que, por conta de sua natural agressividade sistêmica ao organismo humano, o fumo, de alguma forma, ainda assim compromete, sem dúvidas, em maior ou menor grau, não importa, a saúde daqueles feitos nicotino-dependentes. E mesmo quando preexistente alguma doença, dir-se-ia que o fumo, por conta de suas intrínsecas características (elementos químicos e radioativos os mais diversos), sempre agrava o estado clínico do fumante já doente. Pode-se afirmar, portanto, que se funcionou como causa do agravamento do estado clínico do nicotino-dependente doente, aí está outro alicerce do dever de indenizar, visto que o agravamento do estado de saúde, por si, já é um dano. Irrelevante é, assim parece, no caso, discutir-se a origem da doença. O dano é um só, quer seja, o comprometimento do estado de saúde do fumante no seu atual estágio, qualquer que seja este. Destarte, a hipótese, quando muito, seria de “concausa simultânea”.
Em verdade, consideradas as inúmeras substâncias químicas que contém, algumas radioativas até, o cigarro é multifatorial, querendo isto dizer que efetivamente o seu consumo pelo nicotino-dependente dá azo ao surgimento de diversas doenças.
Sem chance de ser diferente.
Além do que, diga-se mais, havendo incerteza científica, ao fornecedor incumbe fazer prova cabal, “absoluta”, da inofensividade do seu produto. A incerteza científica, diga-se, milita contra ele. Diante dela não se impõe ao usuário fazer prova da periculosidade do produto, mas, sim, ao fornecedor provar a sua segurança, sob pena de “ver-se impedido” de introduzir tal produto no mercado, a rigor do Princípio da Precaução positivado por implicitude.
Por conta disso, válido ser mencionado o que o insigne Desembargador Boris Kauffmann, da 2ª Câmara de Direito Privado de SP, pontuou em seu voto, quando do julgamento do A.I. nº 346.247.4/5. Relatou aquele experto julgador que sendo a Autora hipossuficiente em relação ao tema tratado deveria, pois, o fabricante de cigarros demonstrar a ausência de nexo entre o fumo e a doença, vez que é este quem reúne condições técnicas para demonstrar cientificamente que o fumo não tem relação com as doenças por ele causadas, notadamente a que vitimou o pai da Autora - câncer na língua, no reto e inúmeros outros nódulos cancerígenos.
Há, pois, fortes argumentos a sustentar que, tratando-se de doença tabaco-relacionada, no mínimo o fumo terá funcionado como “concausa simultânea”, confirmando assim, em qualquer caso, o NEXO fumo-enfermidade.
Segundo Carlos Roberto Gonçalves nexo causal é a relação de causa e efeito entre a ação ou omissão do agente e o dano verificado.
Citado pelo douto Juiz Federal da Seção Judiciária do Rio de Janeiro, Dr. Guilherme Couto de Castro, autor da obra “A responsabilidade civil objetiva no Direito brasileiro” – ed. Forense, sobre o nexo causal assim se manifesta Ricardo Angel Yagues:
“Tratando-se de responsabilidad objetiva, el nexo causal deve darse entre el hecho por ele que la ley obliga a responder (que no tiene por que ser uma conduta culposa) y el dano resultante”.
O Desembargador Dr. Sergio Cavalieri Filho explana com pertinência que “mesmo em relação ao nexo causal não se exige da vítima uma prova robusta e definitiva, eis que essa prova é praticamente impossível, bastando, por isso, a chamada prova de primeira aparência, prova de verossimilhança, decorrente das regras da experiência comum, que permita um juízo de probabilidade, como, por exemplo, a repetição de determinado evento em relação a um certo produto”.
Nas palavras de Savatier, aliás, “um dano só produz responsabilidade, quando ele tem por causa uma falta cometida ou um risco legalmente sancionado”.
Segundo Roberto Senise Lisboa, “também caracteriza a hipossuficiência do consumidor a situação jurídica que impede o consumidor de obter a prova que se tornaria indispensável para responsabilizar o fornecedor pelo dano verificado (hipossuficiência técnica). Explica-se. Muitas vezes o consumidor não tem como demonstrar o nexo de causalidade para a fixação da responsabilidade do fornecedor, já que é este quem possui a integralidade das informações e o conhecimento técnico do produto ou serviço fornecido. Assim, a inversão do ônus da prova constitui-se um direito básico do consumidor de facilitação da defesa dos seus direitos em juízo, tentando-se por meio dela reconhecer o nexo de causalidade indispensável para a responsabilidade do fornecedor”.
No mais, deve-se dizer que entes públicos, eles próprios, já manejaram ações reparatórias no exterior contra a indústria tabaqueira transnacional. As proposituras dessas ações judiciais comumente arrimam-se exatamente em duas argüições fáticas essenciais, quais sejam, a colocação à venda no mercado de produtos que a um só tempo provocam altíssimo grau de dependência e dezenas de enfermidades, sem que, mesmo diante de um sem número de estudos comprovando e anunciando a nocividade do fumo, tenham os fabricantes de cigarros ao menos esclarecidos adequadamente aos feitos nicotino-dependentes sobre os respectivos potenciais danosos do produto.
Verdade seja dita: o ordenamento jurídico não convive com a iniqüidade e, em assim sendo, não permite que alguém cause doença ou mesmo decorra daí a morte de semelhante sem que por isso tenha responsabilidade. O fumo desmente até mesmo o velho aforismo de que "nunca é tarde para corrigir os rumos de nossa vida". Isso porque o câncer e as outras doenças provocadas pelo vício marcam, quando instalados no organismo, de sofrimentos, de dores e de despesas o resto dos dias de suas vítimas.
