“Poder de Polícia e o Serviço Público - Considerações acerca do Poder Administrativo”
Autora: Izabela Yassue
Aluna do 6° período de Direito da Unicuritiba - Centro Universitário Curitiba.
A função administrativa, vista como atividade administrativa estatal, nas palavras de Marçal Justen Filho, significa “conjunto de poderes jurídicos destinados a promover a satisfação de interesses essenciais, relacionado com a produção de direitos fundamentais, cujo desempenho exige uma organização estável e permanente e que de faz sob o regime jurídico infralegal e submetido ao controle jurisdicional”. [1]
A administração pública, em seu sentido material, corresponde aos meios utilizados pelos entes que exercem a função administrativa, com o intuito de se atingir e realizar, diretamente, os fins desejados pelo Estado. Para Marcus Vinicius Corrêa Bittencourt, o exercício da função administrativa é entendida como “Atuação direta, concreta e imediata por parte dos entes administrativos ou até por particulares, em determinadas hipóteses, a título de cumprir as finalidades públicas previstas em lei.” [2]
Entende-se, nesse ponto, que as atividades administrativas estatais, realizadas por entidades, órgãos e agentes, correspondem ao sentido subjetivo do exercício da função administrativa do Estado. Nessa linha, ressalta-se a importância da definição de “função”, que, nas palavras de Marçal Justen Filho significa “atribuição a um sujeito do encargo de perseguir a satisfação de um interesse ou de um direito que ultrapassa sua órbita individual.” [3]
Nesse sentido, é necessário salientar quais interesses são tutelados em se tratando do regime jurídico administrativo. Para Marcus Vinicius Corrêa Bittencourt, o regime jurídico administrativo corresponde a um “sistema especial que coloca a Administração Pública numa posição de supremacia perante os administrados para satisfazer as necessidades coletivas, mas por outro lado, estabelece uma série de restrições ao modo de agir do Poder Público.” [4]
O regime jurídico administrativo possui uma série de prerrogativas e restrições, tendo como fundamento a supremacia do interesse público sobre o privado. Com isso, verifica-se que o exercício da função administrativa tem como objetivo principal a satisfação dos interesses públicos, ou seja, os interesses da coletividade.
Para Celso Antonio Bandeira de Melo, interesse público se constitui no “interesse do todo, ou seja, do próprio conjunto social.” Coloca também que o interesse público deve ser conceituado como “ interesse resultante dos conjuntos de interesses que os indivíduos pessoalmente têm quando considerados em as qualidades de membros da Sociedade e pelo simples fato de o serem.” [5]
Certas prerrogativas, apresentadas na forma de poderes administrativos, conferidas à Administração Pública, no sentido de que ela possa tutelar os interesses da coletividade, somente podem ser utilizadas nos limites da lei.
Marcus Vinicius Corrêa Bittencourt afirma que “os poderes administrativos ou “poderes-deveres” são meros instrumentos para que o agente público, investido na função, possa desempenhar adequadamente o seu dever de satisfazer os interesses públicos.” [6]
Partindo dessa mesma idéia, Celso Antônio Bandeira de Mello, indica que “os poderes administrativos, realidade deveres-poderes, só existirão e, portanto, só poderão ser validamente exercidos na extensão e intensidade proporcionais irrecusavelmente requerido para o escopo legal a que estão vinculados. Todo excesso, em qualquer sentido, é extravasamento de sua função jurídica. É, afinal, extralimitação, da competência (nome que se dá na esfera jurídica, aos “poderes”de quem titulariza função)”.[7]
Os poderes administrativos são inerentes à Administração Pública para que esta possa tutelar o interesse público, ou seja, o interesse da coletividade. São os poderes normativo, disciplinar, hierárquico, bem como o Poder de Polícia.
O Poder de Polícia, aqui tratado com mais profundidade, encontra fundamentação legal no artigo 78 do Código Tributário Nacional, que dispõe:
Art. 78. Considera-se poder de polícia a Atividade da Administração Pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a pratica de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, a disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Publico, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e os direitos individuais ou coletivos.
Nas palavras de Marçal Justen Filho, “o poder de polícia administrativa é a competência administrativa de disciplinar o exercício da autonomia privada para a realização de direitos fundamentais e da democracia, segundo os princípios da legalidade e da proporcionalidade.” [8] As características do poder de polícia são a discricionariedade, auto-executoriedade e coercibilidade. O atributo retratado com mais afinco no presente momento é o fato de o poder de polícia corresponder à uma atividade negativa.