Não há como deixar de ser responsabilizada a indústria do fumo pelos danos à saúde do fumante ainda que este seja tido como concausa simultânea tão só. Confirma-se assim o nexo causal.
4.11 Vício de concepção
Segundo leciona Luiz Guilherme Marinoni, há defeito de concepção quando a falta de segurança deriva da própria idealização do produto, como na definição de uma técnica ou dos materiais que serão empregados na produção.
E no que prossegue diz mais que, “quando um produto é inserido no mercado, e, mais tarde, o desenvolvimento da tecnologia acaba apontando-o como nocivo ou perigoso por comparação com o novo menos agressivo, o produto que foi descoberto como nocivo ou perigoso após a sua introdução no mercado deve ter a sua comercialização impedida ou suspensa, pouco importando o fato de ter, ou não, produzido dano”.
A expectativa que o fumante espera do cigarro é o pseudo prazer, a pseuda remoção da tensão, a pseuda sensação de relaxamento. Ocorre, entretanto que, feito nicotino-dependente, a necessidade orgânica da nicotina é que gera a expectativa de ter a ela própria para aplacar a crise de abstinência. É, pois, uma expectativa irreal, já que criada pela droga psicoativa contida no cigarro. Destarte, ao fumar, a pessoa, na verdade, está tão só a aprofundar o vício, que a médio-longo prazo lhe causará alguma(s) doença(s) tabaco-relacionada(s), frustrando, portanto, a real expectativa que detinha como consumidor, quer seja, aquela e única relativa ao relaxamento, ao prazer.
Por esta outra razão além daquela relativa ao vício de informação é que se pode dizer sem erro ser o cigarro um produto DEFEITUOSO.
4.12 Cigarros seguros
Nos idos ainda dos anos 50`s, estudo médico-científico tornando público males atribuídos ao fumo, repercutiu desfavoravelmente na opinião geral. A partir desse fato, a concorrência entre as fábricas de tabaco se fez bastante acirrada. E em razão dessa acentuada competição, várias patentes de cigarros ditos "seguros" foram a registro nas mais diversas praças de comércio. Percebendo que o lançamento de produto menos agressivo à saúde iria agravar sobremaneira a credibilidade do cigarro que até então era posto à venda, além de fazer com que a concorrência entre as fábricas se tornasse predatória, o instinto de preservação prevaleceu e a indústria como um todo, então, retrocedeu, o que fez com que o “cigarro seguro“, apesar de já desenvolvido e patenteado, jamais viesse ao mercado consumidor.
Sobre patentes de cigarros seguros, vale destacar o relatório do Imperial Cancer Research Fund - ICRF, de Londres, extraído da internet, no sítio http://www.rense.
com/ health/safersmokes.htm
No que segue, veja-se, a título exemplificativo embora não exaustivo, o registro de uma das muitas tais patentes:
Número da Patente : CN1138436 Data da Publicação: 25/12/1996 Inventor : BAOJUN LIU (CN) Requerente : LIU BAOJUN (CN) Classificação : - internacional : A24B15/16 europeu : Número do pedido : CN19960104873 19960509 Número da prioridade: CN19960104873 19960509. Sumário de CN1138436 - Um cigarro altamente seguro para a saúde é feito de tabaco, flor de crisântemo, tubérculo de gastrodia, raiz de pueraria, raiz de polygala e flor de madressilva, imergindo-os em água magnetizada, fumigando as folhas de tabaco aquecendo o líquido no qual são imergidos materiais medicinais chinês para remover a nicotina e o alcatrão, cortando, soltando por ressonância de folhas de tabaco, medicina e corpos magnéticos para remover o material prejudicial, e mfg. do cigarro (http://v3.espacenet.com/textdoc?DB= EPODOC&IDX=CN1138436&F=0).
O fornecedor é, sabe-se, responsabilizado pelo simples fato da colocação do produto defeituosos no mercado de consumo. Destarte, a indústria de tabaco não pode querer continuar a se sobrepor à sociedade organizada como vinha fazendo ao longo de todos esses anos, isto é, como se a ela fosse nascida para reinar. Impróprio, portanto, se ver aplicável à indústria do fumo o adágio “THE KING CAN DO NO WRONG” (O Rei não erra).
4.13 Ônus da prova
A responsabilidade pelo fato do produto é embasada no dever de segurança. O fornecedor, pois, tem de exercer a sua atividade sem acarretar danos à vida, à saúde ou a outros direitos extrapatrimoniais do consumidor, sob pena de responder pela reparação oriunda de acidente de consumo.
A inversão do ônus da prova se dá nos estritos termos do Código de Defesa do Consumidor diante da inegável hipossuficiência do fumante. Ademais, há que gizar que em se tratando de demanda que objetiva a responsabilização por danos decorrentes de fato do produto, o ônus da prova já recai naturalmente sobre a ré, consoante dá conta o art. 12 do CDC.
5.0 CONCLUSÃO
Querendo se evitar elongação demasiada, à guisa de conclusão se reproduz o que sobre o prélio envolvendo o fumo opina, entre tudo, o abalizado Professor Lúcio Delfino, porque sintetiza proficientemente o propósito da elaboração do presente trabalho exposto.
Assevera aquele culto jurista citado que “somente se adotada uma interpretação rasa do sistema jurídico nacional, descompromissada com os princípios regentes do Código de Defesa do Consumidor e com a teoria do abuso do direito, alheia a alguns direitos constitucionais fundamentais é que a lógica e o bom senso ancorariam a tese da irresponsabilidade civil da indústria do fumo”.
Por último, brade-se que a responsabilidade das tabaqueiras deve, por conta dos males que dá causa seu defeituoso produto, ser apurada segundo a teoria do risco integral, por conta exatamente do urânio e outros elementos radioativos a que são expostos os HUMANOS.
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