Atividade negativa, vista por alguns autores, corresponde ao fato de que o interesse particular pode sofrer restrições e limitações em sua esfera de liberdade, pela Administração, em prol de um interesse social de maior relevância, nesse caso, evitar um dano ao interesse coletivo, pelo exercício individual contrário ao interesse público. Impõe ao particular uma obrigação de “não fazer”, de abstenção.
Como afirma Marçal Justen Filho, “o poder de polícia traduz-se em proibições e vedações, mas também pode envolver a prestação de utilidades necessárias à realização de necessidades individuais e coletivas.” [9] Nesse sentido, observa-se a existência, dessa vez, de uma atividade positiva, indicando que o poder de polícia desenvolve uma atividade que vai trazer acréscimo aos indivíduos e, por extensão, à coletividade.
O poder administrativo tratado agora é o poder disciplinar. Como diz Marcus Vinicius Corrêa Bittencourt, “é aquele que compete à Administração Pública para apurar infrações e aplicar penalidades aos servidores públicos e outras pessoas submetidas à disciplina administrativa.” [10] Cumpre-se ressaltar que a finalidade do poder disciplinar está ligada ao aperfeiçoamento do serviço público.
A Constituição Federal, em seu artigo 175, dispõe:
Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos.
O serviço público refere-se ao Estado oferecendo uma comodidade ao cidadão, visando a aplicabilidade do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana.
Marcus Vinicius Corrêa Bittencourt afirma que serviço público compreende-se como “a prestação positiva, prevista em lei, para satisfazer necessidades ou fornecer utilidades para a comunidade, mediante um regime jurídico especial, predominantemente de Direito Público. A atividade qualificada como serviço público se caracteriza pela satisfação de necessidades inerentes à dignidade da pessoa humana.” [11]
Os princípios compreendidos no serviço público são os da igualdade, continuidade e mutabilidade. O elemento formal relativo ao serviço público refere-se à idéia de existência de um regime jurídico especial, predominantemente de direito público, enquanto o elemento material corresponde à atividade positiva da prestação que o Estado desempenha à coletividade.
Nas palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello, “enquanto o serviço público visa a ofertar ao administrado uma utilidade, ampliando, assim, o seu desfrute de comodidades, mediantes prestações feitas em prol de cada qual, o poder de polícia inversamente (conquanto para a proteção do interesse de todos), visa a restringir, limitar, condicionar, as possibilidades de sua atuação livre, exatamente para que seja possível um bom convívio social”. [12]
Nesse aspecto, as distinções existentes entre serviço público e poder de polícia tornam-se evidentes. Enquanto no serviço público o Estado acrescenta valor à vida, realizando algo, dentro de um ideal de prestação positiva, o poder de polícia, visto como atividade negativa, impõe ao particular uma abstenção, mediante lei, condicionando o exercício das liberdades individuais em benefício do interesse coletivo.
Notas
[1] JUSTEN FILHO, Marçal, “Curso de Direito Administrativo” - ed. Saraiva, 2006, p. 30.
[2] BITTENCOURT, Marcus Vinicius Corrêa, “Manual de Direito Administrativo”, ed. Fórum, 2005, p. 19.
[3] JUSTEN FILHO, Marçal, “Curso de Direito Administrativo” - ed. Saraiva, 2006, p. 51.
[4] BITTENCOURT, Marcus Vinicius Corrêa, “Manual de Direito Administrativo”, ed. Fórum, 2005, p. 26.
[5] MELLO, Celso Antônio Bandeira de, “Curso de Direito Administrativo” - Malheiros Editores - 14 ed. 2001, p. 71.
[6] BITTENCOURT, Marcus Vinicius Corrêa, “Manual de Direito Administrativo”, ed. Fórum, 2005, p. 38.
[7] MELLO, Celso Antônio Bandeira de, “Curso de Direito Administrativo” - Malheiros Editores - 14 ed. 2001, p. 80.
[8] JUSTEN FILHO, Marçal, “Curso de Direito Administrativo” - ed. Saraiva, 2006, p. 393.
[9] JUSTEN FILHO, Marçal, “Curso de Direito Administrativo” - ed. Saraiva, 2006, p. 404.
[10] BITTENCOURT, Marcus Vinicius Corrêa, “Manual de Direito Administrativo”, ed. Fórum, 2005, p. 42.
[11] BITTENCOURT, Marcus Vinicius Corrêa, “Manual de Direito Administrativo”, ed. Fórum, 2005, p. 214.
[12] MELLO, Celso Antônio Bandeira de, “Curso de Direito Administrativo” - Malheiros Editores - 14 ed. 2001, p. 611.